Debate sobre o Estado da Nação
Pergunta de Jerónimo de Sousa na Assembleia da República
12 de Julho de 2006

Senhor Presidente,
Senhor Primeiro-Ministro,


Julgávamos nós que vínhamos ouvir e debater o Estado da Nação! Saber como e onde estamos para saber como e para onde vamos!

A intervenção do senhor Primeiro-Ministro incorre no risco de transformar esta sessão numa auto-elogiosa Conferência de Imprensa da acção governativa!


Embalado e contente com as sondagens que lhe dão uma boa posição, embevecido pelo apoio, estímulo e aplauso dos poderosos e pelas mesuras da corte subserviente de analistas e comentadores e assessores, desfrutando regalado da “ciumeira” do PSD por ver o PS fazer no Governo o que eles não podiam mas gostariam de fazer, confiante de que ainda vai rendendo a tese das “inevitabilidades” e dos “sacrifícios” necessários, visando a neutralização e o conformismo de muitos portugueses, aqui temos um Primeiro-Ministro a subestimar o tempo, a realidade e os problemas do país e dos portugueses.

E poderia constituir um bom ponto de partida agarrar nas notícias do dia, por exemplo: a economia “volta a arrefecer”, a GM/OPEL da Azambuja quer tornar irreversível o encerramento sumário da empresa, um milhão de portugueses sem médico de família, bancos conseguem (no ano dos sacrifício s para todos, diz o Ministro das Finanças sem rir) mil e 600 milhões de euros de lucro!

Um debate sobre o Estado da Nação pressupõe saber onde estamos e para onde vamos!

Não explicou as causas e razões da estagnação da economia, das razões e causas da existência de 570 mil desempregados e de um milhão e trezentos mil trabalhadores com vínculo precário, dos milhares de reformados e idosos que pagam os medicamentos a prestações ou nem sequer os compram, do insuportável aumento do custo de vida dessas centenas de milhar de micro, pequenos e médios empresários e agricultores asfixiados pela banca, pelo preços dos combustíveis e da energia, pela falta de apoios prometidos e compromissos assumidos, falar das razões que levam ao abandono do interior, das assimetrias regionais num país cada vez mais inclinado para o oceano, e assumir que afinal os sacrifícios não são para todos perante os fabulosos lucros da finança e das grandes empresas que dormem à sombra da Bolsa e das actividades especulativas que como predadores insaciáveis se arrogam o direito de abocanhar mais empresas, sectores, funções sociais do Estado e serviços públicos de risco zero e lucro garantido que o Governo quer privatizar.

Não pode falar desta realidade!

Dizer onde estamos, quem ganhou e quem perdeu com esta política.

Porque seria reconhecer que “o rei vai nu!”, porque houve e há políticas concretas, grupos económicos e de interesses concretos responsáveis pela situação!

E não pode, não por ser vítima da conjuntura, ou de olhar para o país e para o mundo e partir da ideia desistente de que “o mundo é como é”!

Não sendo responsável pelos problemas estruturais que vêem de trás, no entanto, fez e faz opções usando o PS como motor das políticas neo-liberais e amortecedor da consciência e dos conflitos sociais.

Não tinha de ser assim! Há outro rumo para a política nacional! Mais adiante diremos!

Mas nesta fase interpelativa permita-me que lhe coloque uma questão concreta e uma preocupação de fundo: Tivemos ontem a notícia da decisão férrea da multinacional GM/OPEL da Azambuja de encerrar definitivamente a empresa.

Com todos os dramas e problemas sociais e consequências económicas mais à frente.

Aceita-se e pronto?

Nem assim o Governo vai agir na União Europeia para impedir a impunidade destas empresas que se instalam, exploram, sugam apoios e se deslocalizam quando muito bem entendem?

E não se argumente que isso assusta o investimento estrangeiro! Quando muito os beduínos!

Sem sofrerem nenhuma consequência? Vai limitar-se a ficar surpreendido ou, quanto muito, a reclamar algum dinheiro de volta?

Uma preocupação geral de fundo!

Os senhores do capital já não se limitam a escolher o bife do lombo da política económica e das privatizações!

Ensaiam propostas de assalto ao regime democrático e à eliminação da Constituição da República.

Nota-se o seu silêncio. Que diz? Que pensa?