Situação difícil dos trabalhadores da Adtranz Portugal (ex-Sorefame) e da Ford-Azambuja
Intervenção da deputada Fátima Amaral
2 de Dezembro de 1999

 

Senhor Presidente:
Senhores Deputados,

Governos da responsabilidade do PS e anteriormente do PSD já nos habituaram a políticas de canalização de muitos milhões de contos do Estado para investimentos em empresas privadas e mesmo multinacionais e, em simultâneo, atribuírem “benesses” fiscais de larga monta, permitindo a acumulação de lucros fabulosos e de transferências de mais-valias.

Tal situação não se fica por aqui e não raros são os exemplos que após esta apropriação as empresas encerram as suas portas enviando trabalhadores para o desemprego ou para reformas precoces e de baixo valor.

É neste quadro que surgem mais uma vez nuvens negras por cima da cabeça dos trabalhadores da Adtranz Portugal (ex-Sorefame) e da Ford-Azambuja.

Durante cerca de 40 anos, a Ford limitou-se a produzir o máximo de carros e a obter o máximo de lucro, decidindo agora fechar as portas, fazendo um negócio com a Opel, colocando trabalhadores na precaridade e desemprego.

É inaceitável que a empresa apresente um plano social desta gravidade, sem quaisquer tentativas de negociação com os representantes dos cerca de 300 trabalhadores abrangidos.

É também inadmissível que o Governo que esteve por dentro do negócio não tenha tomado, até agora, uma posição firme para garantir que não haja prejuízos para todos os trabalhadores, incluindo naturalmente os das empresas que prestavam serviços à Ford.

Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português solicitou esclarecimentos aos Ministros do Trabalho e da Economia, sobre a eventual intervenção do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho e outras medidas que tencionem tomar para que sejam salvaguardados os legítimos interesses desses trabalhadores.

Estamos certos que os trabalhadores irão lutar pela garantia do emprego efectivo para os que vão ingressar na Opel e de compensações justas pela perda de regalias e do posto de trabalho ou pela passagem à pré-reforma.

O PCP não aceita, e portanto combaterá, em todas as instâncias, que o País seja comandado pelos ditames das multinacionais e de outros grandes grupos económicos.

Um outro conflito gerado pela multinacional Adtranz, merece aqui também a nossa denúncia e indignação.

A ex-Sorefame tem passado por diversas etapas de desmantelamento da sua capacidade produtiva, logo também de destruição de postos de trabalho e dos direitos dos trabalhadores.

A multinacional ABB comprou-a a preço de saldo, depois do Governo ter limpo o seu passivo através do IPE e imediatamente a seguir começou a desviar para outros países a sua tecnologia e produção.

Agora, a administração desta empresa traça mais um plano de reestruturação, projectando os ganhos que vai ter com a possibilidade da sua concretização, parecendo não estar preocupada nem com os direitos mais elementares dos trabalhadores e suas famílias, ou pela microeconomia que se desenvolve na zona envolvente da fábrica da Falagueira-Amadora e nem sequer com os compromissos assumidos aquando do recebimento de fundos estruturais.

É a política do facto consumado. Os trabalhadores que sempre apresentaram propostas na perspectiva do desenvolvimento da empresa e da economia do país, incluindo a procura de mercados internacionais, nem sequer foram informados quanto mais ouvidos sobre a elaboração do plano, pretendendo a Administração pô-lo já em prática.

Então do que consta tal famigerado Projecto de Reestruturação?

Fechar a fábrica na Amadora, para uma aparente fusão na de Sines, acenando com o estafado “slogan” que é preciso tornar a empresa economicamente viável.

Usando uma linguagem popular, nós dizemos: aqui há gato escondido com o rabo de fora!

A administração prepara-se para através de uma operação especulativa imobiliária, vender o terreno, esperando, para isso, conseguir que haja alterações ao PDM.

Estamos perante mais uma hipótese de ser encerrada mais uma unidade fabril em Portugal, que a ser consumada arrastará prejuízos sérios para cerca de 1 500 trabalhadores e respectivas famílias e para a própria economia nacional.

Para o Governo do PS pode não ser relevante este processo de destruição em marcha, dado que foi também pelas suas mãos que a evolução dos transportes durante quatro anos assentou na continuidade das medidas mais gravosas da política de direita, de desregulamentação do sector e de privatização das grandes empresas e sua entrega ao capital privado nacional e transnacional.

Foi assim que avançou o desmembramento da CP, a entrega formal da exploração ferroviária do eixo norte/sul, incluindo a ponte 25 de Abril, ao mesmo grupo privado que já domina o sector rodoviário.

Mas, o país precisa do desenvolvimento de uma política de investimentos nas infra-estruturas, equipamentos e material circulante, de modo a aumentar a qualidade do serviço público.

Mas o país precisa também de emprego com direitos.

As empresas metalomecânicas são pólos de desenvolvimento científico e tecnológico que por si só engendram o crescimento de muitas outras na sua órbita e, por isso, deverão estar integradas nos planos de estratégia nacional como centros de dinamização da economia.

O PCP entende que o Estado, através do Governo não pode lavar as mãos como Pilatos, tanto mais que a empresa recebeu dinheiros públicos. Só através do PEDIP foram cerca de 6 milhões de contos.

O trabalho é uma fonte de riqueza, constituindo, por isso, a hipótese de encerramento de tão importante empresa para o concelho da Amadora um sério problema económico e social tanto mais que nos últimos anos já se perderam aqui mais de 15 000 postos de trabalho.

É ainda preocupante para o pequeno comércio da zona, pois a sua animação depende em muito deste polo de concentração de pessoas.

O Grupo Parlamentar do PCP manifesta a sua total solidariedade com os trabalhadores que laboram na Adtranz na sua luta em defesa dos seus postos de trabalho e do crescimento da actividade económica no nosso país.

Os argumentos da Administração da Adtranz, não são sustentáveis e mostram um grande desprezo pelos trabalhadores e pela economia nacional.

É preciso valorizar e dignificar o trabalho!

É preciso que os interesses do país não sejam lesados!

O PCP tudo fará para que este pressupostos sejam atingidos.

Nesta denúncia que é, ao mesmo tempo, uma reclamação para que o crescimento económico seja articulado com a justiça social e laboral, queremos referir, por último, o drama que cerca de 800 trabalhadores da Mundet vivem há mais de uma década.

Primeiro e durante cerca de 5 anos foram os salários em atraso, depois em Julho de 93, com a declaração de falência foram os despedimentos, sem que até hoje os trabalhadores tenham recebido nem um tostão.

Como se não bastasse todos os maus tratos a que foram sujeitos enquanto trabalhadores da Mundet, continuam depois e até agora a ser vítimas da inoperância e lentidão da justiça portuguesa.

Com processos judiciais a desenrolarem-se desde 92, com vendas de património já efectuadas e Administrador Judicial nomeado mas sem que, até à data nenhum trabalhador tenha recebido qualquer valor em dívida. No mínimo é preciso acelerar a acção judicial.

Neste conjunto de trabalhadores há gente de idade avançada que não encontrou alternativa de emprego, encontrando-se já muitos no limiar da pobreza.

Estes exemplos que aqui deixamos, como tantos outros, servem para confirmar que a sociedade portuguesa sofre de várias enfermidades, a que a tal globalização de economia com rosto humano não dá resposta.

Disse.