Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
no Festa CDU para apresentação da Lista de Candidatos da CDU
pelo círculo eleitoral de Setúbal
9 de Janeiro de 2005

(Extractos)

Camaradas:

Foi-nos dito que há décadas não se via este Ginásio a transbordar de tanta gente, com confiança e alegria.

Vê-se e sente-se!

Curiosamente nós, que temos andado pelo país, mal ou bem pouco ou muito, as televisões têm dado alguma coisa dessas iniciativas. Hoje aqui, na maior e mais participada iniciativa realizada pelas forças políticas no distrito, com mais de mil participantes, nem uma câmara televisiva para amostra.

Não evitam nem calam que aqui se demonstre essa confiança da CDU para travar em boas condições mais esta importante batalha eleitoral em torno dos objectivos a que nos propomos, de derrotar a direita e aumentar o número de votos e de deputados da Coligação Democrática Unitária.

Camaradas:

Uma saudação à lista, uma lista com características ímpares, distinta de qualquer outra que se apresenta neste distrito às eleições de 20 de Fevereiro.

A única que inclui actuais deputados que estão em condições de, junto dos trabalhadores, da população da região de Setúbal, prestar contas da sua actividade, em que sem perder a sua dimensão de deputados da República, nas suas iniciativas, nas suas propostas, nos seus contactos, no franquear das portas do Grupo Parlamentar do PCP e do Partido Ecologista Os Verdes, fora dos períodos eleitorais souberam honrar os seus compromissos com aqueles que lhes confiaram o seu voto, que nunca regatearam a intervenção sobre qualquer problema, causa ou anseio das populações do distrito.

Quem votar na CDU tem razões acrescidas para o voltar a fazer. Quem se iludiu com promessas que não tiveram correspondência na acção dos deputados das outras forças políticas, quem sente a necessidade de dar um sentido de utilidade ao seu voto e acertá-lo com a sua luta, os seus anseios e reivindicações, tem de facto uma alternativa sólida e segura: dêem o seu voto à CDU, dêem mais força à CDU.

Mas, para além dos actuais deputados, esta lista incorpora outros candidatos que representam e expressam a luta dos trabalhadores de diversos sectores, dos jovens estudantes, das mulheres, dos reformados e deficientes, dos micro-pequenos e médios empresários, dos cidadãos e cidadãs preocupados com o seu distrito e com o seu país, desvalorizados nos seus saberes, conhecimentos e criatividade intelectual.

E gostaríamos de transmitir, agora que começam a surgir as primeiras sondagens, as vitórias e derrotas anunciadas, que na nossa sondagem que resulta das nossas iniciativas de pré-campanha em Braga, no Porto, em Aveiro, em Coimbra, em Leiria, em Santarém, em Lisboa, em Évora, em Portalegre e Beja, em Faro, na Madeira, em Castelo Branco, Guarda e Viseu, que o ambiente em torno da CDU é bom, que ressurge um sentimento de confiança, de disponibilidade militante, um reaproximar de amigos para participarem nesta batalha eleitoral.

Não será presunção e será perfeitamente justo afirmar que, hoje aqui, confirmamos essa confiança!

Camaradas:

Afirmámos na apresentação do camarada Francisco Lopes como cabeça de lista da CDU, que qualquer análise ou perspectiva de resultado das eleições conduziria à conclusão de que a direita vai sofrer uma derrota eleitoral ficando em minoria na Assembleia da República.

Factores e acontecimentos posteriores, na formação das listas do PSD, dos convidados e desconvidados, dos amuados com os lugares atribuídos, o sacudir da água do capote por Cavaco Silva que nem a foto deixa usar ao lado dos previsíveis derrotados, são afloramentos e prenúncios de uma derrota inevitável em 20 de Fevereiro.

Recorrendo a La Palisse, numa disputa se alguém perde, alguém ganha, posicionando-se o PS para recolher o maior número de deputados sem que tenha de fazer grande esforço, ou sequer apresentar grande obra ou sequer arquitectura. Entendendo a conquista do poder como um fim em si mesmo, pouco mais vai adiantando que o seu objectivo hegemónico de alcançar uma tranquilizante maioria absoluta como seguro de vida governativa, um pouco do género: “dêem cá o voto, que nós depois dizemos como vamos governar e que políticas vamos realizar!”.

O PS sabe que oferecer ao povo português um pouco do mesmo que fez, quando estava no Governo, é curto e é mau!

(…)

A propósito das listas, soubemos hoje pelos organizadores duma pequena reunião pomposamente titulada de “Encontro Nacional dos Renovadores” que 8 dos membros da “coisa” iam direitinhos para as listas do Bloco de Esquerda.

Afinal o BE, que se afirma de partido novo e da novidade parece transformar-se mais numa espécie de “Depósito Geral de Adidos”, um ancoradouro de passageiros em trânsito para outros destinos, com velhas desilusões, desistências e desencantos, zangados com a vida. Que façam bom proveito!

(...)

Neste quadro, o anúncio de revisão em baixa da previsão do crescimento económico para 2005, tornado público esta semana pelo Banco de Portugal, vem confirmar aquilo que o PCP sempre afirmou no debate do Orçamento, isto é que as metas previstas pelo Governo, quer em relação ao aumento do PIB, do emprego e da inflação eram irrealistas visando apenas objectivos políticos e de negociação salarial. Bem avisámos a tempo.

Sobre a questão orçamental e da exigência do Pacto de Estabilidade para que este seja inferior a 3% do PIB, o PCP reafirma que esta imposição não corresponde à realidade económica e social de Portugal.

A sustentabilidade das finanças públicas, que o PCP considera de grande importância, deve significar a sua sustentabilidade a médio e longo prazos e não a períodos curtos de 1 ano: a sustentabilidade da dívida pública e a articulação da gestão orçamental com as necessidades de crescimento económico e de desenvolvimento social de que o país tanto necessita.

O que volta a estar em cima da mesa, proposto pela direita e pelo PS, é que o equilíbrio orçamental ano após ano seja conseguido à custa ou da diminuição da prestação das funções sociais do Estado: educação, saúde e apoio social – ou do aumento da carga fiscal dos trabalhadores através da manutenção do peso do IRS sobre os rendimentos do trabalho e do agravamento dos impostos sobre o consumo, que atingem especialmente os trabalhadores.

Em qualquer uma das opções a consequência será o aumento dos encargos dos trabalhadores e por essa via o agravamento do custo de vida das famílias portuguesas.

Opções que o PCP rejeita e denuncia.

A revisão em baixa já esperada e que vai ter repercussões automáticas no aumento do défice pela via da diminuição das receitas, confirma também aquilo que o PCP tem vindo a afirmar contrariamente às ideias neoliberais dominantes:

O problema do país é sobretudo do aparelho produtivo e não orçamental;

A questão orçamental é mais uma questão de receitas (evasão fiscal, escândalo das taxas de IRC que a Banca e os grandes grupos económicos pagam efectivamente, aumento do PIB...) do que de despesas;

As despesas de investimento não devem contar para o défice;

O Pacto de Estabilidade deve ser revisto tendo em conta esta questão da despesa de investimento, pois a economia portuguesa, bem como a maioria dos países europeus, precisa de despesas orçamentais que possam ultrapassar os 3% nos próximos anos, como forma de estimular a produção, o emprego, o desenvolvimento e para travar as consequências da sobrevalorização do euro em relação ao dólar, fazendo-se naturalmente um esforço de contenção sustentado e continuado para a sua redução;

Portugal não pode continuar com uma economia cada vez mais subcontratada, dependente e apendicular com a alienação dos seus principais centros de decisão, e com a crescente substituição da produção nacional pela estrangeira.

E esta é que é a questão central a que é necessário dar resposta.

Como é possível o aumento da produtividade e da competitividade, se assistimos à destruição e desvalorização do nosso aparelho produtivo e da produção nacional, ao aumento do desemprego, se, para além de meio milhão de trabalhadores nesta situação, novas ameaças decorrem para milhares de trabalhadores têxteis?

Haverá sustentabilidade da segurança social se se concretizar a linha privatizadora que está no cerne da nova lei de Bases de Segurança Social?

Ou antes é necessária a reformulação do Sistema de Financiamento da Segurança Social de forma a deixar de pesar exclusivamente sobre os salários e a passar a incidir também, de forma integrada e ponderada, sobre o valor acrescentado gerado nas empresas, reduzindo a carga sobre as empresas que geram mais emprego e uma contribuição mais adequada das empresas de capital intensivo para o financiamento solidário do sistema?

De forma singela questione-se os acrisolado defensores do bloco central de interesses! Se a riqueza criada não é de elástico haverá “pacto” que resista à evidência da necessidade de criar mais riqueza e outra repartição do rendimento, o que implica medidas corajosas para tocar nos intocáveis?

Como explicam os responsáveis pelas políticas dos últimos 28 anos que se cave cada vez mais o fosso entre os 20% das famílias mais ricas e os 20% das famílias mais pobres? Que 100 famílias acumulem fortunas de 20 mil milhões de euros e milhões de portugueses conheçam as dramáticas consequências da pobreza, do desemprego, da exclusão social?

Não basta tirar um coelho da cartola e propor o já tantas vezes proposto “pacto”, dizer, como volta a dizer o PS, que agora é preciso austeridade para depois lá para o fim da legislatura haja défice controlado, emprego aumentado e o bem estar geral.

Cuidado! Já tivemos recentemente a teoria da “tanga”. Não venha agora, mesmo sob a capa da modernidade a teoria da “tanga 2”.

Mas, como se não bastasse esta declaração, o Sr. Presidente da República resolveu fazer mais um acrescento lamentável.
De forma pouco apropriada veio o Sr. Presidente da República afirmar na praça pública que é absolutamente a favor da necessidade de maiorias, subentendendo-se que absolutas.
À beira de eleições, em que é manifesto que há um partido que apela à obtenção duma maioria absoluta, é o que se chama “fazer o jeito”.

Em segundo lugar, sublinhe-se o desejo que é atribuído ao Presidente da República de chegar à possibilidade de fazer maiorias com mais facilidade, mas mantendo a proporcionalidade revela uma contradição insanável, uma impossibilidade prática, pois esse objectivo conduziria sim a um ainda maior enfraquecimento e distorção da proporcionalidade, ou seja, a operações de engenharia eleitoral destinadas a produzir resultados cada vez mais distanciados da real vontade manifestada pelos eleitores nas urnas.

Em terceiro lugar, e por último, dada a frequência com que titulares de cargos públicos estão enunciando publicamente opiniões que, em última análise, representam formas explícitas de influenciar a disputa eleitoral, fazemos um apelo sincero: observem uma conduta discreta e isenta, e confiem na capacidade de decisão, essa sim, soberana, das cidadãs e cidadãos eleitores. No caso do Presidente da República que mantenha a postura de Presidente de todos os portugueses.

(…)