Sobre Defesa Nacional e Forças Armadas
Conferência de Imprensa com Rui Fernandes, da Comissão Política do PCP
17 de Março de 2006

A prática do governo nestes meses, em que o mal-estar existente teve menor expressão pública, ao não manifestar interesse em dialogar com as associações representativas dos militares nem as integrar, tal como a lei obriga, nos grupos de trabalho constituídos no Ministério da Defesa e as notícias que dão conta de punições de militares por participarem numa vigília, tornam evidentes as concepções intolerantes que invadem este governo. Aliás relativamente a estas punições importa registar dois factos: primeiro a coincidência delas ganharem um novo fôlego, com a passagem do Tenente-General Carvalho dos Reis para a chefia da Casa Militar do PR; segundo, depois de um longo silêncio que sugeria o seu arquivamento os processos voltaram à ribalta naquilo que se assemelha mais a uma gestão política intimidatória dos militares, do que à aplicação das regras da disciplina castrense.

De facto, o Governo não parece muito preocupado com a especificidade da condição militar e tudo o que ela projecta na instituição militar e na sociedade.

A ver vamos o que nos vai trazer a execução da “nova política de emprego na Administração Pública” e se a redução dos quadros do regime geral e especial, onde se incluem os militares, não abrirá a porta ao alargamento do limite de idade e do tempo de permanência nos quadros de complemento e à redução dos quadros permanentes das Forças Armadas. Veremos se a aplicação da “nova gestão de efectivos” não será uma porta para a precarização que nos conduzirá a uma forma de “privatização” da instituição militar, transformando as Forças Armadas numa força armada, pronta a cumprir os objectivos prioritários do Governo de participação “no sistema de defesa colectivo da Aliança Atlântica”.

Preocupações suscitam-nos ainda, noticias que vão dando conta da intenção de aplicar em 2007, às FFAA, o Sistema de Avaliação da Administração Pública, no quadro da tendência mais geral de “funcionalização” dos militares e da Instituição Militar. Como se pode aplicar o mesmo sistema de avaliação para realidades tão distintas e de especificidades tão peculiares? É inaceitável!

Como é inaceitável que continuem a não se vislumbrar medidas que resolvam a situação dos ex-militares, no que respeita à contagem do tempo de serviço para efeitos de reforma, como é o caso de milhares de portugueses da diáspora.

Em relação à reforma do modelo de organização das Forças Armadas e à sua interoperabilidade, a aprovação pelo Conselho de Ministros da Lei Orgânica do Exército levanta a legítima dúvida se não estamos a começar a casa pelo telhado, já que o primeiro diploma a ser alterado deveria ser a Lei de Bases de Organização das Forças Armadas e as alterações nos três ramos não deveriam ser executadas isoladamente. Desta forma, poderemos uma vez mais resumir a reestruturação a meras preocupações economicistas e à gestão/venda do um património militar que tem uma ligação directa com o fundo de pensões. Aliás, no que respeita ao fundo de pensões, todos sabemos a agonia em que este se encontra, mas continuam a não ser tomadas medidas com vista à resolução da situação.

Mas, se em relação aos direitos, ao sistema retributivo, à saúde e à protecção social é hora de apertar o cinto, de retirar e coarctar direitos, já em relação ao reequipamento militar comportamo-nos como um país rico.

Enquanto se degrada o material existente para o cumprimento das funções e missões das FFAA, o Governo, à revelia da realidade económico-financeira do país e de uma visão estratégica nacional realista, comprou novos aviões C-295 que irão substituir os Aviocar/C-212 ao mesmo tempo que se prepara para gastar largos milhões de euros na actualização dos P3 Orion. Num país com as conhecidas dificuldades financeiras, os novos (e dispendiosos) helicópteros EH 101 e os P3 actualizados não cumpririam minimamente o papel dos Aviocar? Quanto vai custar e com que dinheiro se vai operar e manter estas novas frotas?

E, porque consideramos que há caminhos alternativos, no momento em que o Governo se prepara para entregar na Assembleia da República uma proposta de revisão da actual Lei de Programação Militar – LPM aprovada pelo PS (com os votos do CDS) com o altíssimo valor de 215 milhões de contos para seis anos e a previsão de mais 263 milhões para os seis anos seguintes, posso anunciar que, entre outras propostas, o PCP apresentará, em sede própria e no momento adequado, propostas que visam a venda de 10 aviões F-16 e, para tal, dará prioridade à execução do programa de actualização dos F16, para o qual já foi feito o respectivo investimento, com o objectivo de aprontamento das 40 aeronaves.

Considerando a actualização em curso dos F16 e conhecidas as dificuldades na manutenção de uma só esquadra, a venda de 10 aviões poderá permitir à Força Aérea operar em pleno com duas esquadras de 15 aviões.

Noutro plano, preocupa-nos os sinais que vão surgindo quanto a atrasos na concretização dos Patrulhões (NPO), este sim, um programa prioritário.

O PCP, num ano em que acção governativa do PS assumiu o legado das políticas de direita, reafirma que também na área da Defesa Nacional e das Forças Armadas há propostas alternativas para a modernização, a reestruturação e o reequipamento das FFAA adequado às exigências e à realidade nacional e que contemplam, como vector prioritário, a dignificação da carreira militar.