Intervenção do Deputado
Cândido Capela

Situação social no Distrito de Braga

18 de Janeiro de 2001



Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhor Secretário de Estado,
Senhoras e Senhores Deputados:

Desde há anos que de orçamento em orçamento milhões de contos são transferidos para o sector privado da economia, como subsídios à revitalização de alguns sectores da actividade industrial, através da criação, expansão ou modernização de empresas. Os programas sucessivos, apoiados em diagnósticos onde se identificam as áreas estratégicas, subsidiam investimentos corpóreos e incorpóreos considerados vitais para o aumento da produtividade, a eficiência energética, a gestão ambiental e qualificação dos recursos humanos, a competitividade.

A indústria têxtil é e foi uma das destinatárias e beneficiárias desse esforço colectivo repartido pelas empresas e pelo Estado, numa tentativa de ultrapassar constrangimentos e evitar a morte prognosticada por tecnocratas apressados.

A prova de vida do sector têxtil e do vestuário está na balança comercial: as exportações de produtos têxteis continua a evidenciar um peso relativo que não pode ser ignorado. Não se confirmaram os vaticínios mais pessimistas.

A reestruturação e modernização do sector, por outro lado, é uma realidade ainda que àquem do desejado. A confirmá-lo estão as restrições (alguns dirão penalizações) contidas no POE, nos sistemas de incentivos SIPIE e SIME, que ao não majorar os projectos localizados no Vale do Ave, sub-região de quase mono indústria têxtil, indiciam da parte do Governo a intenção de ser mais exigente, mais selectivo, naturalmente por considerar que se atingiu um grau razoável de modernização.

Resta, para uma avaliação de alguns dos principais propósitos dos programas, apurar a evolução de outros indicadores, como, por exemplo, a qualificação profissional, as condições de trabalho e a questão salarial. Porque, convém recordar, também foi no pressuposto de ganhos futuros que os trabalhadores aceitaram participar no tal esforço colectivo, primeiro na qualidade de assalariados das empresas envolvidas, depois como contribuintes.

Em resumo, pode dizer-se sem receio de desmentido que face aos dados disponíveis que o esforço cumpriu parte fundamental das metas previstas, e nesta apreciação positiva convergem as opiniões mais variadas, desde associações empresariais a organizações de trabalhadores e ministérios. No que não haverá consenso é na repartição dos resultados.

A greve a desencadear pelos trabalhadores têxteis e do vestuário é antes do mais a expressão pública de um descontentamento e a revolta pela recusa de parte do patronato de minimizar os custos da operação de modernização.

A parte do patronato que aposta nos baixos salários, nos elevados rítmos de trabalho como alternativa à introdução de novas tecnologias, faz prevalecer a sua lógica conservadora, a sua visão passadista que sustenta a viabilidade das empresas na máxima exploração dos trabalhadores, enquanto no parque de estacionamento exibe as máquinas do último modelo.

Mas a greve é também um sinal de alarme para o Governo, pelos fundamentos da recusa das negociações directas. Se depois de tanto subsídio o sector não suporta um salário médio superior ao salário mínimo nacional, então é caso para dizer que alguns dos objectivos propostos não foram alcançados, é sintoma de desvio entre o previsto e o realizado que tem de ser esclarecido devidamente.

Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhor Secretário de Estado,
Senhoras e Senhores Deputados:

É por estas atitudes, por estes comportamentos que as populações do Distrito de Braga andam desconfiadas e descontentes.

Desconfiadas porque fartas de promessas não honradas.

Descontentes porque a passividade é suspeita. E em última análise beneficia o infractor.

A vida ensinou o povo a ser mais exigente e a não se conformar.

Como o demonstra a luta dos trabalhadores da Grundig que não se submetem às piruetas de um patronato habilidoso.

Como a recusa das populações e autarcas da Apúlia em aceitar exploração desenfreada do caulino e das areias.

Ou os cidadãos e eleitos autárquicos de Barcelos, Famalicão, Braga e Guimarães, que rejeitam opções ofensivas com impactes negativos na qualidade de vida.

E também os populares da Morreira, de Trandeiras e de Celeirós que se erguem em defesa dos seus centros cívicos.

Sem esquecer os jovens, os estudantes, que lado a lado com os professores e funcionários exigem melhores condições nas escolas.

Perante a natureza e a profundidade do descontentamento, espera-se que o Governo não se ponha à margem.

Perante a insatisfação das populações e dos autarcas fieis ao povo, o Governo não pode ficar indiferente esperando-se que entre relatórios convenientes e as pessoas fique do lado dos cidadãos.

Perante a denúncia dos trabalhadores e dos empresários inconformados com opções ministeriais que pouco ou nada fiscalizam, numa prática permissiva que potencia situações de concorrência desleal, exige-se do Governo que observe melhor antes de julgar, mas não fique imóvel.

Porque imóveis são as estátuas e todos sabemos o que as pombas lhes fazem.

Obrigado pela atenção dispensada.