URBANISMO, HABITAÇÃO
& TMU
Relações entre habitação, urbanização e
edificação
Nos fins da década de 70 e
princípios da de 80 constatou-se a designada Crise Habitacional Portuguesa.
Chegou a falar-se numa carência de 800 000 fogos. Paradoxalmente já no
princípio da década de 80 se registava a existência de alguns milhares de fogos
vagos/devolutos, embora as estatísticas não fossem confiáveis.
Nos últimos vinte anos tem-se
verificado uma explosão na urbanização do território, em particular nas AM e
Litoral, com forte edificação de habitação de vários tipos (mais de um milhão
de alojamentos). É generalizada a ideia de que se construiu muito, ou melhor, que
se construiu demais e, em muitos casos, mal, tanto em termos urbanísticos, como
em termos de arquitectura/construção.
Haverá presentemente cerca de 650
000 fogos Vagos/devolutos (vários Tipos). Os centros das cidades estão
abandonados e decrépitos. Quando são reabilitados/ regenerados verifica-se o
fenómeno da gentrificação (nobilitação). Também é banal a convicção de que
houve "abusos" de vários tipos, e que os negócios imobiliários renderam muitos
milhões a um pequeno grupo de empresários e aos bancos. Investir na compra de
alojamentos para mais tarde vender com grandes mais-valias passou a ser uma
actividade comum a quem tivesse razoáveis pés-de-meia.
Muitos criticam as autarquias
municipais por toda esta situação. Estas dizem que a culpa foi dos sucessivos
governos. Os ecologistas acusam todos. Os portugueses em geral, assistem e lá
vão continuando a abusar do território sempre que podem e os deixam.
Que fazer?
Temos todos insistido muito na
necessidade de reformarmos e melhorarmos os instrumentos jurídicos de
planeamento e da gestão. Que seria através de melhores leis e decretos que
habilitassem os municípios a fazerem planeamento prospectivo, estratégico e preventivo,
e uma gestão urbanística eficaz, que se evitariam os desregramentos e
desequilíbrios. Mas, não obstante ter havido dezenas de alterações legais nos
últimos trinta anos, parece que o mal continua e até se amplia. Sem desmerecer
a importância dos instrumentos jurídicos que regulamentam a EDIFICAÇÃO, a
URBANIZAÇÃO e a GESTÃO DO TERRITÓRIO, e a necessidade de se acabarem
rapidamente com as desarticulações entre os diferentes níveis de poder e uma
efectiva capacitação técnica e legal para que os municípios intervenham
responsável e eficazmente, parece que o essencial não passará por aí.
Pode dizer-se com relativa
segurança que apenas quando os poderes políticos, central e local, passarem a
intervir, de facto, de acordo com uma perspectiva de interesse público, na
POLÍTICA de SOLOS, na OFERTA DE HABITAÇÃO (PREFERENCIALMENTE PARA ARRENDAMENTO
A CUSTOS CONTROLADOS), nos Circuitos de Financiamento da
urbanização/construção, e na POLÍTICA FISCAL RELACIONADA COM OS BENS IMÓVEIS E
COM A URBANIZAÇÃO/EDIFICAÇÂO é que poderemos inverter a caótica deriva em que
estamos metidos.
Por outro lado, enquanto Portugal
viver numa economia atrasada e deprimida, com os sectores produtivos
industriais de rastos, e com a financeirização da economia a impor-se
esmagadoramente, continuará a manter-se a "crença natural" na construção civil
de edifícios para habitação e outros.
Deveria pugnar-se pela urgente
criação de um mercado de aluguer a custos controlados, correlacionado com uma
oferta pública (municipal e eventualmente regional) de pelo menos 30%. Isto
ligado a uma política de solos de verdadeiro interesse público e colectivo, com
mecanismos de apropriação/expropriação facilitados mas socioeconomicamente
justos, a efectuar aquando do planeamento e da emissão de loteamentos. A s
taxas de juros e as condições dos empréstimos para a actividade económica
privada dos chamados "prédios de rendimento" deveriam estimular esta em
detrimento da construção para venda, em zonas urbanas a definir, e em períodos cíclicos.
As leis e os regulamentos, embora devendo respeitar o princípio da segurança e
previsibilidade, não podem ser "Tábuas de Leis" estáticas, mas sim adaptadas
consoante os interesses públicos emergentes e variáveis. Simultaneamente teria
que haver uma forte regulação das rendas dos edifícios criados neste regime.
Parece ser utópica e irrealizável
a ideia de que com um "bom planeamento" e uma "gestão urbanística eficaz" se
resolveria o problema do desordenamento do território, do mau urbanismo, da má
qualidade arquitectónica e construtiva, e, muito menos, da criação das
condições para contrariar as IMPLOSÕES URBANAS, o ESVAZIAMENTO DOS CENTROS, A
NOBILITAÇÂO DOS CASCOS ANTIGOS REABILITADOS/REGENERADOS, A EXPULSÃO PARA AS
PERIFERIAS DESQUALIFICADAS DAS CAMADAS POPULACIONAIS MAIS DÉBEIS, a
INECESSIBILIDADE DAS CAMADAS JOVENS AO MERCADO DA HABITAÇÃO (ALUGUER
PRIORITARIAMENTE), e a GUETIZAÇÃO DOS MARGINALIZADOS.
Seria interessante que os
municípios CDU pudessem dar o exemplo de dificultação à proliferação de um
urbanismo excedentário, de má qualidade e discriminador. Sabemos que, por
diversos motivos, isso é muito difícil, continuando a verificar-se casos que
vão em sentido contrário. Para que se concretize uma política urbanística
diferenciada da praticada pela generalidade dos municípios geridos por outras
organizações políticas, não bastará fazer uma gestão honesta e sem corrupção.
Afigura-se ser indispensável
introduzir urgentemente a dimensão educativa, formativa e informativa no
combate ao urbanismo pernicioso e ao desordenamento do território, não apenas
na vertente conservacionista muito divulgada por "ecologistas" de serviço ao
sistema. Vastas camadas populacionais, por falta de conhecimento e diversos atavismos
culturais, pensam que é "democrático" construir onde muito bem se queira, e,
por isso, pressionam as autarquias, demasiado permeáveis a este tipo de
reivindicação, criando assim o caldo de cultura para os tubarões do sector
actuarem.
Relações entre o urbanismo, a edificação e o
financiamento autárquico, por intermédio dos impostos e das taxas
É fundamental desmistificar o
paradigma errado pelo qual se crê que "dá dinheiro às câmaras municipais
licenciar e urbanizar". Dá, mas apenas no muito curto prazo, porque, com os
actuais valores das taxas urbanísticas, e com os valores e bonificações do IMI
e do IMT que têm vindo a aplicar-se, também a médio e longo prazos o balanço
financeiro é negativo. Se os municípios fossem "empresas" não seria "bom negócio"
continuar a licenciar nos ritmos verificados até aqui.
A actualização das Taxas
previstas pela Lei 53-E/2006 obriga a implementação de processos tecnicamente
complexos e determinará o aumento muito significativo (em certos casos seis ou
sete vezes) das diversas taxas e tarifas, designadamente a TMU. Embora seja
portadora de uma maior racionalidade económica e financeira (muitos dos
regulamentos e tabelas de taxas não têm lógica quantitativa) será adequada
social e economicamente? Do que não haverá lugar a muitas dúvidas é acerca da
incomodidade política em 2009, um ano eleitoral.
A problemática fiscal dos bens imóveis (construídos) é irracionalmente
assimétrica e não homogeneamente equitativa. Contudo, a sua actualização, pelo
menos nos termos em que está previsto, traz seriíssimas questões sociais e
fortes repercussões políticas. Não esquecer que houve uma explosão enorme de
"proprietários" de habitação, num falso movimento de democratização da
habitação, e que, embora estes "pagadores crónicos de prestações aos bancos"
não sejam, de facto, proprietários, julgam que são, e comportam-se
politico-socialmente como tal.
As autarquias não devem "viver da
urbanização" e serem estimuladas a licenciar para (não) ter receitas. E por
isso a Lei das Finanças Locais não devia cercear receitas de outros tipos. Por
outro lado, os custos directos e indirectos derivados da urbanização do
território, no curto, médio e longo prazos, e relacionados com as
infra-estruturas e com alguns dos equipamentos e serviços públicos necessários
ao funcionamento de territórios urbanizados e ocupados com populações, devem
ser imputados, em parte significativa, aos conglomerados
imobiliário-financeiros que determinam, de facto, a urbanização do país, pelo
menos nesta fase da vida económica nacional, embora com a adopção de medidas de
amortecimento da repercussão nos preços e nas rendas, e com o cuidado de não
propiciar o aparecimento de duplas e triplas tributações pelo mesmo sistema de
infra-estruturas e de equipamentos.
Habitação Social
Uma nota muito breve e final
sobre este tema, difícil, da designada "Habitação Social". Ou seja, da
habitação para os grupos socialmente deprimidos e/ou segregados e
marginalizados, inseridos em cadeias de exploração intensa e oportunista,
designadamente as que se apoiam nas imigrações.
São conhecidos as más práticas de
diversos tipos. No entanto não deveríamos cair em academismos, formalmente
muito interessantes, mas que não apresentam soluções concretas.
Os largos agregados de abrigos
desqualificados traduzem diversos tipos de problemas e não somente um "problema
habitacional". Há muitos problemas invisíveis debaixo da visibilidade do
problema da habitação indigente. Mas, o realojamento voluntarista, de
iniciativa pública, e em massa, embora sendo complexo mas não tem alternativas
conhecidas. Não é credível pensar realojar uma população que viva num bairro de
duzentas ou trezentas barracas (trezentos a quatrocentos núcleos familiares),
por fases, e durante vários anos. E também não parece credível pensar que será
através da criação das condições socioeconómicas suficientes a que aqueles
moradores se auto-realojem, que se resolverá o problema. Claro que a
concentração excessiva nos locais de realojamento também problemas conhecidos.
Assim como o realojamento disperso e incorporado em urbanizações "normais". A
solução não poderá passar, em Portugal, e quanto às barracas e situações
similares, por se considerar, como no caso das favelas do Rio de Janeiro, que
elas fazem parte do "sistema habitacional".
Ora, em toda esta problemática,
poderemos e deveremos nós defender que os municípios devem estar arredados,
argumentando que a "HABITAÇÃO" não é uma competência municipal, e, portanto,
deverá ser o governo central a resolver o problema? Vamos defender retirarmo-nos
do PER (ou de outro programa alternativo mesmo que mais apoiado) por uma
questão de princípio? Não se me afigura prudente voltar a essa tónica, salvo
se, num programa integral e coerente que sejamos capazes de traçar, se tornasse
claro para todos que havia uma forma mais adequada de tratar este problema.
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