Interpelação do PCP ao Governo sobre MOEDA ÚNICA
Intervenção do Deputado Octávio Teixeira
19 de Março de 1997

 

Mais uma vez, durante esta interpelação, o senhor Primeiro-Ministro optou por se manter silencioso perante as acusações que o PCP lhe fez e ao seu Governo. Mais uma vez o senhor Primeiro-Ministro fez prova de que ama o diálogo, mas apenas e na medida em que esse diálogo não comporte o contraditório, desde que o senhor Primeiro-Ministro não seja obrigado a ser directamente confrontado com opiniões e razões que contestam as suas. E mais uma vez o senhor Primeiro-Ministro, com a sua postura de silêncio e com a sua substituição pelo senhor Ministro das Finanças, pretendeu dar a entender, quiçá aos seus próprios deputados mas certamente à opinião pública, que a opção pela moeda única é "apenas" uma questão de opção económica.

A verdade porém, e como ficou bem patente nas intervenções do PCP nesta interpelação, é que a Moeda Única é desde o início um projecto essencialmente político, com enormes e insofismáveis consequências nos domínios económico e social.

Porque é inequívoco, como o senhor Primeiro-Ministro bem o sabe e defende, que a motivação fundamental do avanço para a Moeda Única reside no pacto franco-alemão assente numa perspectiva federalista. Porque é evidente e inevitável que uma União Monetária exige e implica que não apenas a política macroeconómica e as políticas monetária e cambial, mas também as políticas orçamentais e fiscais (como o comprova o pacto dito de estabilidade), sejam definidas e reguladas a nível supranacional, eliminando rapidamente os poderes e soberanias nacionais.

E é para escamotear esta questão central que o Governo e os defensores da União Política europeia persistem, como hoje o voltaram a fazer o Governo e o PSD, em embalar a Moeda Única com meia dúzia de slogans indemonstráveis e de sofismas que não resistem à prova dos factos.

Mais uma vez ouvimos o argumento de que é essencial Portugal estar presente no núcleo duro da decisão europeia. Mas são incapazes de demonstra que o simples facto de Portugal vir a integrar uma moeda forte com uma economia fraca lhe vai dar um lugar decisivo na definição dos destinos da Europa. Pela enésima vez o Governo nos veio dizer que não integrar a Moeda Única significaria amarrar-nos para todo o sempre à "periferia" da União Europeia. Mas não são capazes de explicar porque é, pelo facto de eventualmente não integrarem o núcleo duro, a Dinamarca, o Reino Unido, a Espanha ou a Itália passam ser qualificados como países periféricos. Mais importante, escondem a nossa periferia decorre da fraqueza e atraso da nossa economia e que com a moeda única esse atraso se acentuará, e por isso se agravará a periferização de Portugal. Porque a verdade, como o Governo sabe e o Ministro alemão das Finanças já o fez saber publicamente, "a moeda única não se destina a ajudar os países da União Europeia a recuperarem os seus atrasos". Esses países nada mais têm que fazer que se adaptar e submeter à moeda única e às suas consequências.

De novo o argumento da estabilidade dos mercados cambiais e da descida das taxas de juro. Mas a moeda única não poderá ser um factor de estabilidade monetária nem porá fim à especulação cambial, antes imporá elevadas taxas de cambio e de juros, e tornará mais dura a especulação, já que um seu objectivo confesso é o da guerra pelo domínio dos mercados financeiros e pela atracção de capitais, em confronto com o dólar e o yen. Do mesmo modo que a Moeda Única não eliminará os défices comerciais que Portugal tem com todos os países comunitários. O que implicará é a perda de instrumentos para que Portugal possa reagir contra o agravamento desses défices.

Identicamente foi renovada a promessa de fé do Governo numa Europa social. Mas mais uma vez foi escamoteado que nessa guerra financeira a nível mundial de que a Moeda única será um factor de agravamento, serão inevitavelmente utilizadas como armas a sacrificar, como já está a suceder, o actual sistema de segurança social, a precariedade e instabilidade do emprego, os níveis salariais, a flexibilidade dos horários de trabalho, a polivalência forçada dos trabalhadores e a compressão das despesas sociais e, consequentemente, novas e mais numerosas exclusões sociais.

E, como sempre, voltámos a ouvir a recusa do Governo, do PS e do PSD à realização de um referendo nacional sobre a Moeda Única. Mas, como hoje aqui o afirmou o Secretário-Geral do PCP, esta é uma questão essencial e incontornável. Porque o desaparecimento do escudo e a passagem à Moeda Única que o Governo do PS, com a conivência activa dos PSD, quer impor aos portugueses, constituiria uma decisão de consequências incalculáveis. Com a Moeda Única e a transferência da total competência monetária para um Banco Central Europeu completamente à margem do sufrágio universal, é a própria soberania popular e os fundamentos da democracia que são postos em causa. O referendo que o PCP exige é uma exigência de cidadania dos portugueses. Exigência que corresponde à necessidade de debate e à vontade dos portugueses de terem a palavra para exprimirem as suas escolhas e fazerem valer as suas aspirações. Por essa exigência o PCP continuará a pugnar. Nas instituições e fora delas.

Disse,