É preciso, é urgente!
Uma outra política para as Comunidades Portuguesas

Declaração de Rui Fernandes, do Secretariado do PCP
20 de Junho de 2003

 

Os discursos oficiais nas comemorações do 10 de Junho puseram em evidência a ausência de políticas que respondam aos prementes problemas vividos pelas comunidades portuguesas e cuja sua resolução tem sido sucessivamente adiada por quem tem governado o País. Mais uma vez os governantes brindaram as comunidades com discursos demagógicos, recorrendo ao estafado discurso sobre a reconhecida importância dos emigrantes para Portugal, mas sobre as medidas concretas para a resolução dos inúmeros problemas que há muito afligem as comunidades nada disseram. Há, de facto, um típico vírus neste Governo e nesta política visando contagiar e levar as comunidades à perda da capacidade crítica.

Aliás, são reflexo das opções políticas, económicas e sociais de direita desenvolvidas ao longo de anos e agravadas, agora, pelo Governo PSD/CDS-PP, que atingem em particular os trabalhadores portugueses dentro e fora do país, em grande parte fruto da política cega de restrição orçamental, que conduz ao aumento da emigração portuguesa, como se pode constatar pelos números divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística, que aponta para um aumento superior a 30% no ano 2002 face aos resultados de 2001.

Os serviços e a rede consular

Decorridos 6 meses após o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas declarar, com pompa e circunstância, o encerramento de 6 postos consulares, afirmando, com ar circunspecto, ser esta uma medida no quadro da reestruturação consular, o que é possível concluir hoje, é que esta medida não obedece a nenhum critério de rigor e o seu adiamento deve-se, em grande parte, à forte contestação e luta por parte das respectivas comunidades portuguesas. Entretanto, o Governo vai anunciando a intenção de abrir postos consulares honorários quando é sabido não ser esta a estrutura adequada às necessidades - quanto muito servirá para os negócios de alguns, porventura integrados no projecto da diplomacia económica tão cara ao Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O PCP manifesta a sua total solidariedade e saúda a justa luta dos trabalhadores consulares que, pela segunda vez este ano, estiveram em greve na defesa dos seus direitos e contra a prepotência da tutela que recusa respeitar os compromissos assumidos com a estrutura sindical.

É hoje mais claro qual o verdadeiro alcance da “diplomacia económica” do Ministro Martins da Cruz – privilegiar os negócios e desprezar os cidadãos emigrantes. Este Ministro, pelo que vem fazendo no quadro daquelas que são as opções do PSD/CDS-PP, lesa os interesses da comunidade e, pelas afirmações que faz, lesa a imagem de Portugal.


O ensino da língua e cultura portuguesas

A situação do ensino da língua e cultura portuguesas no estrangeiro encontra-se numa encruzilhada preocupante, com o Governo a optar pelo “deixa andar” e a demitir-se das suas responsabilidades e obrigações constitucionais. A demissão da coordenadora de ensino em França, Isabel Barreno, por falta de meios e de resposta quanto à preparação do próximo ano lectivo, é disso um exemplo.

Não basta o Ministro dos Negócios Estrangeiros apelar aos emigrantes para que falem a língua portuguesa e a ensinem aos seus filhos. É fundamental que o Governo assuma as suas responsabilidades nesta matéria e deixe de encarar o ensino como uma despesa sem retorno em vez de olhar esta matéria e investir com uma visão estratégica.

Para esconder a ausência de uma política que, de facto, defenda e promova a nossa língua e cultura, em particular junto das novas gerações de lusodescendentes, o Governo fala muito da projecção de Portugal no Mundo, mas essa projecção surge da pior maneira através da crescente participação externa em missões militares. Em vez da afirmação e potenciação do riquíssimo património que são a cultura e a língua portuguesas, o Governo fala de armas. Em vez de potenciar a acção das comunidades portuguesas, o Governo fala de envio de militares.

O PCP declara que, no seu entender, a afirmação de Portugal no Mundo tem de ter na Comunidade Portuguesa um fundamental factor de projecção nacional. Por essa razão o PCP tem defendido a criação de um programa de expansão e qualificação do Ensino da Língua e Cultura Portuguesas nas Comunidades.

E porque não se fica por meras declarações de intenções, o PCP apresentou na Assembleia da República 3 iniciativas legislativas relacionadas com esta área: um projecto de resolução que visa promover o ensino da língua e cultura portuguesas no estrangeiro; um projecto de lei que altera o Estatuto do cooperante; um projecto de lei relacionado com o vinculo dos trabalhadores do Instituto Camões.


Os ex-militares emigrantes

Sobre esta matéria o Governo continua a fazer declarações de boas intenções mas, na prática, vai adiando que seja feita justiça a todos os ex-militares e, em particular, àqueles que emigraram e que, por isso mesmo, foram discriminados quando da definição do regime jurídico dos períodos de prestação de serviço militar de ex-combatentes, para efeitos de aposentação e reforma, estabelecido pela Lei 9/2002.

O PSD, que votou favoravelmente as propostas do PCP de alteração a esta lei (ainda na vigência do Governo PS, estas mesmas propostas foram chumbadas pelo voto do PS e do CDS-PP), na sua campanha eleitoral disse que ia rever a lei e até ao momento nada fez.

Entretanto, o Ministro da Defesa Paulo Portas, vai fazendo declarações a anunciar o número de inscritos, mas vai adiando sucessivamente a data para aplicação de medidas concretas e sua calendarização. O descaramento chegou ao ponto de o ministro, que também é Presidente do CDS/PP, anunciar que as medidas seriam divulgadas no Congresso deste partido, (previsto inicialmente para Maio e adiado agora para não se sabe bem quando). Agora vem dizer que deve estar para sair a regulamentação.

O PCP que já depositou na Assembleia da República um projecto de lei com vista à resolução do problema, considera inadmissível a instrumentalização partidária por parte do Ministro e alerta para o facto de que a saída da regulamentação não significa a resolução do problema, mas mais um patamar, necessário é certo, para permitir ao Governo continuar a alimentar uma esperança que para muitos já não será um beneficio concreto.

Conselho das Comunidades Portuguesas

Nos próximos dias 26, 27 e 28 de Junho realiza-se, na Assembleia da República, o Plenário Mundial do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP). Os conselheiros que agora reúnem pela primeira vez após as eleições realizadas em 31 de Março passado, foram eleitos por sufrágio directo pelas comunidades portuguesas espalhadas por diversos países e continentes.

A realização desta reunião é, sem margem de dúvidas, uma importante vitória da grande maioria dos conselheiros e das comunidades portuguesas, que sempre se bateram pela autonomia do CCP e que, contra muitas adversidades, demonstraram com esta eleição, a sua vontade e determinação em aprofundar a democracia participativa.

Também aqui o Governo esteve mal, ao anunciar a meio do processo eleitoral para o CCP a intenção de criar uma estrutura paralela, ou seja: os Conselhos Consultivos de Áreas Consulares.

O PCP saúda os conselheiros, na esperança de que esta reunião seja um virar de página que ficou marcado por sucessivas tentativas de governamentalização e obstrução ao regular funcionamento deste importante órgão representativo das comunidades portuguesas.

O PCP, saúda ainda os eleitos que, pelo seu empenhamento e vontade expressa, pretendem desempenhar o seu mandato de forma responsável e determinados em defender os interesses das comunidades que agora representam.

O PCP reafirma todo o seu empenho político e institucional, em contribuir para que os conselheiros possam desempenhar as suas funções sendo para isso indispensável que o Governo português não repita erros do passado e atribua ao CCP os meios financeiros de forma a garantir o seu funcionamento com autonomia e dignidade.