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Indústria - Fernando Sequeira da CAE
Sábado, 24 Novembro 2007
fernandosequeira


Desde a realização da Conferência Nacional “ A via de desenvolvimento para vencer a crise”, realizada em Março de 1985, pouco tempo antes da entrada de Portugal nas Comunidades Europeias, até aos dias de hoje, a indústria transformadora nacional, viu reduzido o seu peso no produto em cerca de 13/14 pontos percentuais, e, num valor ainda maior, no que concerne ao emprego.
Esta significativa alteração quantitativa, que não qualitativa, da indústria transformadora, embora seja um fenómeno recorrente na maior parte das economias europeias, atingiu, contudo, uma expressão muito mais profunda em Portugal do que na UE, com uma velocidade de desindustrialização para esse período, cerca de quatro vezes superior à média europeia. De recordar, que no início da década de oitenta, o peso da indústria no PIB em Portugal, era então, o 2º maior da Europa comunitária.
Simultaneamente, o perfil produtivo, não sofreu alterações significativas durante quase uma década e meia, continuando a nossa indústria, escorada, no essencial, em produções e tecnologias de mão-de-obra intensiva e de reduzido valor acrescentado. Obviamente, que ocorriam excepções a esta regra, mas eram exactamente isso, excepções.
Neste período de quase vinte e três anos, ocorreram e nalguns casos ainda ocorrem, outros dois fenómenos profundamente nefastos para a indústria nacional: o processo de privatizações, no quadro do qual foram golpeados e desvalorizados, quando não mesmo extintos, alguns importantes e tecnologicamente avançados sectores, particularmente da indústria básica e pesada, a par de um crescente domínio do capital estrangeiro, em múltiplos e importantes sectores industriais.
Somente nos últimos anos, é que se começou a verificar uma melhoria do perfil de especialização da indústria, com perda de peso dos sectores tradicionais e um pouco maior protagonismo de sectores e produtos com maior incorporação científica e técnica.
Trata-se, contudo, de uma tendência ainda débil e porventura encerrando alguns efeitos perversos sobre o valor acrescentado nacional, decorrentes da estratégia global das multinacionais.
Estes e outros fenómenos, constituem traços daquilo que poderemos designar por uma política anti-industrial, política prosseguida pelos sucessivos governos em clara ligação orgânica com os grupos económicos em reconstituição e o capital multinacional, os quais, com raríssimas excepções – pasta e papel, cimentos e algumas químicas – não investem na indústria, mas antes noutras áreas, deixando assim, a tão necessária ao país produção de bens transaccionáveis, para as pequenas e médias empresas, que, sozinhas, enfrentam as dificuldades da concorrência internacional, seja no mercado interno, seja no mercado externo.
Política anti-industrial que desvaloriza socialmente a indústria e o trabalho na indústria e não protege nem fomenta a produção industrial nacional.
Finalmente, uma política anti-industrial que não promove o aproveitamento e valorização em território nacional dos nossos amplos e diversificados recursos naturais, nem responde à atenuação e resolução dos principais défices estruturais da nossa economia.
A perda de peso da indústria aos níveis a que chegou, o perfil de especialização industrial que apresentamos e a não protecção da produção industrial nacional, constituem uma das razões fortes do perigoso e galopante crescimento do défice da balança corrente, este sim, o grande e estrutural problema da economia portuguesa.

Camaradas:
Uma indústria transformadora moderna e robusta, apresentando uma elevada produtividade e competitividade, é absolutamente vital ao país e constitui inequivocamente um pilar fundamental do desenvolvimento, enquanto instrumento capaz de produzir uma vasta e diversificada panóplia de bens materiais, dando sustentabilidade e saúde a toda a economia. Nenhuma tese de sociedade pós industrial e economia desmaterializada pode negar esta importância.
A indústria transformadora, poderá também potenciar a indústria extractiva e constitui simultaneamente um factor muito importante do exercício da soberania.

Camaradas:
O país precisa clara e inequivocamente de uma política industrial, com objectivos estratégicos claros, com meios disponíveis e com uma programação adequada.
Com vista a dar à indústria transformadora o protagonismo que um adequado desenvolvimento económico exige, o PCP propõe, como principais linhas de tal política industrial:
- A promoção da necessidade da indústria, junto dos trabalhadores e do povo, como algo de absolutamente vital para a economia do país e para a estabilidade e qualidade do emprego.
- A defesa, manutenção e reforço do aparelho produtivo nacional, no caso vertente do aparelho industrial.
- A defesa continuada e intransigente da produção industrial nacional.
- O aproveitamento e valorização interna, através da sua transformação tão completa e avançada quanto possível, dos recursos endógenos do solo, do subsolo e do mar.
- A modernização, em termos de instrumentos de produção, de formas de gestão e qualificação dos trabalhadores, das indústrias tradicionais, com vista ao acréscimo da sua produtividade e competitividade.
- A reanimação e ou o fortalecimento de importantes indústrias básicas entretanto adormecidas ou quase extintas, como por exemplo, as metalo e electromecânicas produtoras de bens de equipamento pesados - para a indústrias, para a produção de energia, para a movimentação de cargas, para o transporte pesado, etc. - as metalurgias, as químicas e petroquímicas de base e indústria de construção e reparação naval.
- A criação de condições para a manutenção da estabilidade, modernização e fortalecimento de todas as actividades ligadas ao sector automóvel, alargando-lhe a base de génese nacional, particularmente na área dos componentes.
- O fortalecimento das indústrias de alta tecnologia, as chamadas indústrias modernas, que incorporam em grande escala C&T e naturalmente valor acrescentado, sejam algumas já com alguns anos – como a química fina, a farmacêutica e a aeronáutica – ou emergentes, como sejam as associadas às TIC, as indústrias dos materiais, as biotecnologias, as indústrias associadas aos processos de automação, a aeroespacial, etc., etc., e donde já existam pequenos núcleos e empresas de elevado potencial, as quais, poderão e deverão protagonizar um elevado efeito de demonstração.
- O reforço da componente de I&D na indústria, seja através do aumento do protagonismo dos laboratórios do Estado, centros de investigação, centros tecnológicos e outros de apoio directo ou indirecto à indústria, seja particularmente a nível do débil aparelho de investigação das próprias empresas.
- O desenvolvimento de tecnologias de processo e de produto e meios de produção associados, naquelas indústrias onde tenhamos competitividade distintiva, com vista à diminuição do défice da balança tecnológica, seja na perspectiva da substituição de importações, seja mesmo da exportação de tecnologia, como já ocorre nalguns sectores, como é o caso do calçado.
- Finalmente, reversão do protagonismo do Estado na esfera produtiva, em alguns dos sectores tidos como estratégicos, e portanto capazes de alavancar e dinamizar outros sectores e produções.

Camaradas:
Estes são, em brevíssima síntese, o nosso diagnóstico, a nossa visão e as nossas propostas para a indústria nacional.