Reunida em 22 de Julho, a Comissão Política do PCP apreciou os principais
aspectos da actualidade política nacional, com particular destaque para a gravidade
das soluções já acordadas na Comissão Eventual de Revisão Constitucional da
Assembleia da República, e matéria de regionalização e referendo, entre o PS,
o PSD e também, em alguns casos, com o PP.
1. O processo de revisão constitucional actualmente
em curso revelou, uma vez mais, a convergência do PS e do PSD no sentido de inviabilizar
o referendo acerca da aplicação do Tratado de Maastricht. Trata-se, agora, de
impedir a possibilidade de o povo português se pronunciar designadamente acerca
da terceira fase da União Económica e Monetária, incluindo sobre a moeda única
e os sacrifícios que implica o cumprimento dos critérios de convergência, com
preterição do emprego, do crescimento económico e da satisfação de necessidades
do povo português.
Significativamente, os partidos que impediram agora a criação da
possibilidade de referendar a aplicação do Tratado são os mesmos que
impediram anteriormente que tal referendo se realizasse.
É também inaceitável o facto de o PS e o PSD não terem
permitido referendar em caso algum tratados ou convenções
internacionais, mas apenas "questões de relevante interesse nacional"
neles incluídos, o que permitirá seleccionar — eventualmente de forma
arbitrária — as questões que mais convenham ao poder político. Por
outro lado, desta forma a resposta negativa a todas ou alguma das
questões colocadas poderá não prejudicar a aprovação e ratificação do
conjunto das outras normas do tratado ou convenção. Esta aprovação e
ratificação poderá verificar-se, insiste-se, mesmo que a maioria do
eleitorado se pronuncie contra.
Tendo em conta os diversos projectos de revisão constitucional
que pretendem eliminar direitos e distorcer o sistema de eleição de
órgãos de poder e a perspectiva de prosseguimento da revisão
constitucional sobre outras matérias, o PCP reitera o seu apelo no
sentido de que os trabalhadores e as suas organizações e todos os
democratas se empenhem no sentido de que possam ser evitados, através
da mobilização popular, prejuízos para a democracia e os direitos
fundamentais, em particular para os direitos sociais.
2. Os factos revelam, por outro lado, os crescentes
sintomas de que o PS não está interessado em cumprir as suas promessas em matéria
de regionalização.
Depois de o PS ter defendido a regionalização no seu Programa Eleitoral
e no Programa de Governo e o Primeiro Ministro ter mesmo defendido
publicamente, dentro e fora da Assembleia da República, uma data
concreta para a realização de eleições para as regiões administrativas,
nunca mais referiu tal propósito e, significativamente, no recente
discurso no debate sobre o estado da nação ignorou mesmo totalmente tal
matéria.
Mas é no texto acabado de aprovar na Comissão Eventual de
Revisão Constitucional da Assembleia da República que avulta mais
claramente a posição do PS em matéria de regionalização.
Com efeito, a revisão constitucional irá manter a
regionalização como constitucionalmente obrigatória, mas vai fazer
depender a «instituição em concreto» de um referendo nacional e de um
referendo regional, o que coloca algumas questões fundamentais.
Do ponto de vista prático é incontestável que o PS, depois de
ter jurado que nunca o faria, fez depender o cumprimento de normas da
Constituição de referendo, o que é grave em si e é grave como
precedente que corresponde a antigas reivindicações da direita,
renovadas na presente revisão constitucional. Esta fúria referendária
para criar dificuldades e impedir a regionalização não deixa de
contrastar com o impedimento, uma vez mais, do referendo acerca do
Tratado de Maastricht.
Em segundo lugar, o carácter vinculativo do referendo depende
da participação de pelo menos 50% dos eleitores, o que pode tornar a
validade de normas já aprovadas pela Assembleia da República,
designadamente a Lei de Criação das Regiões, dependente dos
abstencionistas, ou melhor, em boa parte de inscritos em cadernos
eleitorais que já deveriam ter sido eliminados e que são em grande
número em Portugal.
Importa ainda sublinhar que, obrigando a aplicação destas
normas à realização de um referendo nacional e de referendos regionais
sobre as regiões administrativas à aprovação de uma lei ordinária que o
regulamente, o PS não garantiu uma maioria para a sua aprovação. Este
facto é tanto rlevante quanto os partidos de direita estão contra as
regiões e o PCP se pronunciou contra a situação política e
juridicamente absurda em que o PS se meteu e que só serve a direita e
os adversários da regionalização.
O PCP sublinha, entretanto, que enquanto este processo decorria na
Assembleia da República prosseguiu o debate público sobre a
regionalização. Neste quadro, as assembleias municipais e outros órgãos
autárquicos que pronunciaram-se massiçamente a favor das regiões, sobre
as suas áreas e sobre outras matérias relacionadas. Por isso, é
justo afirmar que este procedimento do PS, em coincidência com os
partidos de direita, contraria a generalidade das posições que se têm
vindo a manifestar pelos municípios, que sentem pesadamente os
inconvenientes do centralismo e da burocracia na sua actividade e
reclamam generalizadamente, agora como há muito, a instituição das
regiões administrativas.
O PCP anuncia que prosseguirá a sua campanha de debates sobre a
regionalização e continuará activamente a participar nos debates
promovidos por outras entidades, de modo a contribuir para que, apesar
de todas as dificuldades criadas, acabe por se concretizar esta
importante reforma democrática.
3. Tendo prosseguido a análise da situação criada
nos exames nacionais do ensino secundário, o PCP considera que os factos têm
dado novas razões e fundamentos às propostas que apresentou e às críticas generalizadas
ao Governo e ao Ministério da Educação e à sua política e actuação nesta matéria.
O PCP considera que depois da resolução que foi tomada na Assembleia da
República é incompreensível que o Ministério da Educação, face à
situação insustentável em que se colocou, não opte pelo diálogo com
todas as partes envolvidas.
Importa, entretanto, relembrar que esta situação,
independentemente da inépcia com que foi executada, é inseparável de
uma política de educação que, na continuidade da política do PSD, tem
como objectivo fundamental dificultar a possibilidade de os alunos do
ensino secundário acederem ao ensino superior público.
Nesse sentido, o PCP entende que, para além das questões imediatas,
se impõe lembrar a necessidade de valorizar o ensino superior público e
pôr termo ao numerus clausus. É oportuno, aliás, recordar o projecto de
lei apresentado pelo PCP na Assembleia da República, que adianta
medidas concretas para atingir esse objectivo em três anos e por cuja
aprovação lutará na próxima sessão legislativa.
Numa área que é fundamental para o futuro do país e para o presente e o
futuro da juventude portuguesa e que o Primeiro Ministro afirmou ser
prioritária não podem continuar a prevalecer critérios elitista e
estreitamente economicistas. A educação tem que valer mais em Portugal do que a moeda única e o cumprimento dos critérios de Maastricht para a alcançar.
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