Declaração política sobre a situação do País
Intervenção do Deputado Bernardino Soares
19 de Setembro de 2001

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,


Com a abertura da nova sessão legislativa a Assembleia da República retoma em pleno o seu papel privilegiado no debate político e no confronto de ideias e propostas sobre a situação e os problemas do país.

Com a abertura da nova sessão legislativa o PCP retoma igualmente a sua intervenção parlamentar; mantendo o seu compromisso de trazer à Assembleia da República os reais problemas do povo e do país; mantendo os seus princípios de rigor e de seriedade na intervenção e na proposta; mantendo a sua conduta de contribuição construtiva e empenhada na busca das melhores soluções.

Iniciamos esta nova sessão legislativa assentando prioridades nalgumas iniciativas que consideramos fundamentais.

Assim é com o agendamento do já apresentado projecto de "Medidas de reestruturação fundiária na área de intervenção do empreendimento de fins múltiplos de Alqueva". Trata-se de uma iniciativa que coloca em primeiro plano a necessidade de que os vultuosos investimentos públicos aí feitos e as potencialidades que a barragem do Alqueva, se traduzam em benefícios para o Alentejo e para o país e não apenas para um pequeno número de privilegiados.

E foi o PCP que desta forma introduziu as importantes questões que sobre esta matéria existem no debate político. Um pouco atabalhoadamente (diga-se) - aí vem hoje o Sr. Ministro da Agricultura marcar presença- o governo acabou depois por apresentar iniciativas que, mesmo independentemente da apreciação sobre o seu conteúdo, deveriam ter surgido numa fase muito anterior deste processo.

Da mesma forma apresentaremos nos próximos dias um projecto de lei sobre a gestão e direcção das unidades do Serviço Nacional de Saúde. Num momento em que visivelmente o governo faz da privatização da gestão dos hospitais a sua primeira prioridade política o PCP apresentará para discussão um conjunto de medidas e alterações que a serem aprovadas criarão condições para uma gestão pública mais eficaz, responsável e que permita melhor servir as populações que utilizam os serviços de saúde.

Porventura respondendo a um cada vez maior apetite e investimento do capital privado pela gestão de unidades públicas, apresenta-se agora como verdade absoluta a inevitável ineficiência e fracasso da gestão pública perante a inatacável racionalidade e sucesso da gestão privada. Assim aproveita o governo o justo descontentamento da população com as dificuldades que os serviços públicos atravessam para servir de bandeja a privatização como solução supostamente milagrosa e redentora.

Sem querer fazer mais comentários sobre as mais ou menos desastradas intervenções públicas do Sr. Ministro da Saúde, não nos surpreenderia se numa das suas próximas visitas a hospitais, envergasse orgulhoso na lapela um vistoso autocolante dizendo: "Privatizar hospitais? Pergunte-me como."

Sr. Presidente Srs. Deputados

Em época pré orçamental é de decisiva importância abordar os constrangimentos que à partida condicionam já o próximo Orçamento de Estado. E um deles é sem dúvida o cumprimento do pacto de estabilidade.

Trata-se de um instrumento que pelo seu conteúdo é uma peça chave da convergência monetarista e nominal e um obstáculo volumoso a qualquer tipo de convergência real obviamente afastada das prioridades da actual construção europeia.

O Pacto de Estabilidade contraria e entrava a coesão económica. Obrigando a orçamentos restritivos e com menos investimento acentua-se o atraso dos países menos desenvolvidos que não podem dispensar essa aposta no investimento, designadamente público.

O Pacto de Estabilidade contraria igualmente uma efectiva coesão social porque limita a possibilidade de maiores e necessários investimentos nas áreas sociais, no aumento dos salários e das pensões que nos aproxime dos bem distantes níveis dos países mais ricos da União Europeia.

Assim é com a aplicação de calendários e prazos rígidos e de grande restrição na despesa pública sem ter em conta as diversas situações de desenvolvimento de cada país (veste-se o mesmo fato a corpos diferentes); assim é também porque tais regras significam abdicar de importantes instrumentos orçamentais de cada Estado.

Os orçamentos devem ser de acordo com as necessidades de cada povo e de cada país e não de acordo com os desígnios dos directórios financeiros europeus.

Numa situação em que, face aos sinais de possível crise mundial, mais ainda é necessário um orçamento que pelo menos em parte contrabalance esta situação, não pode o governo continuar a seguir a política do aluno empenhado e cumpridor perante Bruxelas (apesar de outros países com melhores condições económicas já estarem a pôr em causa estes compromissos).

Nem sequer é suficiente ou satisfatório que o esforço do Governo se resuma a uma interpretação inteligente dos critérios do Pacto de Estabilidade e do Programa de Estabilidade e Crescimento. Em ambos o governo se vinculou perante a União Europeia, assumindo o défice zero ou excedente para 2004.

Por isso entregamos hoje na mesa um Projecto de Resolução que visa a suspensão e revisão do Pacto de Estabilidade e do Programa de estabilidade e crescimento, em que julgamos que o governo deve responsavelmente empenhar-se junto da União Europeia, defendendo os interesses do nosso país.

Não se trata de encontrar "interpretações inteligentes dos critérios do pacto de estabilidade"; trata-se antes de concluir, com inteligência, com seriedade e sobretudo com sentido de defesa dos interesses nacionais, que a Portugal e aos portugueses não servem as condicionantes monetaristas, anti-sociais e de entrave ao desenvolvimento do país que estão presentes no Pacto de Estabilidade e no Programa de Estabilidade e Crescimento.

E a conclusão é inequivocamente a da necessidade da sua profunda revisão e suspensão imediata.

Disse