EXPO 98
Intervenção do deputado João Amaral
30 de Setembro de 1998

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados:

No momento de encerramento da EXPO 98, a primeira palavra deve ir para os que tornaram possível o seu sucesso. Dirigimo-nos aos que a conceberam e dirigiram, incluindo Mega Ferreira, Cardoso e Cunha e Torres Campos. E dirigimo-nos muito particularmente aos que a ergueram e a fizeram funcionar: planeadores, urbanistas, arquitectos, operários, técnicos, trabalhadores dos múltiplos serviços envolvidos, artistas, operadores de transportes, profissionais de hotelaria, afinal um mundo de empenhados construtores da Exposição Mundial de Lisboa.

A EXPO 98 teve assim as características de uma realização nacional, que não é por isso apropriável por ninguém. Não vão faltar os que tentarão puxar para si os méritos da realização, mas fica a certeza de que prestam um mau serviço à imagem e à memória histórica da EXPO 98.

Do acontecimento efémero que foi a EXPO 98, ficará muito a imagem de qualidade do recinto e da sua arquitectura, a valia de muitos dos seus pavilhões ( incluindo a qualidade do pavilhão que representava Portugal), e a boa prestação da organização. Há quem queira ver nesta capacidade de realização, uma excepção, ou uma novidade. Da nossa parte, se assinalamos a capacidade demonstrada na realização da EXPO 98, entendemos que o povo português já demonstrou e demonstra todos os dias, múltiplas capacidades. Não descobrimos com a EXPO a nossa confiança nas capacidades do nosso povo, sempre as conhecemos e exaltamos.

A escolha do tema dos oceanos contribui para dar à EXPO 98 uma dimensão universal, numa área que está dramaticamente relacionada com o futuro da Humanidade e que interessa vivamente à comunidade científica. A própria ONU declarou 1998, Ano Internacional dos Oceanos, e a Comissão Internacional, sediada em Lisboa, apresentou um importante Relatório sobre o tema. Existindo na opinião pública, e particularmente nos jovens, crescentes preocupações e interesse por estas questões, esperemos que a chamada de atenção realizada na EXPO não seja efémera como é a Exposição, e o Governo desenvolva as acções necessárias para dar continuidade aos esforços feitos.

A Exposição atraiu milhões de visitantes, mas um número mais baixo do que era previsto. Têm sido adiantadas algumas razões para isso. Todas discutíveis. Mas há uma razão que é inquestionável. A realidade é que muitas famílias portuguesas vivem em condições que não lhes permitem suportar os custos de uma deslocação à EXPO. Os valores em transportes, entradas e consumos inevitáveis, somados, tornaram a EXPO inacessível a muitos e muitos portugueses. Certamente que teria sido possível fazer mais para ter permitido a esses portugueses terem acesso à EXPO.

Como é evidente,.numa realização com a dimensão da EXPO'98, teria de haver sempre pontos de pormenor menos felizes ou errados. Por exemplo, não faltou quem observasse que poderiam ter dado um maior espaço na restauração à gastronomia regional portuguesa. Mas estas observações não obscurecem o sentido geral da apreciação que fizemos. Uma palavra, a este propósito, sobre a promoção internacional. A promoção foi feita pela direcção da EXPO de um ponto de vista comercial, isto é, escolhendo os mercados que pudessem fornecer mais visitantes. Competia ao Governo combinar essa promoção com uma outra, que visasse mais chamar a atenção para Portugal do que propriamente atrair visitantes. Mas, o Governo não cumpriu essa função que a EXPO propiciava. Fez mal.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados:

Falando do futuro, há três questões centrais: as contas, a operação de reconversão urbana, e finalmente a questão do emprego. Quanto às contas, a descoberta do desfalque e o caso dos navios fretados para alojamentos, mostraram que havia erros graves no processo de controlo de despesas e de custos.

Desde o início, a questão dos gastos foi uma preocupação constante. A EXPO foi lançada com a ideia de que se pagaria a si mesma. Em Março de 1995, o então Ministro Ferreira do Amaral, afirmava na Assembleia da República que "a EXPO não custará nada ao contribuinte". Pouco mais de um ano depois, aparecia com toda a crueza o défice à vista de todos, com valores de várias dezenas de milhões de contos. O então Ministro das Obras Públicas disse na mesma reunião em que informava o País que a Gare do Oriente custaria 11 milhões de contos, quando hoje o custo já ronda os 35 milhões.

O processo de gestão da EXPO nos primeiros tempos do Governo PS, foi marcado por muita truculência partidária e por algum mau gosto, que conduziu à substituição do Comissário Geral. Foram então feitas promessas de absoluto controlo e rigor.

Mas, hoje, depois das fraudes descobertas, a pergunta que continua por responder é a de saber como funcionava e como falhou o sistema de controlo. Por exemplo, no caso dos navios, o Ministro disse na Comissão que ele próprio pôde constatar por observação pessoal o baixíssimo movimento dos navios. Então, como é que a gestão superior da EXPO 98 tinha o sistema de fiscalização organizado para não dar por nada?

Hoje, o Governo anuncia vários inquéritos, pelas mais variadas entidades. Não será necessário dar coerência e unidade a este conjunto de inquéritos para que nada escape por qualquer zona não coberta?

Da nossa parte, exigimos o total apuramento de contas, a análise detalhada de todos os gastos, a investigação da sua conformidade com as regras legais e os adequados procedimentos de gestão, e o apuramento de todas as responsabilidades, em todos os escalões, pelos erros, desvios ou fraudes.

A segunda grande questão para este post-EXPO é a operação da reconversão urbanística.

Da nossa parte, PCP, reafirmamos o apoio à ideia de associar a realização da EXPO a uma operação de reconversão urbanística, recuperando uma das zonas mais degradadas do País. O território da zona de intervenção estende-se pelos municípios de Lisboa e Loures, municípios que o PCP gere, no caso de Lisboa em coligação com o PS. Tivemos muitas oportunidades de manifestar na prática o empenhamento no programa urbanístico da zona, que se vai desenvolver fundamentalmente a partir de agora. Defendemos que sejam respeitados os planos elaborados. Queremos que a EXPO seja um espaço articulado com a cidade, e não uma ilha. Entendemos que a zona não deve servir para especulação urbanística, com uma massa excessiva de construção. Pronunciamo-nos por um adequado uso do espaço público, que deve ser aberto a toda a população, incluindo os espaços verdes. Defendemos o desenvolvimento do programa de animação, que mantenha uma boa relação com o rio e apelem à participação dos cidadãos. Apoiamos uma correcta articulação entre as funções habitação, lazer, serviços e outras actividades económicas. Não escondemos que vemos com preocupação o afastamento de todo o tipo de indústrias do perímetro da cidade.

Como é sabido, está neste momento em exame, entre o Governo e os dois municípios, a forma de fazer a transição das competências de gestão territorial da Parque EXPO para o poder local. Há já um protocolo assinado, que deixa muita coisa para desenvolvimento posterior. A transferência é inevitável já que, nos termos da lei geral, essas competências são do nível autárquico. Mas a transferência não pode significar sobre-encargos sobre os municípios. Para já, impõe-se que todas as decisões de planeamento e outras, sejam objecto de acordo municipal.

A última observação refere-se ao emprego. O fim da EXPO vai gerar inevitavelmente a supressão de postos de trabalho. Para além de um certo número de jovens que fizeram só o período da EXPO e regressam agora aos estudos, há muitos trabalhadores que vão ser atirados para o desemprego. Impõem-se as medidas necessárias para dar adequada solução a este problema social.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

Hoje encerra a EXPO 98, que assinalamos como um sucesso, apesar das observações feitas. Esperamos que o post-EXPO não contrarie as expectativas criadas.

Disse.