Projecto de Lei N.º 89/XIII/1.ª

Suspende as penhoras e vendas de habitação própria e permanente em processos de execução fiscal e determina a aplicação de um regime de impenhorabilidade desses imóveis

Suspende as penhoras e vendas de habitação própria e permanente em processos de execução fiscal e determina a aplicação de um regime de impenhorabilidade desses imóveis

Exposição de motivos

As dificuldades que atingiram as vidas de milhões de portugueses nos últimos anos tiveram consequências, em muitos casos, dramáticas. As situações em que muitos milhares de famílias ficaram sem as suas casas por terem perdido os seus rendimentos e não conseguirem fazer face às despesas que haviam assumido são uma dessas situações mais dramáticas.
A perda da habitação por milhares de famílias nos últimos anos é expressão cruel da situação para que foram conduzidas as vidas dos portugueses que, esmagados pelas medidas económicas e sociais tomadas por sucessivos governos, foram empurrados para situações de perda de rendimentos, falência ou insolvência.
Os roubos de salários e pensões, a destruição de milhares de postos de trabalho e os despedimentos, os cortes nos apoios sociais, a falência de milhares de pequenas e médias empresas ou a aprovação da lei dos despejos, além de conduzirem a uma situação generalizada de retrocesso social, conduziram a situações individuais em que milhares de famílias, depois de perderem tudo o resto, perderam também a casa.
Num quadro em que os direitos básicos e fundamentais das famílias a condições mínimas de dignidade foram postos em confronto com os interesses dos credores, particularmente da banca, a lei revelou-se duramente penalizadora das famílias portuguesas.
Essa realidade motivou dois processos de alterações legislativas ao regime do crédito à habitação, para os quais o PCP contribuiu com os Projetos de Lei n.ºs 243/XII e 500/XII propondo medidas de defesa da manutenção da habitação pelas famílias em situação económica difícil.
O resultado dessas alterações revelou-se, como de resto o PCP havia já alertado, manifestamente insuficiente face às dificuldades que atingem os portugueses.
Entretanto foram surgindo exemplos dramáticos de como as dificuldades que conduzem à perda da habitação se mantêm e vão muito além das situações consideradas nas leis entretanto aprovadas.
Os exemplos de milhares de execuções fiscais que conduzem à perda da habitação dos executados revelam ainda que nos últimos quatro anos foi o próprio Governo PSD/CDS a dar o pior exemplo, promovendo execuções fiscais que conduziram à perda da habitação por vezes para pagamento de dívidas de valor reduzido face ao valor do imóvel e não considerando devidamente soluções alternativas que permitissem evitar essa consequência.
Esta situação decorre das opções políticas assumidas pelo anterior Governo PSD/CDS, das orientações dadas à Administração Tributária, que não impedem antes massificam as situações de perda da habitação por execução fiscal, mas resultam também da lei que dá cobertura a tais opções e orientações políticas.
Aquando da revisão do Código de Processo Civil, em Abril de 2013, o PCP alertou na sua declaração de voto para o facto de se permitir a perda da habitação de alguém que aufere o salário mínimo por uma dívida de 1800 euros.
Já em 2015, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou e trouxe à discussão o Projeto de Lei n.º 703/XII com vista à alteração da lei de forma a impedir que este flagelo se mantivesse. Lamentavelmente a proposta do PCP acabou por ser rejeitada.
Continua, no entanto, a revelar-se urgente a alteração deste quadro legal que dá cobertura à generalização das situações de perda da habitação, restringindo a possibilidade de penhora ou execução de hipoteca sobre a habitação a situações em que estejam esgotadas as possibilidades de pagamento de parte substancial do montante em dívida.
Visando esse objetivo, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta dois Projetos de Lei defendendo a manutenção da habitação.
Com o presente Projeto de Lei, o PCP propõe a suspensão das penhoras e vendas dos imóveis que sejam habitação própria e permanente no âmbito de processos de execução fiscal. A par disso determina-se um regime de impenhorabilidade relativa da habitação própria e permanente, a aprovar em lei especial.
No segundo Projeto de Lei são fixadas as condições desse regime de impenhorabilidade relativa dos imóveis que constituam habitação própria e permanente dos executados.
Nesse Projeto de Lei, o PCP aperfeiçoa as soluções apresentadas no Projeto de Lei n.º 703/XII, propondo que se elimine possibilidade de penhora ou execução de hipoteca sobre a habitação quando se comprove a inexistência de rendimentos suficientes para assegurar a subsistência do executado ou do seu agregado familiar, incluindo no âmbito de processos de execução fiscal.
O PCP propõe igualmente que se restrinja a possibilidade de penhora ou execução de hipoteca sobre a habitação às situações em que não seja possível garantir, pela penhora de outros bens ou rendimentos, o pagamento de dois terços do montante em dívida no prazo estabelecido para pagamento do crédito concedido para aquisição do imóvel.
O PCP propõe ainda que a venda do imóvel possa apenas concretizar-se quando o montante a realizar com essa venda seja superior ao que seria obtido com aquela penhora de outros bens e rendimentos do executado, podendo essa penhora incidir sobre rendimentos de terceiros que o executado indique, desde que obtido o respetivo consentimento.
Com as soluções agora avançadas pelo PCP, preserva-se o direito à manutenção da habitação e privilegiam-se soluções alternativas àquelas que têm conduzido à situação, reconhecida generalizadamente como injusta, de empurrar para fora de casa famílias a quem já pouco ou nada resta de conforto.
Assim, nos termos legais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto e âmbito
1- A presente lei suspende as penhoras e vendas de habitação própria e permanente em processos de execução fiscal e estabelece um regime de impenhorabilidade da habitação no âmbito desses processos executivos.
2- Consideram-se abrangidos pela presente lei os imóveis que constituam habitação própria e permanente do executado, ficando excluídos os imóveis destinados a segunda habitação ou outros destinados a outros fins.

Artigo 2.º
Suspensão das penhoras e vendas de habitação própria e permanente em processos de execução fiscal
1- Consideram-se suspensas as penhoras e vendas de imóveis que incidam sobre habitação própria e permanente do executado.
2- A suspensão da penhora ou venda do imóvel é promovida a requerimento do executado no âmbito do respetivo processo ou, nos termos do artigo seguinte, oficiosamente pelos serviços da Administração Tributária.

Artigo 3.º
Identificação de imóveis
1- Os serviços da Autoridade Tributária devem proceder, no prazo de 30 dias, à identificação de todos os imóveis que sejam habitação própria e permanente do executado e sobre os quais recaia penhora.
2- Uma vez concluída a identificação referida no número anterior, os serviços da Autoridade Tributária devem proceder oficiosamente à suspensão das penhoras ainda existentes relativamente aos imóveis abrangidos pela presente lei.

Artigo 4.º
Impenhorabilidade da habitação própria e permanente em processos de execução fiscal
A penhora de imóvel que seja habitação própria e permanente do executado no âmbito de processos de execução fiscal está sujeita às limitações constantes de lei especial.

Artigo 5.º
Alterações ao Código de Procedimento e Processo Tributário
Os artigos 219.º e 231.º do Código de Procedimento e Processo Tributário passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 219.º
Bens prioritariamente a penhorar
1 – (…)
2 – (…)
3 – (atual n.º 4)
4 – A penhora ou execução de hipoteca sobre imóvel que seja habitação própria e permanente do executado está sujeita às limitações constantes de lei especial.

Artigo 231.º
Formalidades de penhora de imóveis
1 – (…)
2 – (…)
3 – (…)
4 – (…)
5 – A penhora de imóveis pode também ser efetuada nos termos do Código de Processo Civil, estando sujeita às limitações constantes de lei especial quando se trate de imóvel que seja habitação própria e permanente do executado.»

Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, em 4 de janeiro de 2016

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