Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP (Extracto)
na apresentação do cabeça de lista da CDU pelo círculo eleitoral de Coimbra
Coimbral, 28 de Dezembro de 2004


No momento em que se vai entrar na campanha e se apresentam candidatos, vai prevalecer o mediático, vai subestimar-se o facto de que estas eleições vão eleger, não um Primeiro-Ministro e não um Governo, mas 230 deputados.

Vai ser rasurada a memória histórica recente sobre o que cada deputado, para além da sua dimensão nacional, fez em relação ao seu distrito de origem, como se identificou com os problemas, os anseios, as lutas travadas naquela empresa que despediu ou se deslocalizou, como deu (ou não) voz às reivindicações dos trabalhadores da Administração Pública, dos estudantes e suas famílias penalizadas pelo aumento das propinas, dos professores não colocados, como se assumiu perante o pacote laboral, a privatização e degradação dos serviços públicos e funções sociais do Estado, perante o justo anseio das mulheres a um estatuto de igualdade e de revogação da penalização legal do aborto, face à inquietação e desespero dos agricultores, micro-pequenos e médios empresários, perante a ruína e a falência das suas explorações agrícolas e empresas, como corresponderam às preocupações de tantos portugueses e portuguesas preocupados com o aumento da pobreza, o atraso da nossa economia e as ameaças à própria soberania nacional.

Ou seja, ficará por fazer a prestação de contas!

Nós deputados do PCP fazêmo-la!

Honrámos o compromisso com todos aqueles que nos confiaram o seu voto. E não perguntámos a ninguém em quem tinha votado, para defendermos interesses e causas justas, para intervirmos na Assembleia da República sobre os problemas desta ou daquela região, mesmo não tendo lá nenhum eleito, para franquear a nossa porta às delegações que não obtiveram resposta doutros grupos parlamentares que antes tinham arrecadado os seus votos.

Essa é uma das razões pela qual nos sentimos confiantes para apelar a mais votos e à eleição de mais deputados da CDU.

E a segunda razão reside no facto de termos contribuído com a nossa intervenção, com a nossa luta política para o isolamento, descrédito e derrota da direita. Muitas vezes sozinhos no plano político e partidário, mas acompanhados pelos trabalhadores, pela juventude estudantil, pelos reformados, pelos utentes dos serviços públicos, pela maioria do povo português.

É que, ao contrário do PS – e diga-se também do Bloco de Esquerda – que deixaram de acreditar ser possível suster e derrotar este Governo e a sua política desastrosa antes de 2006 e que, por cálculos eleitorais, achavam que a direita “ia-se queimando em lume brando”, atraídos pela perigosa ideia do quanto pior melhor daqui a 2 anos, o PCP insistiu no objectivo de que, quanto mais depressa este Governo se fosse embora, melhor seria para o povo e para o país.

Tratemos agora de confirmar e acentuar essa derrota no dia 20 de Fevereiro.

Mas a questão crucial já não está em saber quem ganha ou quem perde. Está em saber se é ou não possível a mudança política, um outro rumo na vida política nacional e se, na base da eleição de 230 deputados, é possível construir uma verdadeira alternativa de política e de governo.

Perante a ambição hegemónica do PS, perante a sacralização que faz da estabilidade governativa, não tardará a falar do “voto útil”.

Uma coisa útil é para ter utilidade. E utilidade em que sentido? Um cidadão ou cidadã votante pode limitar-se a dar o seu voto e pensar “tomem lá, façam dele o que quiserem”? Ou o voto de um trabalhador desempregado não comporta também a esperança do resolver a sua situação e a de meio milhão de desempregados? Ou o voto de um jovem estudante não comporta a reclamação do fim das propinas e a possibilidade de saídas profissionais? Ou o voto de um trabalhador que fez greve, que tanto lutou contra o pacote laboral não exige a revogação das normas mais gravosas do Código do Trabalho e da linha privatizadora da segurança social? Ou o voto de um trabalhador da Administração Pública não encerra a reivindicação do respeito pelos seus direitos, dos seus salários, da sua dignidade? Ou o voto de um agricultor não comporta um anseio duma outra política agrícola? Dum empresário que reclama outra política fiscal, dum professor que se bateu e bate pelo escola pública e democrática, de um cidadão que quer um serviço nacional de saúde e sustidas as privatizações de hospitais e centros de saúde, de um democrata e patriota que defende a soberania nacional?

Nós defendemos o voto com utilidade!

Por isso, torna-se incontornável que cada força política, particularmente aqueles que se perfilam para formar Governo, clarifiquem o que querem fazer, que política querem realizar, que problemas querem resolver, que malfeitorias querem corrigir. A frase mais ou menos redonda, modernizada na sua adjectivação, pode ser atraente mas não é isso que os portugueses esperam.

Com o património da acção que desenvolvemos e das propostas que apresentamos, estamos confiantes em que é possível à CDU aumentar os seus votos e os seus deputados.

As eleições de 20 de Fevereiro são uma batalha nossa, do Partido, do Partido Ecologista Os Verdes, da Intervenção Democrática, dos candidatos, mas o que vai ser decisivo não será tal ou tal dirigente ou candidato messiânico, mas antes este grande colectivo democrático, todos os homens, mulheres e jovens que estão com a CDU, que com a sua generosidade, militância e empenhamento são capazes de lutar por uma vida melhor , por uma sociedade mais justa, retomando também nesta batalha a esperança e confiança no nosso devir colectivo.