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Projecto de Lei n.º 146/VIII
Altera o Regime Jurídico do Contrato de Trabalho a Termo, combatendo a precariedade no emprego

(Exposição de motivos)

Um dos traços mais graves que marca actualmente a estrutura de emprego tem a ver com a extrema precariedade dos empregos existentes e criados. Cada vez mais os trabalhadores são sujeitos de uma política laboral assente na chamada flexibilidade, de que a contratação a termo, a prestação de serviços, o trabalho à comissão, etc. são algumas das formas que a concretizam.

Hoje, múltiplas empresas e, em particular empresas de trabalho temporário, contratam a prazo, certo ou incerto, à tarefa, assente em períodos cada vez mais curtos, havendo já exemplos de contratação ao dia, renovável diariamente.

Todo este mundo de relações laborais é construído a partir de um discurso oficial que funciona como um instrumento de pressão e de chantagem sobre os trabalhadores: se querem emprego então têm de aceitar a flexibilidade, têm de assumir que acabou o tempo do emprego permanente, têm de se submeter a um sistema de relações laborais instáveis, com garantias e direitos limitados. O que não se pode tocar são os interesses sacrossantos do capital e da suas taxas de rentabilidade e de lucro.

Isto é, o desenvolvimento da economia e do mundo contemporâneo, onde a produção de riqueza não pode dispensar quem a produz, os trabalhadores, é feita à custa do factor trabalho.

Não é nada que o PCP não tivesse previsto, designadamente quando, em Portugal, através do Decreto-Lei n.º 781/76 de 28 de Outubro, foi autonomizado e ampliadas as condições em que se poderiam celebrar contratos de trabalho a prazo. Contra o discurso do Governo do Partido Socialista de que o novo regime iria criar condições de emprego mais favoráveis o PCP previu que o que se iria dar era, sim, um gigantesco incremento do trabalho a termo com a fragilização dos direitos e das garantias que são devidas aos trabalhadores. A vida, infelizmente, confirmou plenamente as previsões do PCP. Não só as empresas passaram a aplicar como regra o que deveria ser excepção, como aquele diploma legal foi, entretanto, a porta aberta para que, posteriormente, novas alterações legislativas viessem ampliar as condições do regime da contratação não permanente. É o caso do Decreto-Lei n.º64-A/89, de 27 de Fevereiro, que o presente Projecto de Lei se propõe agora alterar.

Nos últimos anos, a regra tem sido precisamente a subida, em flecha, dos regimes de contratação a termo. Só entre o 4.º trimestre de 1995 e o 2.º trimestre de 1999 (últimos dados do INE publicados) o número de contratos de trabalho celebrados a termo subiu de 335,4 milhares para 460,5 milhares. Dito de outra maneira, a percentagem dos trabalhadores com contrato a termo passou de 11% do total do emprego por conta de outrém no final de 1995 para 14% no segundo trimestre de 1999. Entretanto, em relação a esta última data, há que juntar mais 52,2 milhares de empregos em regime de prestação de serviços (designadamente nas empresas de trabalho temporário) e mais 139,8 milhares de outros tipos de contrato atípico (à comissão, deslocados de outras empresas, etc.). Existem, hoje, muitas empresas onde a praticamente totalidade dos seus trabalhadores está contratada a prazo.

A instabilidade no emprego, as pressões e chantagens a que os trabalhadores estão muitas vezes sujeitos neste tipo de contrato, a diminuição ou ausência de direitos no universo dos trabalhadores contratados não permanentes, designadamente no exercício de direitos colectivos e de participação é normalmente acompanhada de discriminações nos salários agravando, obviamente, as desigualdades salariais e dos rendimentos.

A actual legislação, que enquadra este processo, permite entretanto regimes de contratação a termo e práticas nas relações laborais sem qualquer justificação ou sentido social. É o caso, por exemplo, da contratação a termo ser definida em função da condição de quem é contratado e não em função da actividade ou do facto que justificariam a celebração desse tipo de contrato. Nada justifica, por exemplo, que o facto de se ser trabalhador jovem à procura de primeiro emprego ou desempregado de longa duração constitua uma das condições que justifica a celebração de contrato a termo. Por outro lado têm-se vindo a ampliar as práticas ilegais de considerar o contrato de trabalho a termo como uma forma normal de contratação bem como as condições de pressão que são exercidas sobre os trabalhadores para que quando celebram um contrato de trabalho a termo assinem logo um outro, sem data, de rescisão do contrato de trabalho ou os casos em que, por razões não justificáveis, são celebrados sucessivos contratos de trabalho a termo com o mesmo trabalhador ou para a mesma actividade ou função ultrapassando, por esta via, os prazos máximos previstos na própria lei.

É, por isso, preciso terminar ou, no mínimo, atenuar este estado de coisas, sem prejudicar a criação de emprego com direitos.

Nesse sentido o Projecto de Lei que o PCP agora apresenta propõe como principais alterações à actual legislação:

· A consagração de que o contrato de trabalho a termo constitui uma forma excepcional de contratação e de que a sua celebração está subordinada ao principio de que a uma função permanente deve corresponder um contrato de trabalho sem termo;
· A eliminação da alínea h) do n.º 1 do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro que prevê, como fundamento para a celebração de contrato de trabalho a termo, o facto do trabalhador ser jovem à procura de primeiro emprego ou desempregado de longa duração;
· A determinação de que a celebração sucessiva e intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, com similitude de funções e para satisfação das mesmas necessidades do empregador, implica a conversão automática do segundo em contrato sem termo, sem prejuízo de situações específicas como a de certas actividades sazonais;
· A certificação por duas testemunhas dos acordos de rescisão do contrato de trabalho a termo;
· A obrigatoriedade do contrato a termo conter expressa e claramente uma identificação temporal entre a justificação invocada para a celebração e o termo estipulado;
· O dever de comunicação às organizações representantes dos trabalhadores na empresa dos casos de celebração, prorrogação ou cessação de um contrato a termo.

Assim, nos termos Regimentais e Constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º
Âmbito

A presente lei altera o regime jurídico da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo aprovado pelo Decreto - Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro .

Artigo 2º
Alterações

São aditados os artigos 40º-A, 42º-A, 42º-B e 42º-C e modificados os artigos 41º, 42º e 60º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro com as alterações da Lei 118/99, de 11 de Agosto, que passam a ter a seguinte redacção:

Capítulo VII
Contratos a termo

Secção I
Regras Gerais

Artigo 40º-A
Principio geral

1. Sem prejuízo dos artigos seguintes, o contrato individual de trabalho considera-se celebrado sem termo, adquirindo o trabalhador o direito à qualidade de trabalhador permanente e ao inerente ingresso nos quadros da empresa, de acordo com a legislação em vigor.

2. O contrato de trabalho a termo constitui uma forma excepcional de contratação e a sua celebração está subordinada à observação do principio de que a uma função permanente deve corresponder um contrato de trabalho sem termo.

Artigo 41º
Admissibilidade do contrato a termo

1. Sem prejuízo do disposto no artigo 5º, a celebração de contrato de trabalho a termo só é admissível para fazer face a necessidades temporárias, transitórias e objectivas do empregador e exclusivamente nos casos seguintes:

a) (...)
b) (...)
c) (...)
d) (...)
e) Lançamento de uma nova actividade de duração incerta;
f) (...)
g) Eliminada.

2. (...)

3. Em caso algum a condição de trabalhador à procura do primeiro emprego ou de desempregado de longa duração é, só por si, fundamento para a celebração de contrato a termo.

4. Compete à entidade empregadora a prova dos factos e circunstâncias que fundamentam a celebração de um contrato a termo, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 3º da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto.

5. A celebração, prorrogação e cessação do contrato a termo implica a comunicação do seu teor pela entidade patronal, no prazo máximo de cinco dias úteis, à Comissão de Trabalhadores e à estrutura Sindical existente na empresa.

6. Os casos previstos nas alíneas a) a f) do n.º 1 poderão ser restringidos por convenção colectiva de trabalho.

Artigo 42º
Forma

1. (...)

a) (...)
b) (...)
c) (...)
d) (...)
e) (...)
f) (...)


2. (...)

3. (...)

4. O contrato de trabalho deve conter expressa e claramente uma identificação temporal entre a justificação invocada para a celebração e o termo estipulado.

5. O contrato de trabalho a termo deve indicar a necessidade de cumprimento do disposto no n.º 5 do artigo anterior .

Artigo 42º-A
Contratos sucessivos

1. A celebração sucessiva e intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, com similitude de funções e para satisfação das mesmas necessidades do empregador, implica a conversão automática do segundo em contrato sem termo.

2. Exceptua-se do número anterior a contratação a termo certo ou incerto com fundamento na alínea c) do n.º 1 do artigo 41º e alínea c) do n.º 1 do artigo 48º.

3. É anulável o contrato de trabalho a termo celebrado posteriormente à aquisição pelo trabalhador da qualidade de trabalhador permante.

Artigo 42º-B
Cessação por mútuo acordo

1. Do acordo de cessação de contrato de trabalho a termo deverá constar a certificação por duas testemunhas de que o mesmo foi subscrito pelas partes, na data e na sua presença.

2. Sem prejuízo do direito de revogação previsto no n.º1 do artigo 1º da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto , o incumprimento da formalidade prevista no número anterior determina a nulidade do acordo, a qual apenas poderá ser invocada pelo trabalhador.

Artigo 42º-C
Rescisão pelo trabalhador

1. O documento de rescisão do contrato de trabalho deve conter expressamente a data de assinatura aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no número um do artigo anterior.

2. Sem prejuízo do direito de revogação previsto no n.º 1 do artigo 2º da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, o incumprimento da formalidade do número anterior, determina a anulabilidade da rescisão, a qual apenas poderá ser invocada pelo trabalhador .

Artigo 60º
Contra-Ordenação

1. - Constitui contra-ordenação grave:

a) (...)
b) (...)
c) (...)
d) (...)
e) (...)
f) O incumprimento da obrigação prevista no nº 5 do artigo 41º.

2. (...)
3. Constitui contra-ordenação leve a violação dos n/s 1 e 2 do artigo 8º, do nº3 do artigo 17º, dos n/s 2, 3 e 4 do artigo 20º, dos n/s 1 e 2 do artigo 22º, incluindo quando são aplicáveis em caso de despedimento por extinção do posto de trabalho ou inadaptação do trabalhador, do nº2 do artigo 30º, do n.º 5 do artigo 42º, bem como o impedimento à participação dos serviços competentes do Ministério do Trabalho e da Solidariedade no processo de negociação, referido no n.º 1 do artigo 19º e do artigo 57º do Decreto-Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro. "

Artigo 3º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no trigésimo dia após a publicação.

Assembleia da República, em 22 de Março de 2000