Estatuto dos Deputados
Intervenção do Deputado António Filipe
30 de Novembro de 2000

 

Sr. Presidente,
Srs. Deputados

Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, quero dar conta a esta Câmara das razões que motivaram a nossa abstenção na votação final global do projecto de lei relativo à quinta revisão do Estatuto dos Deputados.

De facto, na revisão do Estatuto dos Deputados estão contempladas diversas matérias, algumas delas com escassa relação umas com as outras e de natureza completamente diversa.

Houve disposições constantes do texto agora aprovado relativamente às quais votámos contra na Comissão respectiva, assumindo, aliás, uma posição de coerência com atitudes que o Grupo Parlamentar do PCP tem vindo a adoptar aquando das alterações ao Estatuto dos Deputados. Designadamente, consideramos que o mandato de Deputado deve ser exercido em exclusividade e, neste sentido, votámos contra a disposição que passa a considerar a existência de um Estatuto único de Deputado, fazendo cessar qualquer diferenciação entre os Deputados que estão em regime de dedicação exclusiva e os que o exercem o mandato em regime de acumulação. Considerámos, e consideramos desde há muito tempo, que o exercício do mandato de Deputado não deve ser feito em situação de acumulação.

De igual forma, em Comissão, votámos contra disposições que alteram artigos relativos a incompatibilidades e impedimentos e que fazem cessar situações de incompatibilidade que foram aprovadas aquando da revisão de 1985. Curiosamente, os próprios partidos que, na altura, propuseram incompatibilidades e impedimentos são os mesmos que agora vieram propor e votar a sua eliminação. Portanto, votámos contra disposições desta natureza.

No entanto, votámos favoravelmente a disposição, de que muito se tem falado ultimamente, que obriga os titulares de órgãos das autarquias locais exercidos em regime de tempo inteiro ou de meio tempo, que são os presidentes de câmara e os vereadores que estejam em regime de tempo inteiro ou de meio tempo, a optarem entre o exercício desse mandato e o exercício do mandato de Deputado à Assembleia da República.

Entendemos que é legítimo um autarca candidatar-se a Deputado da Assembleia da República mas é exigível que, uma vez eleito, opte entre continuar a exercer o seu mandato de autarca, e servir as populações por esta forma, e preferir exercer o seu mandato de Deputado, servindo o País através do exercício deste mesmo mandato.

De igual forma, pensamos que um Deputado, que tenha sido eleito autarca, também deve optar entre as duas funções, por aquela que quer exercer, não devendo criar uma situação em que exista uma espécie de reserva de lugar na Assembleia da República, em relação à qual o autarca pode vir, um dia que queira cessar as suas funções autárquicas, exercer esse direito de preferência que criou na Assembleia da República aquando da sua eleição.

Portanto, pensamos que essa situação não dignifica de facto a democracia portuguesa, não dignifica o exercício da função parlamentar e, neste sentido, votámos favoravelmente, na Comissão, esta disposição.

Termino de imediato, Sr. Presidente, dizendo que o nosso voto de abstenção resulta do facto de terem sido aprovadas posições com que concordamos e disposições de que discordamos.

(...)

Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Jaime Marta Soares terá incorrido em alguma confusão, porque nunca me passou pela cabeça dizer que os autarcas não defendem o País.

Os Deputados defendem o País, os autarcas defendem o País e há também outros titulares de cargos políticos que defendem o País. Não há é necessidade de todos defenderem o País no mesmo local e ao mesmo tempo.