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Declaração política sobre as consequências sociais de uma política económica a pensar centralmente nos grandes
Intervenção do Deputado Lino de Carvalho
Quinta, 01 Junho 2000

Senhor Presidente, Senhores Deputados

Decididamente os ventos não correm de feição para o Governo e para o Partido Socialista. Mas, sobretudo, não correm de feição para os portugueses que se vêem confrontados e a sofrer os efeitos da derrapagem e da evidente desorientação em que, porventura muito mais cedo do que muitos pensariam, o Governo e o PS mergulharam.

As consequências sociais de uma política económica a pensar centralmente nos grandes interesses económicos privados e no desmantelamento das responsabilidades públicas do Estado estão bem à vista.

Tinham e têm razão os trabalhadores portugueses e, em especial, os trabalhadores da Administração Pública, quando protestavam e protestam contra a fixação autoritária de tectos nos aumentos salariais muito abaixo das previsões reais e não virtuais da inflação. Ao contrário do que o Governo continua cegamente a afirmar tudo aponta para que a inflação, no mínimo, se fixe, este ano nos 2,5%. Mas a realidade é bem mais concreta e assume outra dimensão social quando descemos dos grandes números macro-económicos para o quotidiano dos portugueses.

Aumento dos transportes pela segunda vez este ano que, globalmente, atingem mais de 5%. A partir de segunda-feira aumento pela terceira vez do preço do gás doméstico totalizando 24% de aumento em apenas cinco meses. Uma botija de gás que custava em finais de 1999 cerca de 2.000$00 (conforme os revendedores) vai a agora custar na ordem dos 2.500$00. Os combustíveis, devido à política eleitoralista do Governo, tiveram os brutais aumentos que todos conhecemos Nas telecomunicações a assinatura mensal do serviço universal já aumentou 6,7% e as chamadas locais de média duração sofreram aumentos entre os 30% e os 45%.

Em curso está agora o brutal aumento do custo dos empréstimos à habitação. Conjugados os sucessivos aumentos das taxas de juro e, agora, da diminuição da taxa de referência para cálculo das bonificações, um empréstimo de 12.500 contos contratado, por exemplo, em Abril de 1999, a 25 anos, na primeira classe de bonificação significa um aumento da prestação de 50.157$00 para 60.086$00 e no segundo escalão de 54.245$00 para 65.294$00, mais 20% ! Mas a velocidade do aumento do custo do crédito é tão grande que, hoje mesmo, já foram anunciados novos aumentos das taxas de juro que agravará o exemplo que acabámos de dar em mais cerca de 3.000.$00 a partir do próximo mês. Há alguns anos tentaram convencer os portugueses de que com a moeda única as taxas de juro iriam baixar. Tudo iriam ser rosas. Rosas sim, senhores deputados, mas com muitos espinhos. Agora a redução da taxa de bonificação, da exclusiva responsabilidade do Governo, tem um só sentido. O Governo decidiu começar a diminuir as despesas públicas aumentando o custo do crédito à habitação para os mais desfavorecidos, enquanto o sistema financeiro continua a acumular milhões de contos de lucros como há muito tempo não tinha. Esta é a sensibilidade social que tanto o Engº Guterres apregoou ! Veremos ainda onde vai o Governo cortar mais para atingir a já falada redução de 210 milhões de contos na despesa pública para compensar as suas imensas trapalhadas com os preços dos combustíveis e dar cobertura à sua. política irracional e incompetente, que navega a pensar no curto prazo e, sobretudo, a pensar nos grandes negócios. Património do Estado já está em leilão e até com direito a anúncio de venda nos jornais. Despesas sociais já começaram. Despesas de investimento virão a seguir. Mas, seguramente, também está a chegar o tempo em que, para parafrasear Eça de Queirós, os portugueses vão cortar alguma coisa ao Governo. Confiança já a cortaram. O resto logo se verá ...

Da nossa parte, PCP queremos contribuir para pôr um travão a esta política do Governo gravosa para os portugueses. Nesse sentido anunciamos que iremos entregar um projecto de resolução com vista à suspensão da Portaria 12/2000 de 14 de Janeiro que diminui as bonificações das taxas de juro no crédito à habitação e à reposição da bonificação anterior de mais um ponto percentual fixando-a de novo em 6,5%.

Mas nem só de aumentos se fazem as agruras que o Governo e o PS estão a fazer passar os portugueses. A situação de degradação dos serviços públicos de grande consumo começam igualmente a marcar o quotidiano do País. O PCP preveniu a tempo contra o abastardamento que a qualidade dos serviços públicos iria sofrer em resultado de uma desvairada política de privatizações e progressiva renúncia pelo Estado das suas responsabilidades públicas numa linha neo-liberal que a Srª. Tatcher não desdenharia. Os resultados, infelizmente, aí estão, mais velozes que a cegonha ridiculamente responsável pelo "apagão" da EDP. Mas a questão é muito mais séria e preocupante. A razão fundamental do recente "apagão" reside centralmente na progressiva degradação da gestão da rede eléctrica e no desinvestimento em equipamentos e conservação da rede e dos serviços (a favor de mais que discutíveis investimentos em outros segmentos de negócio e em mercados não prioritários) em resultado directo do processo de privatização e desmembramento de uma empresa que presta um serviço público estratégico. Acrescem, e não é menor, outras consequências que os cidadãos estão a sofrer, designadamente em matéria de encerramento de muitos postos de atendimento. Há um afastamento deste serviço das populações, há pessoas, nomeadamente no interior do País, que têm agora de andar 100 Kms. para tratarem de assuntos que até há pouco resolviam na sua área de residência. E tudo isto porquê ? Porque a EDP, que só no primeiro trimestre deste ano, registou lucros na ordem dos 34 milhões de contos, "optimiza resultados à custa dos consumidores". Sabem quem disse isto, senhores deputados ? Pois foi, precisamente, o Ministro Armando Vara (O Público, 13/05/00) que perante as gravíssimas consequências desta política do Partido Socialista parece agora querer fazer esquecer as responsabilidades do seu próprio Governo. O que se passa no sector é grave e "o trabalho desenvolvido nos últimos anos não consubstancia aquilo que o PS e a Nova Maioria apregoou para o sector eléctrico, quando das últimas eleições". Sabem também quem escreveu o que acabei de citar ? Exactamente a "Tendência Sindical Socialista" da EDP. Aliás o que se passa em matéria de degradação em matéria do serviço público eléctrico é tão grave que daqui desafiamos o Governo a garantir que no próximo Inverno não se vão suceder mais incidentes na rede eléctrica. Primeiro não podem estar os negócios e depois o interesse público, senhores deputados. Deve ser precisamente o contrário.

E a propósito de negócios, e negócios obscuros, queremos aqui fazer uma pergunta clara e frontal ao Governo e ao PS ? É ou não verdade que o Governo se prepara para "comprar" a rede eléctrica nacional à EDP, num negócio avaliado em cerca de 300 milhões de contos ? É que se é verdade estaremos, seguramente, perante um novo escândalo de enorme dimensão. Como é que o Estado vai "comprar" um bem que já é do domínio público ? Como é que o Estado encara a possibilidade de entregar centenas de milhões de contos a uma empresa já privatizada em 47,5% para pagar um bem que está na esfera jurídica do Estado ? Como é que o Governo tem a coragem de gastar centenas de milhões de contos dos portugueses para comprar o que já é seu ?

Senhor Presidente, Senhores deputados:

Neste momento impõe-se uma solução imediata. Que o Governo venha a público esclarecer cabalmente esta questão e que seja abandonada a 4.ª fase do projecto de privatização da EDP (que, a consumar-se, faria com que o Estado perdesse a pequena maioria que ainda detém numa empresa que presta um serviço público essencial, pondo-a definitivamente ainda mais a reboque de ilegítimos interesses privados) promovendo-se uma reflexão global sobre as consequências da privatização.

Sublinhámos este exemplo paradigmático, mas senhores deputados, em matéria de abandono de serviços públicos essenciais o quadro é, infelizmente, muito mais vasto:

No serviço de Correios anuncia-se uma nova etapa de liberalização dos serviços postais com vista a entregá-lo a operadores privados, podendo pôr em causa a manutenção do serviço universal postal a tarifas uniformes.

No gás natural os lisboetas são diariamente confrontados com imposições autoritárias, aumentos de preços (7% para este ano) e comportamentos arrogantes da empresa que detêm o exclusivo da distribuição sem nenhum respeito pelos direitos dos consumidores. Mas também no resto do sector energético ligado à Petrogal as perspectivas não são melhores. Para além das matérias que justificaram a criação de uma Comissão de Inquérito nesta Assembleia, outras questões se estão a colocar: reestruturação com desmembramento da empresa, redução de trabalhadores obrigando quem durante toda a sua vida deu o melhor de si à empresa a responder a testes com vista a rescisões de contratos, reduções ilegítimas de salários a pretexto das greves realizadas. Mas uma outra questão exige aqui também uma resposta clara do Governo. É verdade ou não que na sequência do chorudo negócio para os grupos privados com a venda aos italianos da ENI a chamada reestruturação em curso pode levar ao encerramento da refinaria do Porto porque esses são os interesses dos novos accionistas privados ?

Na CP, outro exemplo, fez-se o seu desmembramento em nome da necessidade de combater os enormes défices da empresa. Afinal o que temos é que o défice da REFER em 1999 foi de 21,2 milhões de contos e o da CP de 52,2 milhões de contos, totalizando 73,4 milhões de contos, mais do que no último ano de funcionamento da CP como empresa única do caminho de ferro. Em contrapartida, tem-se vindo a degradar o serviço, encerram-se ramais e serviços regionais, somam-se os conflitos entre as duas empresas, põe-se em causa a unidade e a coerência do caminho de ferro como sistema de transporte, diminui-se o número de trabalhadores, prejudicam-se as populações

Poderiamos continuar a multiplicar os exemplos. Estes são suficientemente demonstrativos de uma política errada a pensar nos grandes interesses privados e não no interesse do País, a pensar nos lucros e não nas pessoas e nos trabalhadores, a pensar na maximização dos resultados financeiros e não na qualidade do serviço público, a pensar nos encaixes financeiros do Estado e não na salvaguarda dos seus interesses estratégicos, hipotecando o futuro. Não é de estranhar que, neste quadro, o descontentamento no País esteja em crescendo e o descrédito do Governo, do Primeiro-ministro e do PS estejam em progressiva aceleração, mesmo junto daqueles que, ilusoriamente deram o seu voto ao PS.

O que está posto em causa, hoje, com as opções políticas e económicas do Governo é o interesse nacional, são os direitos e as garantias de quem trabalha, são os direitos e a esperança dos cidadãos, tudo a reboque do desequilíbrio das opções de Governo a favor de ilegítimos e obscuros grandes interesses económicos privados . Por isso o Governo está obrigado a repensar a sua política e no plano social a promover aumentos intercalares para os trabalhadores e para as pensões de reforma que, no mínimo, mantenham o poder de compra dos sectores mais desfavorecidos da sociedade.

Pela nossa parte, PCP, reafirmamos: é tempo de se arrepiar caminho a favor de uma política que assuma o primado do interesse público e dos direitos sociais. É nesse caminho que o PCP está e continuará empenhado.

 

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