Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

"Uma multinacional chegou a Portugal como se desembarcasse em terra de ninguém"

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Ao promover este agendamento para a sessão plenária de hoje na Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP pretende contribuir para uma discussão séria e com respostas concretas para a situação grave que se está a verificar no sector do Táxi.

Queremos saudar as organizações representativas do sector; saudamos os milhares de trabalhadores, de motoristas, de motoristas por conta própria, de pequenos industriais, de cooperativas, que continuam a trabalhar, a resistir e a lutar em defesa de um sector que é parte integrante do sistema de transportes e que, em muitas regiões do país, é o único transporte público que as populações têm.

Aliás, importa sublinhar que o sector do Táxi enfrenta dificuldades há muito tempo. Quando a concorrência desleal e ilegal das multinacionais apareceu, já o sector se encontrava descapitalizado, debatendo-se com problemas reais, desde a fiscalidade até à do transporte de crianças ou de doentes, passando pela regulamentação da formação, etc.

Eram problemas como estes que deviam ter sido debatidos e resolvidos – e que foram tantas vezes suscitados pelo PCP na Assembleia da República – mas pelo contrário, o que aconteceu foi o agravamento destes problemas durante a governação PSD/CDS-PP.

Ora, quando muitos pequenos industriais ou motoristas por conta própria já se encontravam em situação aflitiva, de enormes dificuldades (e em muitos casos já a devolver os alvarás e a encerrar a actividade – isto é, quando a situação já era grave – o sector foi então confrontado com a concorrência ilegal de uma multinacional norte-americana, que chegou a Portugal como se desembarcasse em terra-de-ninguém e entrou em actividade à margem da lei, continuando tranquilamente como se nada fosse.

E essa situação de impunidade, que está a causar a indignação e a revolta no sector do Táxi, tem que ter uma resposta concreta e um ponto final por parte do Estado e das autoridades.

O artigo 13.º, número 1, da Constituição da República, estabelece o Princípio da Igualdade e afirma: «Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei».

São bem conhecidas as exigências que são colocadas ao sector do táxi. É um sector regulado, com regras de licenciamento e de acesso à actividade. As autoridades competentes e a regulamentação em vigor determinam as características dos veículos utilizados, os contingentes, isto é, quantos táxis podem existir em cada concelho. A formação e a aptidão e a certificação dos motoristas estão fixadas no quadro legal e regulamentar. O regime de preços é definido por decreto-lei e as tarifas são determinadas por convenção.

Tudo isto se aplica e exige ao sector do Táxi. E há quem não cumpra nenhuma destas regras e se apresente como estando acima da lei. Talvez pensem que estão acima da lei – mas não estão! E há que tomar as medidas que sejam necessárias para garantir que a lei é igual para todos, e para que não permaneça a ideia de que “o crime compensa”.

É esse o objectivo desta iniciativa e desta proposta do PCP: reforçar as medidas dissuasoras e a eficácia dos mecanismos processuais na fiscalização e no combate à actividade ilegal no transporte em táxi.

E desde já importa clarificar do que estamos a falar. É que de acordo com as autoridades competentes, de acordo com os tribunais, não há controvérsias nesta matéria: o transporte de passageiros em viaturas ligeiras em Portugal é transporte em táxi. Não há escapatórias nem manobras de diversões que iludam este facto. Não pode haver, enquanto actividade económica, uma situação de privilégio para quem quer que seja.

Por isso esta discussão é sobre as consequências que resultam para aqueles que desenvolvem, ou promovem, ou fazem a angariação ou intermediação, para o transporte de passageiros fora das normas legais. É essa a discussão e não outra!

Esta não é uma discussão sobre tecnologias nem plataformas nem aplicações. Aliás, como temos vindo a sublinhar, plataformas há muitas, e em Portugal também! Há um balanço positivo das plataformas e soluções tecnológicas do sector do táxi. Numa importante cooperativa do sector, a informação que nos foi transmitida é de que em cada três serviços de táxi que são chamados, um é activado pela plataforma para smartphones.

A questão é precisamente essa: ou as plataformas e os serviços que lhes estão associados cumprem as regras do sector em que se enquadram ou simplesmente não podem ser permitidos. E por isso apresentamos estas propostas, para reforçar as medidas a este nível.

Importa adiantar claramente e desde já que pretendemos que seja uma norma especificamente aplicável ao exercício de actividade sem licença, e não de forma indiscriminada. Não estamos a falar de mecanismos automáticos, mas sim de processos mais eficazes que podem ser dirimidos nos termos legais.
Queremos aqui valorizar e agradecer os contributos recebidos das estruturas representativas do sector. Referimos expressamente os que dizem respeito à regulamentação das plataformas e das actividade de animação turística.

Repetimos e sublinhamos: o problema está a crescer porque tem havido passividade. E isso não pode continuar.

Queremos dar o exemplo, propondo medidas. Manifestamos total abertura e disponibilidade para trabalhar em conjunto e encontrar as melhores soluções no processo legislativo. Esta é uma resposta de urgência a um problema urgente e concreto que se está a colocar no sector. Não queremos impedir nem substituir nenhuma discussão. O que pretendemos é contribuir, também na Assembleia da República, para um debate e para um processo que se deve iniciar. É para esse debate que convocamos a participação dos senhores deputados.

Disse.

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