Camaradas:
Há 20 anos atrás a CEE foi
vendida ao povo português como um espaço de liberdade, de cooperação e
desenvolvimento. Aos restantes povos do mundo é ainda vendida como um espaço de
paz, dialogante, de cooperação. Recordemos os discursos de circunstância
prometendo prosperidade para África e para a Bacia do Mediterrâneo e os
conceitos como parcerias e multipolaridade. Discursos e conceitos aparentemente
simpáticos mas na realidade criados pelas classes dominantes europeias –
manipulando genuínos e correctos sentimentos de apoio à cooperação e de
rejeição da hegemonia norte-americana – para criar dentro e fora da Europa um
lastro político capaz de ocultar a verdadeira natureza imperialista da União
Europeia.
No entanto a realidade aí está a
revelar a verdadeira natureza do processo de integração capitalista na Europa.
Analisando a história da UE vemos facilmente como a união económica e
monetária, o colete de forças do Pacto de Estabilidade, a PAC, as revisões dos
tratados, as reformas institucionais, a Estratégia de Lisboa, a directiva
Bolkeinstein, o processo de Bolonha, a PESC e a PESD, a dita constituição, etc,
etc não são mais do que instrumentos usados pelo grande capital e grandes
potências para manterem o controlo dos comandos deste grande Titanic que ao
contrário do outro para não se afundar tem que embarcar sempre mais passageiros
para a 3º classe. Ou seja tem que por um lado procurar novos membros submissos
às exigências do centro e por outro buscar novas zonas de expansão de mercados
e de apropriação de recursos para alimentar as principais economias europeias e
os grandes grupos económicos.
Argumentam alguns com a
necessidade de contrariar a hegemonia norte-americana. Mas com que objectivo?
Mudar os exploradores e manter a exploração? Isso faz diferença aos povos que
são diariamente alvo da ofensiva imperialista? Obviamente que não! E esta é uma
questão central na análise da situação internacional. É que se é verdade que
existem contradições entre as principais potências capitalistas mundiais – e
isso é verdade inclusive dentro da própria União Europeia – não é menos verdade
que a concertação entre elas continua a ser característica essencial das
relações internacionais. Uma concertação de classe que ocorre no quadro de uma poderosa ofensiva do imperialismo cujos
alvos são os trabalhadores, os povos e os países menos desenvolvidos do mundo.
Uma ofensiva que extravasou há muito o plano económico e social e se desenvolve
hoje também no plano militar, cultural e dos direitos liberdades e garantias.
Ora a União Europeia, como
potência imperialista em processo de afirmação insere-se e adapta-se a essa
ofensiva pois dela é também agente.
No plano económico a UE á
apresentada hipocritamente como um escudo defensor das economias europeias face
à crescente liberalização e desregulamentação dos mercados. No entanto a
realidade mostra que são os governos das principais potências europeias que
participam activamente na definição das políticas emanadas de organizações como
o FMI ou o Banco Mundial que representam autênticos coletes de forças que
impedem o desenvolvimento económico e social dos países em desenvolvimento e
sugam os seus recursos para o centro capitalista através, entre outros
mecanismos, da dívida externa. A realidade mostra que são as classes dirigentes
da União Europeia que apoiam a total liberdade de circulação do capital
estrangeiro, nomeadamente o especulativo, recusando-se a acabar com os paraísos
fiscais e os Off-Shores. A realidade mostra que no seio da OMC a UE defende,
lado a lado com norte-americanos, a
liberalização total, nomeadamente nas áreas agrícola e dos serviços, visando a
internacionalização das multinacionais europeias e a exploração de mão-de-obra
barata e dos recursos dos países menos desenvolvidos.
De facto a defesa dos interesses
dos grandes grupos económicos e das multinacionais é que é a constante na
política económica da União Europeia e não a defesa dos interesses das suas
economias ou a cooperação para o desenvolvimento, seja no plano do comércio
mundial, seja no chamado mercado interno. Aí, a desregulamentação e a adopção
de políticas comuns de controlo e centralização da produção são os instrumentos
usados para transferir para as economias mais débeis da União Europeia e para os trabalhadores as consequências
negativas das negociações em torno da liberalização do comércio mundial. Neste
processo de concentração económica e de internacionalização do capital europeu
são peças chave o processo de alargamento, que significa mão-de-obra barata
para deslocalizações e novos mercados para escoamento da produção; as chamadas
zonas de mercado livre com países periféricos, leia-se zonas de intervenção
neo-colonialista; a multiplicação de acordos bilaterais com países terceiros
com os mesmo propósitos que presidem às negociações na OMC e obviamente a
aprovação do tratado constitucional.
Mas se no plano económico os
objectivos da União Europeia são claros é no plano da chamada política externa
que se torna ainda mais evidente a real natureza da União Europeia. Através das
políticas europeias de segurança e defesa, a União Europeia avança na sua
transformação num bloco político militar imperialista com ambições de
intervenção global. Simultaneamente reafirma o seu compromisso com a NATO que
por sua vez, e como se pôde constatar na recente cimeira de Riga, se afirma
progressivamente como organização global de carácter ofensivo pretendendo
inclusive no plano do direito internacional esvaziar, perverter e substituir-se
à própria ONU. E nesta matéria, camaradas, a coexistência da concertação e
rivalidade é por demais evidente. Por um lado tenta-se armar a UE para servir
os interesses do complexo industrial militar europeu, para ganhar peso negocial
e disputar com os EUA as chamadas zonas de influência - como está a acontecer
no Médio Oriente e África. Por outro, reafirma-se a UE como pilar europeu da
NATO; desenvolvem-se com a participação activa da União Europeia ditas
parcerias que visam a extensão das forças e das bases da NATO a todo o mundo -
como é o caso dos acordos em África, no mediterrâneo e outras zonas do globo –
utilizando os pretextos do combate ao terrorismo e do controlo da imigração;
coloca-se no processo de alargamento a leste, a adesão à NATO como
pré-condição; colabora-se e dá-se cobertura a acções criminosas dos EUA como os
voos da CIA e as prisões secretas; participa-se e/ou apoia-se, apesar de
contradições de circunstância ditadas pelos interesses das multinacionais do
petróleo, as guerras imperialistas no Iraque e Afeganistão; dá-se cobertura e
participa-se no bloqueio ao povo palestiniano; apoia-se objectivamente Israel
na agressão ao Líbano e avança-se nas manobras de neo-colonização do continente
africano ao mesmo tempo que se aprofunda o conceito da Europa fortaleza e se
adoptam políticas xenófobas e racistas de controlo da imigração.
Seria possível continuar a dar
exemplos de como a União Europeia não difere dos EUA nas relações
internacionais. Poderíamos falar por exemplo do direito internacional, tantas
vezes citado por dirigentes europeus e tantas vezes espezinhado pelos mesmos,
consoante as circunstâncias. Poderíamos falar da ONU e dos projectos europeus
para a sua reforma cozinhados com os EUA para impedir a sua real
democratização. Poderíamos falar do antagonismo entre um discurso fácil de
liberdade e cooperação e a constante guerra política contra os processos
progressistas em curso na América Latina e especialmente contra Cuba
socialista. Podíamos ainda falar das manobras de revisão da História de
libertação dos povos e de perseguição aos comunistas quer no plano das
instituições europeias quer no plano dos Estados. Todos estes exemplos
exemplificam bem a hipocrisia que preside a este projecto de União Europeia que
usa e abusa nos discursos dos valores da solidariedade e da cooperação para
construir, à margem da vontade dos povos - como o demonstra a nova tentativa em
curso para forçar a aprovação do tratado constitucional derrotado nas consultas
populares - uma potência imperialista na Europa. Mas felizmente, e como a
situação internacional o está a demonstrar, os povos são capazes de nas mais
difíceis condições tomar nas suas mãos o seu próprio destino, resistir e
avançar. Estamos certos de que isso acontecerá e que uma outra Europa de povos
e nações soberanas, aberta ao mundo, de Paz e Cooperação entre os seus povos e
com todos os povos do mundo é possível. Cá estamos para, com confiança,
prosseguir essa luta!
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