Intervenção do
deputado Bernardino Soares

Lei de Bases da Saúde

17 de Maio de 1999


Senhor Presidente,
Senhores Deputados:

O projecto do CDS-PP encerra uma lógica viciada. Parte de certos pressupostos que são errados. Propositadamente. Tudo isto porque a conclusão a atingir estava pré-determinada; era preciso concluir pela falência do sistema público de prestação de cuidados de saúde. Era preciso concluir pela necessidade imperiosa da privatização do sector e pela inevitável redução da garantia pelo Estado do direito à saúde dos cidadãos.

Não é mais do que o neo-liberalismo a tentar impôr as suas regras, mesmo num sector de grande interesse e sensibilidade social como é o da saúde.

É por isso que o CDS-PP diz que há uma discrepância entre os recursos disponíveis e as expectativas da população.

A verdade é que ao fim de todos estes anos do SNS, nunca ele foi devidamente financiado, o que quer dizer que afinal os recursos que seriam necessários não foram pura e simplesmente aplicados na área da saúde.

Outra das constatações dos proponentes tem a ver com o aumento de expectativas e das exigências do cidadão, nomeadamente em relação às novas tecnologias que vão surgindo.

Como se não fosse legítimo e desejável que se pusessem ao serviço do povo todas as melhores técnicas que diariamente vão surgindo.

Finalmente, o projecto assenta no princípio, amplamente afirmado pela ideologia neoliberal, que as estruturas públicas são necessariamente pesadas, ineficientes e burocratizadas.

Como se a ineficiência fosse uma característica genética das instituições públicas e como se tal situação não fosse da responsabilidade dos que governam e governaram a área da saúde permitindo e incentivando este estado de coisas.

Vem portanto este projecto continuar o caminho do desmantelamento do SNS na senda do que já a actual Lei de Bases fazia. O objectivo é, portanto, claro. É preciso atacar o SNS para abrir caminho à actividade lucrativa.

A verdade é que a nossa Constituição continua a atribuir um papel fundamental ao Serviço Nacional de Saúde. A verdade é que na última revisão constitucional foi derrotada a concepção que o CDS-PP agora retoma neste projecto.

O que o PP propõe é a existência de um SNS de carácter diminuído e residual no quadro de um Sistema Nacional de Saúde com grande intervenção do sector privado. Mas não é isso que a Constituição prevê e permite.

O Projecto do PP põe em causa a universalidade do Serviço Nacional de Saúde ao prever a possibilidade de muitos cidadãos não estarem abrangidos pelo SNS. Põe em causa até a tendencial gratuitidade substituindo-a pela equidade na redistribuição dos meios.

Curiosa é também a proposta do PP no que diz respeito ao exercício público e privado. Estando o SNS numa situação de grande promiscuidade entre prestações públicas e privadas, que esgotam indevidamente muitos dos recursos do SNS, o PP propõe que haja livre mobilidade entre o sector público e privado dentro do tal Sistema.

Mas a grande dúvida deste debate é saber até onde concordam o Governo e o PS com muitas das soluções propostas pelo PP. Porque o Governo do PS continua a deixar degradar o funcionamento do SNS, abrindo campo aos que defendem a sua falência; continua a permitir os mais diversos esquemas de promiscuidade; dá cada vez mais sinais de admitir maiores desresponsabilizações do Estado no financiamento do SNS.

O PS chumbou há poucos dias um importante projecto do PCP com muitas soluções essenciais para o melhor funcionamento dos serviços de saúde. Ao fazé-lo mostrou mais uma vez que não está interessado numa verdadeira melhoria em profundidade do SNS, nem no combate sem tréguas aos parasitas do sistema.

Ficou claro de que lado está o Partido Socialista. Não está de corpo e alma com a defesa do SNS e logo não está do nosso lado.