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Quando há problemas de escassez de água, sentimos a sua importância e descobrimos que é insubstituível nas suas múltiplas funções, um bem público, um direito universal do ser humano, suporte de vida, factor climático, ambiental e determinante de toda a vida, factor estratégico de produção, sucessivamente reutilizável, pelo que deve ser protegida e, em caso algum, ser tratada como uma mercadoria. Desempenhando a água um papel vital nas actividades humanas, todas as medidas que a envolvem devem contribuir para a sua disponibilização em quantidade e qualidade suficiente, no espaço e no tempo, sem colocar em causa as reservas estratégicas e a sua função ecológica. Por isso, a situação de seca deve ser encarada com medidas de curto, médio e longo prazo no sentido de reduzir a vulnerabilidade de Portugal face à variação hidrológica, tendo sempre presente que a sua gestão deve ser pública e não sujeita à privatização e ao objectivo lucro, como tem acontecido com as ditas concessões municipais. Há, pois, necessidade de se hierarquizar e optimizar a utilização da água, garantindo a satisfação prioritária das funções mais essenciais, o que exige, para além da sensibilização e coordenação de esforços das entidades públicas, dos agentes económicos e sociais e da população em geral, medidas urgentes de protecção das origens, especialmente as que são usadas para abastecimento público, e a instalação das infra-estruturas indispensáveis à captação, tratamento e distribuição da água nos locais onde é mais necessária. Ora, tudo isto assume uma maior importância num momento, como o actual, em que Portugal atravessa um período de seca muito excepcional, cujos efeitos sociais, económicos e ambientais, sendo já gravosos, só tendem a acentuar-se com o aproximar do Verão e da estiagem. Foi por isso que tentámos que a Comissão Europeia compreendesse a situação excepcional, com a proposta de Resolução do Parlamento Europeu sobre as consequências da seca em Portugal, votada na semana passada, chamando a atenção para as fortes repercussões sócio-económicas, nomeadamente na área agrícola, já que esta situação está a provocar uma crise no sector agro-pecuário e a colocar em causa o abastecimento público de água em diversas regiões. É verdade que a Resolução aprovada não acolheu todas as propostas que tínhamos, designadamente sobre a questão da água, mas acolheu outras posições importantes para os agricultores, que só os deputados comunistas apresentaram, de que destaco: - considera necessário avançar para a criação de um seguro agrícola público, financiado por fundos comunitários, que permita garantir um rendimento mínimo aos agricultores em casos de calamidades públicas, como a seca e incêndios; - considera necessário obter uma linha de apoio financeiro que minimize o acréscimo de custos e a diminuição da produção agrícola, bem como a isenção temporária de contribuição para a segurança social (sem perda de direitos) para agricultores a tempo inteiro com rendimento inferior a 12 UDE e a prorrogação do crédito de campanha, por dois anos, sem juros. Continuamos a insistir que, no âmbito da aplicação dos fundos estruturais e do fundo de coesão, seja dada prioridade às questões da água em Portugal. Sabe-se que há atrasos substanciais na construção de sistemas de armazenamento de água e de canais de rega, há muito iniciados e previstos, seja no Alentejo, seja na zona da Cova da Beira, além dos atrasos em muitos municípios, designadamente no centro e Norte do País. Ficou, também, claro que houve perdas irremediáveis na produção agrícola e pecuária, um decréscimo acentuado na produção hidroeléctrica e há já perturbações no abastecimento público a algumas povoações, pelo que as culturas agrícolas de Outono/Inverno foram perdidas por fraca germinação e/ou não desenvolvimento normal, além dos problemas que podem surgir com os fogos florestais no verão que se avizinha. Igualmente as expectativas em relação às culturas agrícolas de Primavera/Verão são muito reduzidas, já que se está a entrar no período de estiagem com reservas superficiais e subterrâneas muito reduzidas, colocando em risco as sementeiras/plantações desse período, como o tomate, milho, arroz, frutas e hortícolas, bem como a alimentação dos animais e o desenvolvimento normal de culturas de Outono, como os citrinos, a batata e a vinha. Ora, a verdade é que a reforma da PAC obriga os agricultores a assumir a responsabilidade pela gestão dos riscos que eram anteriormente absorvidos pelas políticas de apoio ao mercado e aos preços, e, como resultado da liberalização do comércio, a actividade agrícola mantém-se vulnerável a riscos e crises específicas que escapam ao controlo do agricultor. Daí a insistência que fazemos no cumprimento das propostas aprovadas na defesa dos agricultores, embora seja também necessário abordar com profundidade toda a questão da água para consumo, o que farei numa próxima oportunidade. |