Jerónimo de Sousa Secretário-geral do PCP
Camaradas delegados
Camaradas e amigos convidados nacionais
Estimado camaradas e amigos convidados das delegações estrangeiras
Estamos no limiar do encerramento do nosso XVII Congresso.
Sendo ponto de chegada dum debate iniciado em Fevereiro, que envolveu
largos milhares de militantes do Partido, que mobilizou todas as organizações
partidárias de norte a sul do Continente, das Regiões Autónomas
da Madeira e dos Açores e na emigração, num total
de 1693 Assembleias, reuniões plenárias, debates e outras
iniciativas onde participaram mais de 20 mil camaradas, contando com contribuições
individuais de camaradas que recorreram à tribuna aberta do Avante!
e à Net, e da qual resultaram centenas de propostas acolhidas no
projecto inicial, num conjunto de mil e cem propostas, sugestões
e reflexões que nos chegaram ao Partido e ao Congresso. Aqui chegados,
feita a discussão, realizadas as votações sobre a
Resolução Política, as alterações aos
Estatutos e a eleição da Direcção e do órgão
de jurisdição, conseguimos alcançar um objectivo:
afirmar este Partido Comunista e eleger uma Direcção capaz
dessa afirmação.
Nestes 3 dias há um facto que marca a diferença deste Partido
em relação a outros, deste Congresso em relação
a outros Congressos recentemente realizados por outros Partidos.
Diferente na participação, diferente nos conteúdos.
Por aqui não passou aquele penoso ambiente de oradores a falar
para umas dezenas de delegados devido à ausência dos chefes,
dos candidatos a chefes ou dos zangados com os chefes. Por aqui não
passou a intervenção, da fulanização, dos
conteúdos e posicionamentos de voto determinados em função
do poder ou do lugar ambicionado a pensar na grelha de partida das listas
para cargos das autarquias, de deputados ou, sabe-se lá, se não
mesmo de ministros ou pelo menos de secretários de Estado.
Os delegados ao XVII Congresso do PCP dignificaram com a sua presença
permanente o mandato que lhes foi atribuído, numa demonstração
de democracia que pede meças a qualquer outro Congresso de qualquer
outro Partido. Não foi um acto forçado por disciplina. Foi
um acto de consciência livre e responsavelmente assumido.
Por imposição duma lei que colide com valores democráticos
e constitucionais, elegemos a Direcção por voto secreto.
Considerámos que para prosseguir o nosso combate contra esta lei
de imposição tínhamos de defender o Partido.
O Comité Central foi eleito quase pelo pleno dos 1307 delegados
e por 95% dos votos favoráveis.
Neste como noutros congressos o PCP sempre demonstrou ser não
um Partido inadaptado à democracia, fixado em regras do tempo do
seu heróico combate à ditadura fascista, que inscreve no
seu programa as eleições como fundamento directo do poder
político e da legitimidade da constituição dos seus
órgãos. O que não aceita são ingerências
e imposições que condicionam a soberania dos seus militantes,
que limitem a liberdade pela qual tanto lutámos e que fragilizam
a própria democracia. A revogação dessa lei seria
um saudável exercício democrático.
Sobre a Direcção eleita duas ou três referências
importantes:
A primeira é a significativa renovação com a entrada
de 27 jovens com menos de 30 anos para o Comité Central, o que
não sendo um valor em si mesmo permite caldear a geração
do futuro com as gerações temperadas e experimentadas no
trabalho de Direcção.
A segunda é a subida da percentagem de camaradas mulheres no Comité
Central e nos seus Organismos Executivos, que conduz não a um sentimento
de satisfação mas à necessidade duma consideração
mais audaciosa quanto à participação e responsabilização
de camaradas mulheres na Direcção e na vida do Partido.
A terceira tem a ver com saídas dos Organismos Executivos e do
Comité Central e substituição do Secretário-geral.
De uma forma geral são quadros que continuarão na Direcção
do Partido ou no Partido, homens e mulheres que deram o melhor do seu
esforço, militância e inteligência. Não estamos
a homenagear nem a fazer despedidas já que continuarão connosco
e acima de tudo estarão com o Partido, com o seu ideal e a sua
luta.
Ao camarada Carlos Carvalhas, que aceitou e realizou, entre muitas outras,
uma das tarefas mais exigentes que podia ser colocada a um militante comunista,
interpretando o sentimento mais forte do nosso colectivo partidário,
queremos manifestar sincera convicção de que, nas horas
boas e nas horas más, partilhará e ombreará connosco
em outras lutas, animado e empenhado no reforço da unidade e coesão,
prestígio e influência do seu Partido, do nosso Partido Comunista
Português! É este o sentido da nossa saudação
fraternal.
Camaradas
Se no debate preparatório não fechámos para Congresso
também nestes três dias não nos fechámos sobre
nós próprios, sobre questões internas e muito menos
nos deixámos condicionar pela campanha que nos queria conduzir
para a fulanização descontando já as campanhas e
profecias do costume dum Partido e dum Congresso fustigado pela autoflagelação
e divisão, acicatando o preconceito, rotulando e caricaturando
este partido que, sendo um lutador incansável pela liberdade, tem
um papel e um lugar indispensável na democracia portuguesa.
Não fizemos nenhuma catarse, não somos uma tertúlia
onde se discute até cansar para no dia ou dias seguintes voltarmos
a rediscutir o discutido enquanto os problemas subsistem e a vida vai
passando ao lado.
Assumimos uma tese:
Dificuldade não significa impossibilidade!
Falámos de nós, da nossa vida partidária mas nem
aí estabelecemos fronteiras com os problemas dos trabalhadores,
do povo e do país.
Aqui afirmámos que o nosso combate imediato e continuado é
contra o Governo e a política de direita. Demonstrámos que
o executivo PSD-CDS/PP é responsável pela recessão
do país e pelo seu aprofundamento e prolongamento, pelo distanciamento
mais acentuado da economia portuguesa em relação à
media europeia, pelo agravamento da situação social.
Aumentou o desemprego e as dificuldades das famílias enquanto
aumentaram os lugares para amigos e correligionários, aumenta a
criminalidade e a insegurança e as desigualdades. Empresas e património
público é vendido a preço de amigos, demonstrando
que, ao contrário do que dizia Santana Lopes, vão-se os
dedos e vão-se os anéis. Com inquietação assiste-se
a sinais de pressão e censura na comunicação social.
Se o Presidente da República sustentou a sua lamentável
opção de empossar este Governo com base no critério
da estabilidade, ela não existe nem no plano político, nem
no plano económico, nem no plano social. Há quem aguarde
por um rebate de consciência. Nós comunistas confiamos mais
na consciência, no protesto e na luta dos trabalhadores e de todos
os portugueses e portuguesas que sentem a necessidade de mudar este estado
de coisas, ou seja, lutar contra esta política e derrotar este
Governo, evitando mais estragos irremediáveis para o povo e para
o país.
É necessário e é urgente uma outra política
e um outro Governo.
E este é o primeiro apelo deste Congresso dirigido a todos os
trabalhadores, a todos os que se sentem atingidos e penalizados por esta
política, a todas forças democráticas, a todos os
cidadãos inquietos e insatisfeitos com o futuro do seu país
e da democracia, para que convirjam no objectivo de pôr fim a esta
política desastrosa e a este Governo.
Neste Congresso assumimos o compromisso de nos empenharmos, de não
regatear nenhum esforço para o êxito desta convergência
e desta luta.
E se este é o caminho mais sólido e seguro para alicerçar
a construção duma verdadeira alternativa política,
importa saber como é que ela se concretiza.
Discutimos e debatemos essa questão crucial, definimos e aprovámos
orientações. Considerámos a sua necessidade e da
sua possibilidade.
Tratando-se duma alternativa de esquerda a encontrar no plano institucional,
há uma primeira questão incontornável.
Há forças democráticas, designadamente o PS, que
afirmam que o PCP tem de mudar na sua postura e disponibilidade, nas questões
estruturantes em relação à política económica,
à definição que fazemos sobre a evolução
da União Europeia, nas questões da segurança e de
defesa. Ou seja, precisamente em questões onde o PS mais se confunde
e acerta o passo com a direita.
O problema é que o PS põe as coisas ao contrário:
Uma força política como o PCP, que assume de forma coerente
e consequente valores, causas e um projecto de esquerda devia abdicar
deles! um partido como o PS que se afirmando de esquerda praticou e pratica
uma política de direita manter-se-ia tal como está.
Não dá resposta à contradição fundamental
que é a de saber se é possível uma alternativa verdadeiramente
de esquerda, mantendo, exercendo e executando uma política de direita.
Afirmámos aqui no Congresso que não renunciamos à
convergência, ao diálogo com forças e sectores democráticos
em tudo o que servir os interesses dos trabalhadores, do povo e do país.
Mas não peçam ao PCP que deixe de ser o que é, que
deixe de defender e de lutar por outra política, uma política
de esquerda que rompa com o circulo cansativo e desgastado da alternância,
uma política de verdade que nem sempre dá votos mas que
vincula este partido ao compromisso que tem com os interesses, direitos
e aspirações dos trabalhadores e do povo como razão
de ser da sua natureza, da sua vida, da sua existência e da sua
luta.
Aqui estamos prontos para as batalhas e as tarefas que aí vem.
Estaremos nas batalhas com os trabalhadores tendo em conta a ofensiva
que aí está: o desemprego crescente, os bloqueios à
contratação colectiva, as novas ameaças que decorrem
para os horários de trabalho da aplicação imperativa
das normas mais gravosas do Código do Trabalho a partir do próximo
dia 1 de Dezembro, os perigos que decorrem para o direito à Segurança
Social, à saúde, ao ensino público.
Aqui estamos na primeira linha do combate em defesa dos direitos das
mulheres e pela sua participação em igualdade. E daqui reitero
o apelo feito às mulheres portuguesas, aprovado no XVII Congresso,
para que reforcem a sua unidade e acção organizada em torno
de problemas e reivindicações comuns, pelo exercício
de direitos económicos, sociais, laborais e políticos; uma
luta que afronte e responsabilize a actual maioria PSD-CDS/PP e contribua
para a luta pela construção de uma alternativa à
política de direita, condição necessária ao
êxito da sua justa aspiração de igualdade.
Aqui estamos prontos para desmistificar o ensaio que está a ser
feito em torno do referendo sobre o denominado Tratado Constitucional
da União Europeia, a travar a batalha do esclarecimento, sobre
o que visa: dar um passo mais adiante na nossa perda de soberania e dar
cobertura à política militarista e neoliberal que marca
hoje a evolução da União Europeia.
Daqui partimos em melhores condições para travar a batalha
das eleições autárquicas a exigir um forte empenhamento
do conjunto das organizações do Partido para, lado a lado
com os nossos parceiros de coligação, o Partido Ecologista
Os Verdes e a Intervenção Democrática, lado a lado
com milhares de democratas e cidadãos independentes, afirmando
a CDU e o PCP como uma grande força nacional autárquica
com um peso e uma influência correspondentes ao valor do seu trabalho
e do prestígio conquistado pela obra, pela honestidade e competência.
Daqui lançamos um desafio para que haja uma ruptura com a política
de direita que dura há décadas, que rompa com o neoliberalismo
e a concentração da riqueza, que valorize o nosso aparelho
produtivo e uma produção de maior e mais rico valor acrescentado,
a centralidade e a valorização do trabalho dos portugueses
como elemento intrínseco da economia, o combate aos três
grandes défices (tecnológico, energético, alimentar),
a defesa da nossa soberania e o interesse nacional.
O que deste Congresso se expressou com mais força e sentido foi
a afirmação confiante de que o povo e o país não
estão condenados por qualquer fatalidade ou má sorte, que
é possível outra política e um futuro melhor.
Camaradas
Reafirmámos o nosso carácter patriótico e internacionalista.
Se valorizamos e priorizamos a nossa acção e a nossa luta
no plano nacional não é porque nos acantonemos e não
entendamos a necessidade cada vez mais premente de dar respostas mais
globais ao processo de globalização capitalista.
Os nosso êxitos, a nossa luta, as nossas experiências aqui
no nosso país são a melhor contribuição para
o desenvolvimento da solidariedade, cooperação internacionalista,
a nossa melhor contribuição para fazer frente à ofensiva
imperialista.
Nós acompanhamos e empenhamo-nos no vasto movimento antiglobalização
capitalista na luta contra o neoliberalismo e a guerra, respeitando e
estimulando a sua diversidade. Mas julgamos que a existência e participação
de Partidos Comunistas, de Partidos de classe, nesse vasto movimento não
é só um bem para estes partidos mas um bem para a esquerda
e para as forças progressistas que o integram, na medida em que
consideramos que a questão da luta de classes continua a ser a
grande questão da nossa época contemporânea.
Reafirmámos aqui a nossa admiração e a dimensão
solidária com os povos, a luta dos trabalhadores, as heróicas
afirmações de luta dos povos frente ao imperialismo em defesa
da sua soberania, das escolhas e opções livres para traçarem
o seu próprio rumo.
Reafirmámos aqui a nossa solidariedade ao povo e à revolução
cubana, ao povo mártir da Palestina, aos movimentos progressistas
de libertação, aos milhões de homens e mulheres que
à escala planetária demonstram uma vontade inabalável
do mundo mais justo, mais seguro e mais democrático, a convicção
que o capitalismo não será o fim da história da humanidade,
que a alternativa é o socialismo.
A vós, camaradas e amigos das delegações estrangeiras,
gostaríamos que transmitissem aos vossos partidos e organizações
que podem contar com os comunistas portugueses na luta por um mundo melhor,
mais justo, fraterno e solidário, que nas horas boas e nas horas
más, nos insucessos e nos êxitos estaremos sempre juntos
neste fascinante processo de transformação social.
Camaradas
Temos orientações, assumimos deliberações,
elegemos a Direcção, afirmámos um Partido de proposta,
de luta e de projecto. Temos ideias para o futuro.
Confiamos que muitos e muitos portugueses compreenderão que este
não foi um Congresso invadido por qualquer sentimento de forte
isolado e cercado mas de um PCP que sabe, pela sua história, pela
sua vida e pela sua luta, que enquanto estiver ancorado nos interesses,
direitos e anseios dos trabalhadores e do povo português nunca se
sentirá cercado. Um PCP constituído por mulheres e homens
livres, voluntariamente associado em torno de um grande e honroso projecto
de liberdade, democracia e socialismo, que numa atitude de grandeza cívica
e consciência política, sem nenhuma perda da sua individualidade,
também de forma livre decidiram forjar uma grande obra colectiva
que dá força e eficácia aos valores e ideais em que
acreditam.
Com aquela confiança e convicção de que continuamos
com mais projecto que memória, aos comunistas portugueses vai ser
exigida coragem política, coragem ideológica, coragem moral
e se necessário coragem física para continuar, para encetar
o caminho duma democracia avançada e do socialismo.
Pela classe operária, pelos trabalhadores, pela juventude, pelo
povo, com a democracia por Portugal.
Viva o XVII Congresso!
Viva o Partido Comunista Português!