Sobre a reunião do Comité Central
Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
21 de Abril de 2006

O Comité Central do PCP procedeu a uma avaliação da actual situação política, económica e social do país, bem como analisou os principais traços da actual situação internacional e definiu as principais linhas de intervenção e resposta política. Debateu ainda o conjunto de orientações e linhas de trabalho com vista ao reforço da organização do Partido e à sua actividade futura.

O Comité Central considera que o actual quadro da situação política, o seu desenvolvimento recente e perspectivas de evolução, são marcados pelo prosseguimento e acentuação das políticas de direita do Governo do PS dirigido por José Sócrates e pela eleição de Cavaco Silva para a Presidência da República, que correspondeu à criação de uma situação que, no plano institucional, tende a traduzir-se na afirmação de um bloco de poder ao serviço dos grandes grupos económicos e financeiros.

A anunciada “cooperação estratégica” entre a Presidência e o Governo deixa prever, como os últimos tempos o têm revelado, a intensificação da ofensiva com vista à restrição ou eliminação de direitos e conquistas sociais dos trabalhadores e do povo e uma nova ofensiva contra os serviços públicos e as funções sociais do Estado.

O Comité Central considera que um ano de Governo do PS evidencia uma acção deliberada para a acentuar e aprofundar a política de direita dos governos anteriores e que se tem traduzido no agravamento dos problemas nacionais, na criação de mais desigualdades e injustiças sociais, e na degradação das condições de vida dos trabalhadores, dos reformados, dos micro, pequenos e médios empresários.

A intenção anunciada na «Convenção Novas Fronteiras», realizada recentemente pelo PS, de acelerar o que chamam de «reformas» da Administração Pública, já em curso, e também do sistema político, deixa antever não apenas um agravamento da ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e uma nova redução do serviço público, como um novo empobrecimento do regime democrático.

Da avaliação extremamente negativa da evolução da situação económica e social do País, o Comité Central destacou o brutal agravamento do desemprego, a forte desaceleração do crescimento real do produto em 2005 (+0,3%), a degradação dos rendimentos e disponibilidades económicas das camadas laboriosas, em primeiro lugar dos trabalhadores, mas também da generalidade de reformados e pensionistas, dos trabalhadores independentes e pequenos empresários das pescas e agricultura, da indústria e serviços.

O Comité Central salienta em contraste o empolamento dos rendimentos financeiros e o chocante incremento de taxas de lucro das empresas dos grandes grupos económicos, com vultuosas distribuições de dividendos e inflacionamento de patrimónios mobiliários pelos jogos bolsistas das «opas» e «contraopas».

É significativo mas chocante que estes sejam tratados como intocáveis, sejam privilegiados e endeusados enquanto quem vive dos seus rendimentos de trabalho seja tratado com hostilidade, chegando-se ao ponto de considerar o direito à segurança no emprego, às férias e protecção social como um privilégio corporativo.

O Comité Central do PCP responsabiliza inteiramente o Governo do PS pela actual situação económica e social, por ter prosseguido, sem qualquer ruptura, as políticas económicas e sociais dos anteriores governos do PSD/CDS-PP.

O evidente desconcerto manifestado no seio do PSD e do CDS-PP é a expressão das dificuldades sentidas por estes partidos para encontrar e afirmar um espaço próprio de acção e agenda políticas, num quadro de grande identificação entre a actual governação do PS e a sua acção passada.

O Comité Central do PCP sublinhou as inevitáveis consequências da opção e obsessão pelo cumprimento do «Pacto de Estabilidade», que o Governo PS/Sócrates manteve como eixo central das políticas económicas, e a constatação, numa primeira avaliação dos valores de 2005, que essa política falhou, mais uma vez, naquele que é o seu principal objectivo – reduzir de forma sustentada o défice orçamental.

Na verdade não só não se verificou a atenuação da despesa pública, como se constata o aumento da divida pública de 58,6% do PIB em 2004 para 64% em 2005.

O Comité Central denuncia a continuidade de uma política de privatizações, com o objectivo de obter receitas que travem e compensem o crescimento da dívida pública, desarmando o Estado do comando de empresas estratégicas, delapidando recursos públicos com deterioração no curto prazo das receitas, arriscando a passagem do seu controlo para o capital estrangeiro.

Esta política desbarata enormes potencialidades do País em recursos humanos e naturais, e não resolve o problema central do baixo nível de investimento público e privado, como se pode constatar pela quebra acumulada de investimento (15%) entre 2002 e 2005.

Não se vê, aliás, como as permanentes acções de propaganda do Governo em torno de alguns projectos de investimento, de um dito plano tecnológico, ou da infundada expectativa de que o capital estrangeiro atraído por vultuosos benefícios fiscais, possam responder à necessidade de um crescimento económico na ordem dos 3% - 3,5%, que permita um efectivo combate ao desemprego.

O Comité Central realçou a clara assunção das teses neoliberais pelo Governo PS/Sócrates da concepção do Estado, um Estado mínimo, reduzido, segundo um dos seus ministros de Estado, às «funções de segurança e reguladoras». O Estado deveria assim, nesta visão, alienar grande parte das funções que ainda detém na prestação de serviços, nomeadamente na área económica.

Esta concepção do Estado, que favorece a pressão sobre a despesa pública por parte do «Pacto de Estabilidade», que por sua vez suporta e anima a visão minimalista do Estado, está na base da mais poderosa ofensiva contra os serviços públicos, a Administração Pública e todos os trabalhadores do Estado, desencadeada depois do 25 de Abril.

Uma ofensiva que nenhum governo do PSD, com ou sem CDS-PP, se atreveu a desencadear ou desencadearia, mesmo não desdenhando desse projecto e objectivo!

Ofensiva que, em nome de melhores e mais eficientes serviços públicos, abre caminho à sua privatização e liberalização, encarecendo os custos de acesso, encerrando serviços e afastando os utentes de um serviço de proximidade, para concretizar uma significativa e economicista redução da despesa pública, e muito em particular com uma drástica e cega redução de trabalhadores.

Ofensiva que pretende dar um novo e rude golpe nas funções sociais do Estado, coarctando e eliminando direitos dos portugueses, duramente conquistados e constitucionalmente garantidos, acelerando a desertificação de inúmeras regiões do País, agravando assimetrias regionais.

O Comité Central do PCP chamou a atenção para a ofensiva dirigida contra os direitos dos trabalhadores e os seus salários, designadamente o que é dirigido contra o sistema público da segurança social e a contratação colectiva.

A classe mais numerosa, os trabalhadores portugueses não conheceram, antes pelo contrário, uma medida, uma lei positiva por parte do PS.

O Governo não só mantém uma atitude que, alicerçada na recusa da prometida revisão do Código do Trabalho, faculta às organizações patronais a denúncia geral dos contratos colectivos visando a sua caducidade, como prossegue a sua ofensiva contra direitos, de que são exemplos as recentes alterações ao subsídio de desemprego.

O Comité Central do PCP salienta que o principal referencial e os eixos de enquadramento das políticas do Governo PS assentam num conjunto de orientações e política comunitárias, nomeadamente a «Estratégia de Lisboa», o «Pacto de Estabilidade» e as orientações do Banco Central Europeu, o Processo de Bolonha, o amplo conjunto de dossiers de liberalização e privatização de serviços, a Directiva Bolkestein e a Directiva da organização do tempo de trabalho.

O Comité Central salientou que, na actual conjuntura e no presente quadro político, e sem prejuízo da acção do Partido no plano das instituições, a luta de massas e a intervenção organizada dos trabalhadores e das populações em defesa dos seus direitos e aspirações assume particular importância.

O Comité Central valorizou particularmente as próximas comemorações populares do 25 de Abril e do 1º de Maio que devem constituir uma importante expressão da determinação dos trabalhadores e do povo na afirmação de Abril e do projecto de democracia consagrado na Constituição e da sua inabalável confiança na luta enquanto elemento de resistência à política de direita e de criação de condições para uma ruptura com esta política e de afirmação do caminho de uma política alternativa e de um novo rumo para Portugal.

No que se refere à situação internacional o Comité Central sublinhou como característica fundamental, a persistência do quadro contraditório na evolução da situação internacional e alerta especialmente para a situação explosiva no Médio Oriente, resultante da ocupação imperialista do Iraque e também do Afeganistão, da cruel repressão sionista do povo palestiniano e, de modo crescente, da escalada de ingerências e ameaças de agressão militar contra o Irão, cujos preparativos estão há muito em marcha nos EUA.

No actual contexto internacional a problemática da Europa e da União Europeia adquire ainda maior importância para Portugal e para a luta do povo português.

O Comité Central reafirmou a sua firme oposição ao anunciado propósito, ilegítimo e ilegal, de relançar o processo da chamada «constituição europeia» e de transformar a presidência portu-guesa da União Europeia no segundo semestre de 2007 num momento crucial desse processo.

O Comité Central chama uma vez mais a atenção para a multiplicação e crescente banalização dos ataques a liberdades e direitos democráticos, e para as campanhas visando demolir garantias consagradas na Convenção de Genebra e outras Convenções internacionais e de, através da chamada «reforma» da ONU, legalizar gravíssimas regressões em matéria de direitos democráticos e humanos.

O PCP valoriza altamente a resistência e a luta que prossegue por todo o mundo, do Iraque à Palestina, de Cuba à Venezuela, do Sahara à Bolívia, do «Não» francês e holandês ao chamado «tratado constitucional» às grandes lutas em França contra a precariedade laboral.

No que diz respeito à actividade partidária e ao conjunto de linhas de trabalho e orientações para o reforço do PCP o Comité Central sublinhou e valorizou a intensa actividade partidária dos últimos meses, na resposta aos mais variados problemas dos trabalhadores e do povo, nomeadamente a acção desenvolvida em defesa da contratação colectiva, contra o desemprego; a defesa e valorização da segurança social; o combate contra as privatizações; a denúncia do ataque contra a administração e os serviços públicos; as iniciativas em defesa e valorização da Constituição da República Portuguesa a propósito do seu 30º aniversário.

O Comité Central sublinhou o grande sucesso da campanha de recrutamento de 2500 novos militantes lançada o ano passado que culminou no final de Março com a adesão ao Partido de 3015 militantes, 36 % dos quais com menos de 30 anos, o maior nível de adesão ao Partido dos últimos anos o que confirma a sua capacidade de atracção e as possibilidades reais do seu reforço.

O Comité Central, analisou as exigências do trabalho de direcção, decidiu reforçar a composição dos organismos executivos, bem como as estruturas de apoio à direcção central e apontou um vasto conjunto de linhas de intervenção e iniciativa política para os próximos meses, entre as quais, as relativas às questões dos salários e dos direitos dos trabalhadores; os problemas do desemprego; a defesa do serviço nacional de saúde e da segurança social pública; os problemas dos reformados; os direitos das mulheres; o combate às privatizações e ao ataque à administração pública e dos serviços públicos; os problemas do desenvolvimento; as questões de Portugal e da União Europeia.

Na concretização das linhas de intervenção política o Comité Central confirmou um diversificado calendário de iniciativas para as áreas da agricultura e mundo rural, saúde, reformados, administração pública, associativismo popular, União Europeia, bem como a sessão pública de homenagem a Lopes Graça no âmbito das comemorações do centenário do seu nascimento (Maio) e a deslocação ao forte de Peniche (30 de Abril).

O Comité Central chamou à atenção para a importância do 8º Congresso da JCP, que se realiza a 20 e 21 de Maio em Gaia, e apela às organizações partidárias para que contribuam para o seu êxito.

No plano das iniciativas do ano em curso, o Comité Central destacou o significado da realização em 1, 2 e 3 de Setembro da 30ª edição da Festa do Avante!