Declaração política sobre o Congresso do Alentejo
Intervenção de Rodeia Machado
4 de Março de 2004

 

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados

Realizou-se recentemente, em Montemor-o-Novo, mais um Congresso do Alentejo, e onde se debateram mais uma vez, as potencialidades de uma importante zona do País, ou seja, a região do Alentejo, que como é sabido ocupa cerca de 1/3 do território nacional.

Ao longo de dois dias de debate, analisaram-se os velhos e novos problemas, as dificuldades, mas acima de tudo as potencialidades e apontaram-se as saídas que são necessárias, ao nível do investimento público, para que a região possa ser factor de atracção também do investimento privado e consequentemente dinamizar a criação de emprego, com a revitalização do tecido económico e poder inverter o envelhecimento da população. Uma questão decisiva para o desenvolvimento do Alentejo é a sua unidade geográfica que pode e deve potenciar uma maior harmonia para o desenvolvimento e essa manutenção da unidade do Alentejo deve ser garantida.

O Alentejo tem potencialidades, que podem e devem ser aproveitadas.

Com efeito, são conhecidas as dificuldades do Alentejo, com uma densidade populacional bastante baixa e população envelhecida, mas não é menos verdade que as suas potencialidades são enormes, quer a nível dos três grandes projectos mais conhecidos, Alqueva, Base Aérea de Beja e Porto de Sines, mas de outros que igualmente podem e devem contribuir para o desenvolvimento regional e nacional, como são os casos da exploração de mármores e da faixa piritosa do Alentejo, mais conhecida pelos jazigos de Neves Corvo e Aljustrel e a vertente turística que pode e deve ser também um factor de desenvolvimento sustentável deste território, mas igualmente importantes são a agro-pecuária, a vitivinicultura e o azeite a par dos produtos regionais de qualidade o queijo, os enchidos, e de novas produções que estão a surgir no litoral Alentejano horticultura, fruticultura e floricultura que como produtores, de qualidade, têm um nicho de mercado emergente, ao nível da Europa.

Mas é igualmente verdade que existe população jovem e qualificada, que está a sair das escolas superiores existentes no Alentejo, quer nos Institutos Politécnicos quer na Universidade de Évora e jovens que anseiam ficar na região e não ter que partir para o litoral, ou para as zonas industriais de Portugal ou estrangeiro, isto é, imigrar ou emigrar à procura de trabalho, que na sua terra não encontram.

É urgente inverter esta tendência.

É urgente pôr cobro a esta situação.

Mas isso só se consegue, se o investimento público que há muito é reclamado e igualmente prometido por sucessivos Governos, tiver uma aplicação prática, ou seja, passar da palavra aos actos, ou dito ainda de outra forma, é preciso existir vontade política do poder central para que o desenvolvimento do Alentejo seja uma realidade.

Vamos aos factos.

É certo que a barragem de Alqueva avançou e o Partido Comunista Português, que foi durante muito tempo o único partido a defender a sua construção, congratulou-se em devido tempo por tal facto e pelo fecho das comportas.

Mas Alqueva, não é, nem pode ser só a barragem. Alqueva é um projecto global, um empreendimento de fins múltiplos, com as suas valias de grande reserva de água, para abastecimento às populações, regadio agrícola de 110.000 há, a produção de energia eléctrica e potenciadora de turismo, e como tal deve ser mantido. Para que tal aconteça é necessário garantir a sua sustentabilidade.

O Partido Comunista Português ciente dessa necessidade, há mais de um ano que requereu a vinda dos senhores Ministros do Ambiente e da Agricultura, à Comissão do Poder Local e reiterou o pedido para a Comissão de Agricultura, sem que numa ou noutra Comissão essa solicitação tenha sido concretizada até hoje, pese embora o compromisso assumido pelo Senhor Ministro Marques Mendes aqui no Plenário.

E, nessas condições, o que queríamos e queremos debater, pois mantém-se actual, é a garantia do Governo quanto à sustentabilidade do projecto, porque sabemos que existem dificuldades que não foram ainda superadas, nomeadamente na rede de rega primária e secundária, e prazos de execução, mas também quanto à produção de energia e a entidade que a vai explorar.

Quanto à Base Aérea de Beja, e a sua abertura para fins civis, conhecemos a validade do projecto, não aceitamos que o mesmo venha a ter mais contratempos dos que até agora tem tido.

Com um baixo investimento, pode-se e deve-se aproveitar uma importante infra-estrutura que é uma mais valia para a região e para o país.

Não faltam operadores interessados, mas os vários atrasos podem ser condicionadores quanto ao futuro, e por isso é imperioso que o Governo do PSD-CDS/PP faça avançar o projecto o mais rapidamente possível.

O outro grande projecto é o Porto de Sines, sabe-se que tem também sofrido entraves vários.

O Terminal XXI, entregue para exploração ao operador de Singapura (P.S.A.) tem visto adiada, a sua entrada em funcionamento e é público que foi equacionada a venda da posição desta entidade.

Afinal quais são os condicionalismos?

O que está a entravar o processo?

Quando a Comissão de Obras Públicas, se deslocou a estes empreendimentos, questionámos os responsáveis, por estas matérias, mas as resposta são evasivas e tudo parece caminhar, mas a realidade é outra, a realidade é que estão atrasados e não existem garantias quanto ao futuro.

E, por isso, requeremos ao Governo que nos desse informação quanto à calendarização de cada um dos projectos e estamos a aguardar respostas concretas.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

A importância, destes projectos, para o Alentejo e para o País, não pode ser contestada, mas eles, por si só, não desenvolvem a região e por isso são necessárias as acessibilidades rodoviárias e ferroviárias, e nessa matéria, mais uma vez se verifica que existem atrasos enormes na sua execução. Só agora o projecto do IP-8, que liga Sines a Beja e de Beja a Ficalho, está na fase de estudos de impacto ambiental, o que significa dizer que só dentro de alguns anos eles serão realidade, quando já hoje o deveriam ser. Mas igualmente o IC 33 ou o IC 27, que deriva para o Algarve a partir do IP 2, não passam de realidades virtuais.

No que toca à ferrovia, essa nem projecto tem no que a Ligação a Beja diz respeito, e está manifestamente atrasada a sua ligação a Espanha, pois só agora o projecto de modernização da ferrovia está a ser desenvolvido.

De uma coisa temos a certeza, a não execução destas obras rodoviárias e ferroviárias, têm condicionado fortemente o aproveitamento de potencialidades que os projectos do Porto de Sines, Alqueva e Base Aérea 11, potenciam, nomeadamente, no trânsito de mercadorias e no que ao turismo directamente reporta.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Outra das empresas que é referência no Alentejo, é a Somincor, a empresa que explora o importante filão de minério de Neves-Corvo.

Esta empresa que até agora era detida pelo Estado Português, através da Empresa de Desenvolvimento Mineiro, com a maioria do capital – 51%, enquanto a Rio Tinto tinha 49%, o Governo do PDS-CDS/PP, decidiu recentemente a sua privatização total.

É um bem precioso que o país perde, pela decisão política de um Governo que não olha a meios para conseguir os seus fins, a baixa do défice.

A Somincor, que é uma empresa bastante equilibrada e que tem presentemente 750 trabalhadores ao seu serviço directo e mais cerca de 300, de empresas contratadas, teve durante o ano de 2003, um lucro líquido de 7 milhões de euros, o que a configura como uma empresa apetecível à privatização.

Em vez disso, apenas uma empresa concorreu a Eurozinc, que é já proprietária das Minas de Aljustrel, e que até hoje as não colocou a produzir, conforme se comprometeu.

A referida empresa Eurozinc, não tem referências no mercado, apenas lhe é conhecida uma mina no UTAH, mas mesmo essa, sem estar em funcionamento.

Outras empresas de referência, nesta área, chegaram a levantar o Caderno de Encargos, mas desistiram do concurso, não se percebendo o porquê destas desistências.

Os trabalhadores estão preocupados, com esta situação, porque como experiência conhecem-se os compromissos nas Minas de Aljustrel que não estão a ser cumpridos, e por outro lado o Estado através do caderno de encargos da privatização permite que possam ser despedidos anualmente até 10% dos trabalhadores, sem que para tal seja necessária autorização do Governo.

Uma vergonha.

Agora que a Mina de Neves-Corvo se preparava para a exploração do zinco, e naturalmente com isso rentabilizar melhor os investimentos e dar mais lucros, é a mesma privatizada, sem que se conheçam quais os planos de exploração. Podem até fazer uma lavra selectiva ou gananciosa, e encurtar o prazo de vida da Mina, que neste momento tem o horizonte em 2030, porque o Estado fica sem o controle directo e não tem capacidade de fiscalização, também porque desarticulou os serviços do Instituto Geológico Mineiro.

A uma situação estável e equilibrada, como é a Somincor, este Governo contrapõe com uma privatização total, a uma empresa desconhecida e sem garantias, que vai criar instabilidade para os trabalhadores e incertezas quanto ao futuro.

Não é desta política que o Alentejo precisa. O que o Alentejo precisa, é de investimento público que contribua para o seu desenvolvimento e que consequentemente sustenha a desertificação.

Com as políticas deste Governo dificilmente o Alentejo, e os Alentejanos terão o desenvolvimento que tão justamente anseiam.