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Lei da Televisão
Intervenção do Deputado António Filipe
Quinta, 23 Maio 2002

Senhor Presidente,
Senhores Membros do Governo,
Senhores Deputados,

A discussão hoje da Proposta de Lei com que o Governo pretende contornar uma deliberação legítima do Conselho de Opinião da RTP é um acto de violência contra a Assembleia da República e o seu funcionamento democrático e regular. Como o Governo não se conforma com a Lei da Televisão e pretende alterá-la, por estritas razões de conveniência política, altera-se a ordem de trabalhos, são preteridos direitos de agendamento, são esquecidos todos os propósitos de prestigiar a actividade deste órgão de soberania. A Assembleia da República está a ser hoje utilizada como uma peça de artilharia ao dispor do Governo para disparar contra o Conselho de Opinião da RTP, acabando com os seus poderes vinculativos.

Esta é uma Proposta de Lei contra o Conselho de Opinião que tem como única justificação o facto deste Conselho não ter abdicado de exercer livremente os poderes que lhe foram atribuídos por Lei da Assembleia da República. O Governo sabia que quando tomou posse existiam leis em vigor e que a tomada de posse de um Governo não implica a revogação automática das leis que estão em vigor. O Governo quando toma posse deve dar o exemplo de respeito pelas leis vigentes no país. E quando o actual Governo propôs uma composição para o Conselho de Administração da RTP sabia que não o podia fazer unilateralmente, na medida em que o Conselho de Opinião dispõe de parecer vinculativo sobre essa matéria.

O Governo primeiro fez chantagem, invocando a falta de dinheiro para pagar salários a partir de Junho, e como a chantagem não resultou, quer alterar a lei, para que um acto que é ilegal hoje, deixe de o ser amanhã.

É completamente absurdo o argumento de que o Conselho de Opinião agiu de forma ilegal. Bem pelo contrário. Um órgão independente que dispõe, nos termos da lei, da competência para a emissão de um parecer com carácter vinculativo, tem tanto direito de dar um parecer positivo como de dar um parecer negativo e ambas as decisões têm igual legitimidade e merecem igual respeito. Ora, tivesse o Conselho de Opinião dado parecer favorável à proposta do Governo e não estaríamos hoje a discutir a alteração pontual da Lei da Televisão. Esta é uma Proposta de Lei determinada exclusivamente em função do conteúdo concreto de um parecer que o Governo não quer respeitar. Ou seja, a deliberação do Conselho de Opinião seria legal e legítima se agradasse ao Governo, é ilegal e ilegítima porque não agrada ao Governo. Isto não é aceitável.

E não é aceitável que a Assembleia da República se preste a servir de muleta ao Governo para que este possa prosseguir objectivos que não são legais nem são legítimos.

O raciocínio do Governo é simples: Recusa-se a aceitar a vigência de uma lei que contrarie os seus propósitos, ainda que estes sejam ilegais. Portanto, como a lei não agrada ao Governo, altera-se a lei. E só esperamos que esta moda não pegue. Porque se esta moda pegar, qualquer dia, se um ministro for apanhado na estrada em excesso de velocidade, alteram-se os limites de velocidade, rasga-se o auto e retiram-se competências à Brigada de Trânsito.

O que acontece neste caso é que o Governo que não quer respeitar a Lei. Não é segredo para ninguém que uma das incumbências do Conselho de Administração a nomear é acabar com um dos canais da RTP. Ora, tal decisão corresponde à violação da Lei que define o estatuto da RTP e que a incumbe expressamente de garantir a existência de dois canais de cobertura nacional. Pelo que é preciso dizer desde já que, qualquer atitude de qualquer Conselho de Administração que venha a ser nomeado que se traduza no desaparecimento de um dos canais nacionais da RTP estará obviamente ferida de ilegalidade.

Mas esta Proposta contém uma medida que visa evidentemente governamentalizar a RTP. As competências do Conselho de Opinião, e concretamente, a competência de emitir parecer vinculativo à proposta de nomeação de administradores da empresa, foi uma medida destinada a desgovernamentalizar a administração do serviço público de televisão. É esse princípio que o Governo agora pretende reverter. O Governo pretende mandar no serviço público de televisão sem qualquer limite, regressando em pleno à velha teoria das forças de bloqueio. É um péssimo sinal. Veremos no futuro se o Ministro da Presidência não terá a pretensão de imitar um seu colega de Governo e voltar aos tempos em que havia um ministro que controlava pelo telefone o alinhamento do telejornal.

Em 1996, o PSD apresentou um projecto de lei para que o Conselho de Opinião tivesse o direito, não apenas de dar parecer vinculativo, mas de ser ele próprio a eleger o Presidente e dois vogais do Conselho de Administração da RTP. Agora, que voltou ao Governo, o PSD esqueceu depressa o que defendia quando estava na oposição. É caso para dizer que, mudam os Governos, mudam-se as vontades.

Acontece ainda que esta Proposta de Lei, a ser aprovada, conduzirá ao absurdo de atribuir a mesma competência legal a dois órgãos diferentes. O Conselho de Opinião da RTP e a Alta Autoridade para a Comunicação Social. Qual será então o valor relativo de cada um dos pareceres no caso de deliberações conflituantes? O Governo responderá com facilidade. Se ambos derem razão ao Governo, têm ambos razão; se ambos contrariarem o Governo são ambos ilegítimos e o Governo recusar-se-á a acatar qualquer dos pareceres; se os pareceres forem discordantes, o Governo decidirá, de entre os dois órgãos independentes, qual a expressão de independência que melhor lhe convenha.

O Governo pode fazer aprovar hoje esta Proposta. Pode dizer que ganhou uma escaramuça, mas não pode dizer que ganhou a guerra que decidiu mover ao serviço público de televisão. Não é o serviço público de televisão que hoje sai derrotado. A derrota hoje, é da ética política e da democraticidade do funcionamento da Assembleia da República.

Quanto ao serviço público de televisão, o Governo sabe que só tem ao seu lado, os grupos económicos interessados em controlar a televisão em Portugal e os seus servidores mais fiéis. E sabe que tem contra si todos os que reconhecem que uma televisão de serviço público, livre do controlo do poder económico, é um instrumento decisivo para a defesa da democracia política.

A defesa do serviço público de televisão é, para o PCP, e felizmente, para largos sectores da opinião pública portuguesa, um verdadeiro dever de cidadania. O que está em causa é a salvaguarda de um espaço de liberdade dos cidadãos perante a ambição do poder económico de controlar todos os espaços da vida em sociedade. Pela nossa parte, tudo faremos para que o povo português não perca esse espaço de liberdade.

 

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