Artigo de Ilda Figueiredo no «Semanário»

«Alternativas possíveis»

Na área económica, dois acontecimentos internacionais da maior importância tiveram lugar durante os últimos dias: os resultados da Cimeira da OMC, em Cancun, e a recusa do povo sueco no referendo sobre a adesão ao euro.

Naturalmente que estes acontecimentos se deram no momento em que vivemos uma situação política e económica mundial muito difícil, quer no plano global, quer a nível europeu, o que preocupa cada vez mais os trabalhadores e os mais diversos povos de numerosos países.

Os problemas criados pela guerra e ocupação americano-britânica no Iraque e pela agressão israelita no Médio Oriente, a recessão económica em diversos países, incluindo na União Europeia, a tentativa das multinacionais procurarem maior penetração nos diversos países, sem terem em conta as suas dificuldades e os problemas da desigualdade da produção e do comércio internacional, uniram povos e países muito díspares na recusa a pretensões inaceitáveis em áreas como o comércio agrícola, investimentos e contratos nas áreas dos serviços públicos.

Por exemplo, sabe-se bem como as políticas neoliberais agrícolas e comerciais contribuíram para a destruição das economias rurais e para o agravamento da crise nas sociedades de muitos países, onde os pequenos agricultores ficaram sem as suas terras e se tornaram cada vez mais pobres, para além de se ter posto em causa o direito a produzir os alimentos necessários, a sua soberania alimentar. Registe-se que apenas seis multinacionais realizam cerca de 85% do comércio mundial de cereais, oito partilham cerca de 60% das vendas mundiais do café, sete controlam 90% do comércio de chá nos países ocidentais e três repartem o comércio das bananas.

Assim, no que se passou em Cancun importa reter três pontos fundamentais:

- as fortes mobilizações populares, agora, em Cancun, e um pouco por todo o mundo, mas sobretudo durante os fóruns sociais, contra uma globalização capitalista, injusta, que explora os países menos desenvolvidos e beneficia os mais poderosos, sobretudo os grupos económicos e multinacionais que controlam o comércio mundial, o que contribuiu para aquilo que vários consideram o falhanço das negociações de Cancun;

- a inadmissível posição comum da União Europeia e dos EUA que contribuíram para que esta conferência não permitisse encontrar soluções que fizessem justiça aos países em vias de desenvolvimento, que ignoram a necessidade do perdão da dívida aos países menos desenvolvidos, que esqueceram os problemas dos trabalhadores e das micro, pequenas e médias empresas da própria Europa, como no caso dos sectores da têxtil, vestuário e da agricultura;

- a necessidade de democratizar o funcionamento das instituições internacionais, de remeter para a égide da ONU o próprio comércio internacional, e de estabelecer novas regras, justas e democráticas, que dêem esperança aos povos e permitam um efectivo desenvolvimento sustentável.

Quanto ao referendo sobre o euro, mesmo que num momento de grande emoção causado pelo ignóbil assassínio de uma ministra que apoiava o sim, os seus resultados foram uma derrota clara da elite no poder na Suécia, e demonstram que o seu povo não aceita a política económica e monetária que tem como base decisões de um Banco Central Europeu que foge ao controlo dos governos e dos parlamentos dos Estados-membros, que faz dos critérios absurdos do Pacto de Estabilidade a sua bíblia, esquecendo os direitos económicos e sociais de uma Europa que devia ter como objectivo a coesão económica e social, o desenvolvimento e o bem estar social.

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