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Audição «Por uma nova política de combate à pobreza e à exclusão Social» - Intervenção João Araújo
Terça, 23 Outubro 2007

 

Os instrumentos de combate à pobreza e à exclusão social e intervenção junto de grupos de risco – as políticas alternativas que se impõem

As sociedades actuais estão sujeitas a constantes mutações, não tanto em consequência de um processo natural de desenvolvimento civilizacional centrado nas necessidades, interesses e ambições dos povos, mas sobretudo em consequência de opções que os Governos dos Estados tomam.

Desde as alterações demográficas, familiares, sociais e económicas até aos grandes progressos científicos e tecnológicos, passando pela intensificação da concorrência internacional, tudo o que vai acontecendo continua a revelar que a pobreza e a exclusão social são fenómenos sociais com causas e efeitos muito concretos e não fatalidades.

A pobreza e a exclusão social persistem em todo o Mundo, com diferentes causas, efeitos e dimensões que resultam, sobretudo, das políticas sociais e económicas, da utilização dos recursos para satisfazer as necessidades das populações e dos respectivos padrões de vida, nos diferentes países.

Os projectos de luta contra a pobreza nos Estados da União Europeia têm já uma longa história, no entanto, sem sucessos assinaláveis quanto aos objectivos neles propostos.

Actualmente, no programa estratégico da União Europeia e em cada um dos respectivos Estados-Membros, a inclusão social é uma matéria importante, tanto mais que está assumido o objectivo estratégico de tornar a Europa comunitária num espaço baseado na economia do conhecimento mais competitiva do mundo, promovendo mais e melhores empregos e mais coesão social e, também, o compromisso de produzir um impacto decisivo na erradicação da pobreza e da exclusão social.

Em Portugal, no Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI 2006/2008) é reconhecido que:
- no combate à persistência da pobreza, a elevação dos níveis de qualificação constitui um factor determinante, embora não exclusivo, uma vez que potenciam a limitação de processos de exclusão, designadamente os que se associam à capacidade de entrar e permanecer no mercado de trabalho;

- entre os grupos vulneráveis a fenómenos de pobreza e exclusão, a população com deficiência constitui o grupo cuja multiplicidade de problemas e défice histórico de respostas torna necessário uma aposta premente e reforçada;

- a dimensão dos fluxos migratórios associada a difíceis condições de inserção de parte significativa dos imigrantes, coloca este grupo como um dos que necessita de uma forte intervenção no combate à pobreza e exclusão, constituindo-se também como uma medida preventiva do crescimento de fenómenos discriminatórios.

Tendo o Governo Português assumido as seguintes prioridades políticas:

- Combater a pobreza das crianças e dos idosos, através de medidas que assegurem os seus direitos básicos de cidadania;

- Corrigir as desvantagens na educação e formação/qualificação;

- Ultrapassar as discriminações, reforçando a integração das pessoas com deficiência e dos imigrantes.
 
Mas a realidade da pobreza e da exclusão social em Portugal exige mais extensas e diversificadas actuações no âmbito da estratégia de inclusão social e que seja assegurada a disponibilização dos recursos necessários.

A falta de políticas que resolvam os problemas sociais do país, como a injusta repartição do rendimento nacional, o baixo valor das pensões, os baixos salários, o desemprego, a precarização do emprego e das relações laborais, a saúde; a deficiência; a toxicodependência, entre outros, é uma questão central que tem que ser apontada.

Em Portugal mantêm-se níveis de pobreza muito elevados e uma enorme assimetria na distribuição dos rendimentos e da riqueza.

Para acolher o verdadeiro sentido de eliminação das situações de pobreza e de exclusão social e de adequada intervenção juntos dos grupos de risco, devem ser tomadas medidas que transformem as estruturas e as instituições sociais, económicas, políticas e culturais e permitam a realização de todos os direitos dos cidadãos.

Nos princípios orientadores do PNAI 2006/2008 destacam-se:

- A consagração de direitos básicos de cidadania, que postula o direito ao trabalho e a apoios básicos com vista à inserção, mas também ao exercício dos direitos cívicos, à cultura, à educação, à habitação condigna e à participação na vida social e cultural;

- A responsabilização e a mobilização do conjunto da sociedade e de cada pessoa no esforço de erradicação das situações de pobreza e exclusão, com particular enfoque na contratualização das respostas de protecção social.

- A integração e multidimensionalidade entendidas como convergência das medidas económicas, sociais e ambientais com vista ao desenvolvimento e promoção das comunidades locais, apelando à convergência de sinergias e à congregação dos recursos;

- A combinação adequada entre a universalidade e a diferenciação positiva, ou seja, a garantia de que, no cumprimento dos objectivos de inclusão social, todos os cidadãos e cidadãs são efectivamente tratados como iguais na base da diversidade das suas situações e necessidades e em relação com os recursos e as oportunidades;

- A territorialização das intervenções como aproximação e adequação às especificidades locais, aí criando dinâmicas de potenciação dos recursos e das competências;

- O reconhecimento da importância da igualdade de oportunidades e da perspectiva de género, como forma de garantia do exercício dos direitos tanto na esfera pública como na esfera privada.

Teoricamente, estão expressos uns bons princípios, mas são fracas as expectativas de uma boa execução dos objectivos, porque estamos a assistir a políticas de retrocesso social que, para além de acentuarem as desigualdades na repartição dos rendimentos e da riqueza, atacam conquistas sociais que fazem parte do nosso património civilizacional e reduzem os direitos sociais.

O princípio da diferenciação positiva tem sido aplicado pelo Governo português, nalgumas modalidades do Sistema Segurança Social, com o fundamento de apoiar os agregados de menores rendimentos, consistindo, como a lei o define, na flexibilização e modulação das prestações em função dos rendimentos, das eventualidades sociais e de outros factores, nomeadamente, de natureza familiar, social, laboral e demográfica.

É um princípio que, se à sua aplicação corresponder uma lógica de equiparação de oportunidades e de modos de vida que vá ao encontro do princípio da igualdade, é positivo, mas que não pode ser visto de modo abstracto, pois há que ter em conta qual o modelo de diferenciação positiva que é adoptado, tendo em conta os valores dos limites dos escalões de rendimentos e os valores das prestações fixados pelos Governos.

Se tivermos um Governo preocupado em apenas gerir a pobreza esses valores são uns, mas se tivermos um Governo que quer eliminar a pobreza e a exclusão social os valores serão outros.

Só com dados definitivos se pode formar uma opinião segura, mas pelo que é mais visível (nos casos doa abonos de família e das pensões) pode dizer-se que em Portugal a aplicação do princípio da discriminação positiva se traduz, eventualmente, em ligeiras melhorias, sem alcançar resultados muito significativos.

Cabe aqui dizer também que não podemos esquecer que estamos a assistir a políticas de desresponsabilização do Estado nas suas funções sociais, o que corresponde a aumentos dos encargos das pessoas e das famílias, cujos impactos são mais dolorosos para aqueles que têm menores recursos.

Alguns crêem que a pobreza e a exclusão social existem e sempre existirão, por isso, quando falam naqueles princípios, estão a pensar, sobretudo, em como fazer a gestão da pobreza, tomando medidas para apoiar as pessoas a adaptarem-se ao modelo de sociedade existente.

Penso de modo diferente: A existência de grupos de risco, a pobreza e a exclusão social são fenómenos que se prendem com o modo de funcionamento da sociedade e que podem ser erradicados transformando esse modo de funcionamento.

As políticas governativas devem considerar que o desenvolvimento de Portugal só têm sentido se a componente social for tida na devida conta e o crescimento económico e o progresso social acontecerem em conjunto.

A valorização dos pontos de vista estritamente económicos em detrimento das questões sociais torna difícil encontrar as respostas necessárias para eliminar as situações de pobreza e exclusão social, que persistirem nas suas formas tradicionais e aparecerem com novas formas, e de intervenção junto dos grupos de risco.