Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Voto de condenação pelo assassinato, em Angola, de Alves Kamulingue, Isaías Cassule e Manuel Ganga

(voto n.º 156/XII/3.ª)

Declaração de voto

O Grupo Parlamentar do PCP expressa a sua condenação pelos atos que resultaram no desaparecimento e morte de Alves Camulingue e Isaías Cassule, regista as iniciativas desencadeadas pelas autoridades angolanas para esclarecimento de responsabilidades e transmite às famílias das vítimas as suas condolências. De igual modo, lamenta e apela ao cabal esclarecimento dos acontecimentos que levaram à morte do cidadão angolano Manuel Ganga.

O Grupo Parlamentar do PCP expressa igualmente a sua preocupação com os recentes desenvolvimentos em Angola, afirma a importância da soberania e da unidade do Estado angolano e exprime a sua condenação pelas ações que visam pô-las em causa, considerando da maior importância a salvaguarda e o desenvolvimento das relações de cooperação e de amizade entre Portugal e Angola, na base dos princípios da igualdade, do respeito mútuo e da não ingerência nos assuntos internos de cada país, assim como da cooperação mutuamente vantajosa em prol dos interesses do povo português e do povo angolano.

A República de Angola e o povo angolano conquistaram a paz há cerca de 10 anos, após uma longa luta de libertação nacional pelo fim do colonialismo do regime fascista português, em defesa da soberania e independência e contra a ingerência e a agressão externa do regime de apartheid sul-africano e pelo fim da guerra civil e por um processo de reconciliação nacional. Recentemente, realizaram-se eleições em Angola, no quadro do normal funcionamento das suas instituições e no respeito do seu quadro constitucional.

Não obstante, os trágicos acontecimentos que conduziram à morte dos três cidadãos angolanos, cujas responsabilidades devem ser apuradas, estão a ser aproveitados por forças políticas (designadamente, a UNITA) com o objetivo de criar um clima de desestabilização que, declaradamente, visa pôr em causa o normal funcionamento das instituições angolanas.

Tais factos ocorrem no momento em que vários países do continente africano são alvo de manobras de ingerência e desestabilização de pendor neocolonialista que, como aconteceu na Líbia ou na Somália, visam a quebra da sua unidade interna, independência e soberania nacionais, procurando colocar em causa caminhos de desenvolvimento soberano e alcançar um ainda maior domínio dos seus recursos e riquezas, e em que se assiste a uma onda de militarização deste continente e de profusão de conflitos e agressões atentatórios da soberania e independência de vários países, nomeadamente por via da intervenção dos Estados Unidos da América através do seu AFRICOM. Das sucessivas operações de desestabilização interna em vários países do continente africano, têm resultado conflitos militares com consequências devastadoras para os respetivos povos.

De acordo com a Constituição da República Portuguesa, as relações entre Portugal e Angola devem pautar-se pelo estrito respeito pela independência e soberania de ambos os países, bem como das suas instituições, e tais relações devem rejeitar quaisquer intentos de ingerência ou traços de neocolonialismo. Os laços de amizade e cooperação que unem os povos angolano e português, fundados na luta comum contra o fascismo e a opressão colonial, são reconhecidamente de grande importância para ambos os povos e países, pelo que devem ser evitadas ações que visem ostensivamente comprometer e dificultar esse relacionamento.

Por esta razão, o PCP, compartilhando a preocupação subjacente à necessidade de apurar responsabilidades pela morte dos cidadãos angolanos acima referidos, não acompanha os termos do voto proposto pelo BE.

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