Sobre o Orçamento Rectificativo
aprovado pelo
Governo PSD/CDS-PP

Declaração de Agostinho Lopes,
da Comissão Política do PCP

3 de Maio de 2002

 

Independentemente de análise na especialidade e mais aprofundada, logo que o Governo entregue a proposta na Assembleia da República, a Comissão Política do PCP considera desde já sublinhar dois aspectos essenciais:

- A irracionalidade económica e a incompatibilidade do Pacto de Estabilidade com as necessidades do País;

- A natureza de classe das medidas decididas pelo Governo, em que é sacrificada a generalidade dos portugueses e, em particular, das camadas e grupos sociais mais carenciados, e são beneficiados os lucros dos especuladores bolsistas.

1. O Pacto de Estabilidade, em nome do qual o Governo PSD/CDS acaba por justificar a necessidade do Orçamento Rectificativo, evidencia-se, mais uma vez, em brutal confronto com as necessidades de desenvolvimento do País e com as especificidades da sua situação, nomeadamente das suas carências no campo das políticas sociais. Ninguém, incluindo especialistas de economia, consegue demonstrar a bondade científica ou política do limite do défice máximo de 3% para o Orçamento do Estado, e fundamentalmente a validade do estabelecimento do mesmo valor para países com brutais diferenças de desenvolvimento económico e social.

O Pacto de Estabilidade, que agora surge de forma tão clara a determinar os números da política orçamental portuguesa e os ritmos de aplicação das medidas orçamentais propostas, vai reduzir e limitar as despesas públicas de investimento - a despesa mais útil ao País - vai estrangular e dificultar a intervenção autárquica, inclusive na aplicação dos fundos comunitários, na concretização de obras municipais, vai eliminar despesas sociais e dificultar gravemente o direito à habitação para jovens e cidadãos de baixos rendimentos, o que terá também evidentes reflexos económicos directos ao nível do sector da construção civil, e indirectos no conjunto da economia do País, vai degradar ainda mais os serviços públicos, designadamente os mais carenciados de profissionais.

Para lá das evidentes perversidades introduzidas nos últimos anos na transparência, rigor e verdade das contas públicas e políticas orçamentais pela engenharia financeira a que obrigou, o Pacto de Estabilidade acaba agora por criar um novo entorse político, atentatório das competências e atribuições soberanas da Assembleia da República: o Orçamento Rectificativo foi conhecido e apreciado hoje em primeira mão pelo ECOFIN - Conselho de Ministros das Economias e Finanças da União Europeia - e, posteriormente, pela Assembleia da República. O que é completamente inaceitável.

2. A apresentação deste Orçamento Rectificativo, que vai estimular os factores recessivos da economia e é altamente penalizador da generalidade dos portugueses pelas diversas medidas propostas, entre as quais sobressai o aumento da taxa do IVA em dois pontos percentuais, na semana em que a Assembleia da República vai apreciar a proposta do Governo de suspensão definitiva da tributação das mais valias (abdicando de potenciais receitas de muitas dezenas de milhões de euros), demonstra bem a natureza dos interesses económicos de que o Governo PSD/CDS-PP é advogado.

E mostra, simultaneamente, o valor que os partidos do Governo atribuem às promessas eleitorais com que bem recentemente se apresentaram ao eleitorado.

3. Não é possível tecer as críticas acima feitas ao Governo do PSD e CDS-PP sem sublinhar também as responsabilidades políticas do PS, designadamente pela sua postura fundadora e fundamentalista face ao Pacto de Estabilidade. Não chega, por isso, vir agora procurar marcar distâncias face às medidas propostas pelo governo da direita.

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Poderão agora os portugueses, quando forem confrontados com a falta do médico ou da enfermeira no Centro de Saúde, quando verificarem a falta do investimento na escola dos seus filhos, ou mesmo a falta de instalações, quando constatarem a não construção da estrada ou sentirem o atraso no pagamento da pensão ou do subsídio social, perceber melhor o significado concreto da marcha forçada para atingir os critérios do Pacto de Estabilidade, das opções antipopulares do Governo PSD/CDS-PP, e as razões do PCP para reclamar a suspensão e a revisão do Pacto de Estabilidade por um pacto de crescimento económico e emprego.