Intervenção do deputado
Joaquim Matias

Debate de urgência sobre
a eventual construção de um novo aeroporto

6 de Janeiro de 2000


Senhor Presidente,
Senhor Ministro,
Senhores membros do Governo,

O novo aeroporto de Lisboa, de acordo com o Plano de Desenvolvimento Regional, enquadra-se na orientação estratégica de desenvolvimento do País, valorizando o território com uma nova centralidade.

O objectivo seria, assim, a criação de uma rede estruturada e coerente de plataformas logísticas complementares ao transporte marítimo e aéreo, valorizando as complementaridades multi-modais, num sistema integrado de transportes, capaz de proporcionar às companhias aéreas a atractividade necessária aos objectivos propostos.

Ou seja, o desenvolvimento de um “hub“ no tráfego inter-continental de passageiros e mercadorias, onde o aeroporto seria o núcleo das ligações rápidas de Lisboa e da sua área metropolitana, mas também do País e da frente europeia atlântica, com o resto do mundo.

O novo aeroporto, não seria pois, uma simples substituição da Portela. Tratar-se-ia antes de um projecto estruturante para o desenvolvimento económico do País e, como tal, a ser financiado pelo Fundo de Coesão, isto, é claro, segundo o P. D. R.

Ora o mínimo que se exigiria de um tal projecto seria um amplo consenso nacional, mas de facto o que vemos é um assunto nada pacífico, mesmo no interior do PS e até do próprio Governo.
A razão de tal polémica reside na fraca sustentabilidade da decisão a tomar. Sem sustentabilidade em estudos sérios e seguros, não haverá projecto estruturante, mas antes um enorme elefante branco.

Como afirmamos, mais do que uma vez, na Comissão Parlamentar de acompanhamento dos estudos para a localização do novo aeroporto, seria fundamental efectuar os estudos indispensáveis e aprofundá-los quanto necessário, ainda que daí resultasse alguma dilação do prazo previsto para a decisão. Os estudos efectivamente arrastaram-se, mas por incumprimento de prazos contratuais e não por indispensáveis aprofundamentos, que não se fizeram.

A começar pelo estudo preliminar de impacte ambiental em que a Comissão de Avaliação concluía
“Existem descritores que tiveram uma abordagem deficiente e que deveriam ter sido objecto de estudos mais adequados à fase de selecção de alternativas, pelo que a Comissão de Avaliação considera que as conclusões constantes nos EPIA não são suficientes ou válidas como elementos de base para a tomada de decisão...”.
e recomendava quais os estudos a aprofundar.

Um mês depois, no entanto, sem os estudos recomendados efectuados e apenas com pareceres de algumas entidades, pareceres que não foram tornados públicos, afirmava que:
“foi possível chegar a conclusões a ter em conta na tomada de decisão”.
e assim considerar:
“Que as duas alternativas de localização propostas apresentam impactes negativos significativos. No entanto, a localização na OTA é menos desfavorável que em Rio Frio por esta apresentar graves condicionantes que podem pôr em causa a sua sustentabilidade ambiental”, sublinho podem pôr!

Pergunta-se: Para que serviram os estudos preliminares de impacte ambiental?

Não foram conclusivos, mas pareceres de entidades oficiais, independentes dos estudos, permitiram fazer uma conjectura e esta serviu para decisão.

Já com os EPIA concluídos foi a Comissão de Acompanhamento informada que após despacho da Ministra, juntar-se-ia um estudo de corredores aéreos e seguiria o processo para os consultores darem o parecer final.

Onde estão este estudo e o parecer que nunca foram tornados públicos?

Senhor Presidente,
Senhor Ministro,
Senhores Deputados,

Como pode deixar de ser polémico um investimento de largas centenas de milhões de contos se não se conhece nem está avaliado minimamente o seu montante?

Fala-se da construção do novo Aeroporto, mas há estudos aprofundados que exijam a sua construção? E as acessibilidades rodo e ferroviárias? E o ordenamento do território circundante? Quando foram avaliados os seus custos?

Como pode deixar de ser polémico um investimento que se diz querer ser estruturante, sem um plano de ordenamento do território e sem um plano estratégico? Necessidade que aliás sempre reclamamos. Será que as plataformas logísticas não têm localização fixa?

E como é que estas se projectam no território nacional por forma a promover o desenvolvimento das suas diferentes parcelas? Ou será, como já vem sendo tradição, a construção do Aeroporto mais um factor de litoralização do País e desertificação do interior?

Senhor Presidente,
Senhor Ministro,
Senhores Deputados,

Estamos perante uma decisão que, a ser tomada, é no mínimo precipitada e pouco fundamentada.

Trata-se de um vultuoso investimento e, naturalmente, movimenta muitos interesses que suscitam grupos de pressão.

Mas os recursos financeiros públicos afectos à construção do novo aeroporto são significativos. Terão que ser calculados com rigor e bem fundamentada a sua mobilização para este fim. Esta Câmara e o País exigem-no.

É necessário, por outro lado, garantir que falamos de um investimento estruturante para o País e não estamos perante um elefante branco destinado exclusivamente à substituição megalómana da Portela.