Intervenção de Diana Ferreira na Assembleia de República

«Todos os dias são negados direitos fundamentais às pessoas com deficiência»

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

É inadiável a tomada de medidas concretas para responder às muitas necessidades, dificuldades e problemas sentidos pelas pessoas com deficiência e suas famílias.

O artigo septuagésimo primeiro da nossa Constituição determina que as pessoas com deficiência gozam plenamente dos direitos constitucionalmente consagrados, devendo o Estado “(…) realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração (…)” das pessoas com deficiência e de apoio às suas famílias, bem como deve assumir “(…) o encargo da efectiva realização dos seus direitos (…)” e apoiar organizações das pessoas com deficiência.

Neste artigo, por si só, cabem os direitos fundamentais das pessoas com deficiência e a responsabilidade do Estado na efectivação desses direitos.

Existe ainda a Lei Anti-Discriminação, que previne e proíbe a discriminação, “(…) directa ou indirecta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas (…)”, e sanciona “(…) a prática de actos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros.”

Portugal subscreveu e ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Sendo um dos Estados-Parte, a ratificação desta Convenção obriga o Estado e vincula todos os Governos a tomarem medidas garantam o cumprimento de direitos e liberdades fundamentais.

Nos 50 artigos da Convenção estão definidas responsabilidades dos Estados-Parte em matérias como emprego, educação, saúde, protecção social, habitação, mobilidade, acesso à justiça, à cultura, ao desporto, ao lazer; de participação na vida social e política. Estão definidas responsabilidades específicas quanto aos direitos das mulheres e das crianças com deficiência.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

Estes (e outros) diplomas jurídicos são fundamentais. Mas tão fundamental quanto o que está escrito no papel é a existência de políticas e medidas concretas que traduzam para a vida de todos os dias o que é suportado no papel há largos anos.

Todos os dias são negados direitos fundamentais às pessoas com deficiência.

Quando se perpetuam as dificuldades no acesso ao emprego com direitos, tanto no sector público, como no privado; quando a formação profissional das pessoas com deficiência está aquém do necessário e possível para que esta corresponda à aquisição de conhecimentos, capacidades e competências para a inclusão na vida activa; quando se vão eternizando situações de pobreza e exclusão e quando a protecção social é manifestamente insuficiente, são negados direitos fundamentais.

Quando faltam meios humanos, materiais e pedagógicos na Escola Pública para o devido acompanhamento e efectiva inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas especiais;

Quando persistem dificuldades no acesso a centros de saúde, a cuidados hospitalares, a produtos de apoio, a medicamentos, a terapias essenciais ao acompanhamento e reabilitação;

Quando perduram graves problemas de mobilidade, seja pelas barreiras arquitectónicas que impedem a circulação nos espaços e na via pública, seja no acesso a transportes públicos e colectivos (com casos de escandalosa discriminação);

Quando 20 anos depois da consagração da Língua Gestual Portuguesa na Constituição perduram obstáculos comunicacionais (como a falta de intérpretes de Língua Gestual nos serviços públicos ou a necessidade de melhores condições de acessibilidade televisiva para as pessoas surdas), limitando e impedindo o acesso a serviços públicos e à informação;

Quando não estão garantidas condições de igualdade no acesso à cultura, ao desporto, ao lazer, à participação na vida social e política são negados direitos fundamentais.

Quando não são devidamente valorizados os profissionais que trabalham nesta área são negados direitos fundamentais – aos trabalhadores e às pessoas com deficiência.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

A dignidade na vida das pessoas com deficiência é inseparável do cumprimento destes direitos.

O PCP tem intervindo por diversas vezes, com propostas concretas. Fomos o primeiro partido a intervir, na Assembleia da República, sobre a vida independente.

Apresentámos propostas para a valorização da formação profissional das pessoas com deficiência, entendendo que importa garantir o seu acesso a todo o tipo e a todos os níveis das acções de formação profissional disponíveis, sendo este um relevante princípio que poderá garantir a igualdade de direitos e de oportunidades, nomeadamente à inclusão na vida activa.

Apresentámos propostas para a eliminação das barreiras arquitectónicas, para um caminho de equiparação dos atletas paralímpicos aos olímpicos, para a criação de uma bolsa de intérpretes de Língua Gestual para os serviços públicos e de valorização da Língua Gestual Portuguesa.

Interviemos sobre a necessidade de se garantir melhores condições de acesso à Prestação Social para a Inclusão.

Defendemos e apresentámos propostas sobre o atestado multiusos e a necessidade da sua gratuitidade e o reforço de meios humanos, materiais e pedagógicos no âmbito da Educação Especial.

Apresentámos propostas para melhor protecção social dos trabalhadores sinistrados do trabalho.

Intervenção que continuaremos a assumir. Apresentando soluções e apontando caminhos para que seja cumprindo o tanto que está consagrado em muitos documentos, sabendo que a participação activa das pessoas com deficiência, suas famílias e suas organizações representativas é imprescindível para novas conquistas.

A melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência e o cumprimento dos seus direitos exigem medidas transversais e articuladas. Exigem que o Estado não se demita das suas responsabilidades – consagradas na Constituição, previstas em Lei e plasmadas na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, subscrita e ratificada pelo Estado Português e que vincula todos os governos a agirem para o seu cumprimento.

O PCP cá estará, como sempre tem estado, com o seu contributo. Para que se construa não um caminho de assistencialismo, que representa um retrocesso social, mas sim um caminho de progresso e justiça social, inseparável da concretização de uma vida digna, autónoma e independente, direito inalienável de todos e de cada um.

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