Intervenção de Carlos Carvalho, Membro do sector de transportes da ORLisboa do PCP, Seminário "A crise na União Europeia e a ofensiva contra os direitos, a liberdade e a democracia"

Transportes aéreos, marítimos e soberania

Cabe-nos a nós a tarefa de vos falar da ofensiva contra os direitos, liberdades, democracia e a própria soberania nacional, no âmbito do sector dos transportes e, especificamente, do sector aéreo e do sector marítimo-portuário.

Esta ofensiva vem sendo desenvolvida há 35 anos, após a revolução do 25 de Abril, contra as grandes conquistas que o povo português e os trabalhadores então conseguiram.

No entanto, mais recentemente, com a entrada de uma troika estrangeira “invasora” no nosso País (FMI, BCE e UE), com a conivência de uma troika nacional colaboracionista (PS, PSD e CDS/PP) e do Presidente da República, aquela ofensiva atingiu níveis de tal modo graves que conduziu a um aumento brutal da exploração, do desemprego, graves cortes salariais e nas pensóes de reforma, aumentos de impostos, etc. E uma fortíssima recessão da economia!

No sector aéreo, o actual governo PSD e CDS/PP, com o apoio do PS, tem como objectivo a privatização das principais empresas do sector, a TAP e a ANA, que a ser concretizada, com a implementação do Céu Único Europeu, constituiria a entrega ao capital privado de alavancas essenciais da soberania nacional.

Isto corresponde a uma política anti-patriótica e reaccionária, de submissão aos interesses do grande capital e a decisão de privatizar estas empresas é criminosa, coloca em causa a soberania nacional, ameaça largas dezenas de milhares de posto de trabalho e seria uma desastre económico de proporções incalculáveis para a economia nacional.

A TAP é uma empresa com 100% de capital público, a companhia de bandeira de Portugal, o maior exportador nacional, com quase dois mil milhões de euros de exportações, com mais de cem milhões de euros anuais de receitas para a segurança social e constitui um poderoso grupo de empresas do sector aéreo, com capitais públicos.

A TAP representa largas dezenas de milhares de postos de trabalho, directos e indirectos e não recebe qualquer cêntimo do governo há 15 anos!

A TAP assegura a capacidade soberana nacional de transporte aéreo num País com 11 ilhas no território, com milhões de cidadãos em comunidades emigradas, em todo o mundo, com os países de expressão oficial portuguesa e onde o turismo representa uma percentagem significativa do PIB (Produto Interno Bruto).

A TAP possui uma frota jovem de 55 aviões, com oito anos de idade média e uma capacidade internacionalmente reconhecida na manutenção aeronautica.

Já há alguns anos uma tentativa de um governo do PS de venda da TAP à Swissair, só foi derrotada pela luta dos trabalhadores, custou milhões à companhia, a Swissair desapareceu e a TAP cresceu e afirmou-se.

Este actual processo de privatização pode e deve ser derrotado. Para isso é necessária uma dura luta, numa acção que aglutine os intereses patrióticos e progressistas de amplos sectores do povo português, contra esta autentica traição nacional do governo PSD/CDS.

Abordemos agora a empresa que gere os principais aeroportos nacionais, a ANA.

É uma empresa de 100% de capitais públicos, lucrativa, que assumiu e assume, sozinha, toda a modernização e investimento na rede aeroportuária nacional.

No seu grupo também possui uma empresa de handling, a Portway.

Trata-se, portanto, de alienar uma empresa lucrativa e estratégica e que, em conjunto com a TAP, constituiria a alienação toda a soberania nacional no sector aeroportuário, colocando-se ainda mais nas mãos dos “mercados”, prosseguindo o caminho do empobrecimento e submissão, quando o que se impõe é uma ruptura com esse caminho.

Há que integrar também a luta contra a privatização da ANA, porque os aeroportos são estratégicos, a sua gestão pública integrada é decisiva para a sua expansão e modernização, a viabilidade do sector aéreo fica em risco.

No sector aéreo ainda nos falta abordar a questão da navegação aérea. A empresa que presta os serviços de tráfego aéreo é a NAV, também empresa com 100% de capitais públicos, em que os seus serviços são pagos por obrigações e acordos internacionais, através das chamadas “taxas de rota”, pelo Eurocontrol, com sede em Bruxelas. Elas são receitas da empresa, asseguram a totalidade dos salários dos trabalhadores e são autênticas exportações de Portugal.

A NAV não depende do Orçamento do Estado e, apesar da especificidade do seu modelo de negócio, tem uma operação rentável em que cerca de 85% do volume de vendas correspondem a exportações. Ou seja, não só a NAV é contribuinte líquida do OE, como os seus trabalhadores induzem uma contribuição líquida indirecta para as contas públicas, por via dos impostos sobre os salários. O que significa que a NAV e os seus trabalhadores criam, de facto, riqueza para o país.

A NAV é responsável pela prestação dos serviços de navegação aérea nas duas Regiões de Informação de Voo sob responsabilidade de Portugal (Lisboa e Santa Maria), naquele que se constitui como um dos maiores espaços aéreos do mundo, com uma área total de aproximadamente seis milhões de quilómetros quadrados – 62 vezes o tamanho do território nacional.

Este espaço aéreo representa uma enorme mais-valia para um pequeno país como Portugal, pelo que é incompreensível a sua não utilização integral no âmbito do projeto Céu Único Europeu.

Como podem constatar, pelo que vos expusemos atrás, a ofensiva ao nível do sector aéreo é global, atingindo a empresa de bandeira, a gestão dos aeroportos e a gestão do espaço aéreo.

Repetimos que as consequências ao nível do sector aéreo são os despedimentos, a retirada de direitos, o aumento da exploração dos trabalhadores, a abdicação da soberania nacional sobre o transporte aéreo, a destruição das empresas e do sector, ao serviço dos interesses da acumulação de capital, nacional e transnacional.

Só a luta contra as privatizações da TAP e da ANA, as poderá salvar de serem liquidadas, o mesmo sucedendo sobre a soberania nacional do espaço aéreo nacional.

Finalmente, no sector marítimo portuário, o governo compromete o futuro do sector, anunciando uma revisão do regime de trabalho portuário. Trata-se de uma revisão que se destina a descer o preço da força do trabalho e a fazer regressar a precariedade mais selvagem, para que os trabalhadores portuários regressem à “modernidade” de 1950/60.

O governo, ao mesmo tempo que avança contra os trabalhadores, fazendo do incremento brutal da exploração a base das suas ditas “reformas”, projecta também alterações no modelo de organização, gestão e propriedade dos portos contrárias ao interesse e soberania nacional.

Os trabalhadores responderam adequadamente com importantes lutas que paralisam os portos nacionais.

Esta forte ofensiva de destruição do sector dos transportes e a sua entrega ao grande capital continuará a encontrar pela frente a luta dos trabalhadores, para o impedir e acabar de vez com a política de direita.

A luta continua!