Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, Conferência de Imprensa

Sobre o aumento do custo de vida

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O ano que agora começa trouxe consigo uma das mais violentas vagas de aumento de preços dos últimos anos, com o correspondente agravamento do custo de vida para milhões de portugueses.

Se foi sendo conhecida a escalada que ao longo de meses PS e PSD foram cozinhando com o empenhado patrocínio do actual Presidente da República, na verdade, é agora a partir dos primeiros dias do mês de Janeiro que as suas consequências se vão reflectir mais duramente nas condições de vida dos portugueses.

O Governo PS e o PSD recusaram as propostas do PCP de aplicação de uma taxa efectiva de IRC de 25% para as empresas e grupos económicos com lucros superiores a 50 milhões de euros, valor que corresponderia a mais 700 milhões de euros de receita (350 dos quais da banca) mas já estiveram disponíveis para agravar de 21 para 23% a taxa de IVA, cujo impacto se fará sentir num aumento generalizado dos preços de bens e serviços, atingindo essencialmente a população de mais baixos rendimentos.

O Governo PS e o PSD também rejeitaram as propostas do PCP de actualização da taxa a aplicar às mais-valias obtidas na especulação financeira de 20% para 21,5%, estiveram contra a criação de um imposto de 0.2% sobre transacções financeiras, inviabilizaram a taxação em 20% das transferências para os off-shores e chumbaram, vergonhosamente, a proposta do PCP para impedir o descarado assalto aos recursos do Estado através da antecipação da distribuição de dividendos por parte de alguns dos principais grupos económicos, entre eles, a PT. Em contrapartida, impuseram o corte nos salários da administração pública, decidiram pelo congelamento das reformas e pensões, retiraram o abono de família centenas de milhar de crianças, reduziram ainda o acesso ao subsídio de desemprego para milhares de desempregados.

Os aumentos que estão a ser impostos no início deste ano não são por isso uma qualquer inevitabilidade que se abateu sobre o país. São uma consequência do processo de agravamento da exploração dos trabalhadores e de acumulação e concentração capitalista que está em curso, de absoluta e descarada protecção dos interesses do grande capital como se prova pelos mais de 5000 milhões de euros enterrados no BPN e que tem no actual Governo e do Presidente da República a decisão e o aval.

Conjugados com a subida do IVA, aumentarão os custos com a energia eléctrica - 3,8% no consumo doméstico e até 10% no consumo industrial – e o preço do gás com mais 2,6% e 4,1%. Isto, num sector que foi privatizado e é hoje dominado por grandes grupos económicos, e onde, ao longo dos últimos 12 meses, assistimos a uma escalada sem fim à vista com o agravamento do preço do gasóleo em 17%, da gasolina em 12% e do gás em 23%.

Os transportes públicos, designadamente os passes sociais, vão também sofrer aumentos entre os 3,5% e os 4,5%. As portagens vão aumentar em média 2,3% e novos troços de auto-estradas até agora isentos vão passar a ser portajados. Aumentos ainda nos serviços de táxi de 5%. Agravamento também do Imposto sobre os veículos automóveis com a componente ambiental a subir 2,2%.

Na saúde aumentarão os valores das taxas moderadoras e doutros serviços hospitalares, taxas aliás que passarão a ser pagas por trabalhadores desempregados e reformados (que ganhem acima do salário mínimo nacional) até aqui isentos. Agravamento também do preço dos medicamentos com a entrada em vigor do novo regime de comparticipações.

Anunciam-se ainda aumentos preocupantes em bens essenciais para a alimentação como é o caso do pão – onde se adiantam valores superiores a 10% - e de outros artigos como o vestuário e o calçado, assim como, nos preços dos serviços e comissões bancárias, e também das telecomunicações.

Todos estes aumentos em conjunto, para além de retirarem qualquer credibilidade à taxa de inflação de 2,2% prevista pelo governo para 2011, confirmando que estas estimativas essencialmente como um factor de contenção da evolução dos salários – significarão uma insuportável perda de poder de compra por parte da população.

Só uma tremenda dose de hipocrisia e de descaramento, poderá explicar tanto discurso e cerimónia sobre os problemas da pobreza no nosso país, ao mesmo tempo que se impõe uma política que empurra cada vez mais pessoas para situações de dificuldade e carência.

Pobreza que tem como causas mais próximas o desemprego, os baixos salários e pensões. E que torna ainda mais escandaloso o roubo ao salário mínimo nacional concretizado por decisão do Governo, com apoio do grande patronato e da UGT, e que retira a partir deste mês 15€ ao valor anteriormente acordado. Uma actualização do salário mínimo que em termos nominais é a mais baixa dos últimos 28 anos e que visa condicionar a evolução do conjunto dos salários no nosso país.

E se é verdade que tais aumentos dos preços e cortes nos salários e pensões terão gravíssimas consequências sociais, não serão menores os impactos na actividade económica pela diminuição do consumo e da procura interna, agravando assim o quadro recessivo que já nem o governo consegue esconder.

Governo e Presidente da República sabem que com estes sacrifícios a situação não fica pior agora e melhor mais à frente. Ficará pior salvo para a banca e os grupos económicos.

É perante esta situação, profundamente inquietante para o presente e o futuro do país que o PCP reafirma as suas posições e propostas para enfrentar a actual situação.

Há soluções socialmente mais justas, economicamente viáveis e politicamente necessárias. Um outro rumo e uma outra política assente numa opção de ruptura com a política de direita que defenda e promova a produção nacional, valorize o trabalho e os trabalhadores, aumente os salários e as pensões, defenda os serviços públicos e as funções sociais do Estado, afirme o interesse nacional por via do controlo público de sectores estratégicos, defenda a soberania e a independência nacionais.

Neste ano que agora começa, perante tão gritantes injustiças que estão a impor ao povo português, não pode esperar governo e grande patronato outra coisa, que não seja a intensificação da indignação, do protesto e da luta por parte dos trabalhadores e das populações. Uma luta que garantidamente contará com a solidariedade e apoio do PCP.

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