Seis propostas do PCP<br />

O PCP anuncia hoje um conjunto de seis projectos de lei que vai apresentar na Assembleia da República. É um contributo do PCP, de um partido que não se rende, que não baixa os braços perante um problema cujas causas estão profundamente associadas à sociedade em que vivemos e cujas consequências são particularmente sentidas. Não há hoje qualquer certeza de se estar a verificar uma inversão do agravamento da toxicodependência. Se há indicações do consumo de heroína estar a incidir em estratos etários mais elevados, afectando menos os jovens, a expansão para as zonas rurais, o crescimento do uso de outras drogas e o aparecimento de novas drogas sintéticas mostram que a situação é preocupante e coloca novas exigências de prevenção e intervenção. A resposta a este problema continua marcada por inaceitáveis atrasos e insuficiências. Passado quase um ano sobre o anúncio da estratégia nacional de luta contra a droga, que quando foi anunciada já devia estar em aplicação há anos, nada de significativo foi implementado, continua a não existir nenhum estudo global sobre a incidência da toxicodependência e acumulam-se as hesitações e contradições de que é exemplo o anúncio do fim do Projecto Vida logo contraditado com a nomeação de um novo responsável para o referido Projecto. Por tudo isto impõe-se agir. É esse o sentido das propostas do PCP, um contributo para uma acção mais eficaz e mais profunda. Não com a ideia que temos todas as soluções na mão para um problema tão vasto e tão complexo e que por isso exige uma continuada reflexão, não com a ideia de que as propostas que avançamos sejam ideias acabadas, antes com o espírito de abertura à discussão e à contribuição de outros, mas com a convicção firme que o problema que defrontamos não se compadece com hesitações, falta de vontade política, ou pregação do derrotismo. As iniciativas do PCP abordam um vasto conjunto de matérias incluindo a prevenção primária, redução de danos, tratamento e reinserção social, enquadramento legal do consumo e combate ao tráfico de droga e branqueamento de capitais. São as seguintes: 1. Um projecto de lei sobre a definição dos princípios gerais da prevenção primária da toxicodependência e a aprovação de medidas de intervenção em situações de risco e de reinserção social e laboral de toxicodependentes em recuperação, de cujas orientações destacamos: A adopção de medidas para a generalização, aprofundamento e reforço da prevenção em meio escolar em particular nas escolas do 2º e 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário. A superação da quase completa ausência de formação em áreas relacionadas com a toxicodependência no ensino superior preconizando-se a inclusão de formação específica em matéria de toxicodependência na definição dos conteúdos curriculares dos cursos superiores, nomeadamente de medicina, enfermagem, psicologia, ciências sociais e de formação para a docência. A determinação das áreas, bairros, situações ou grupos de risco de expansão epidémica da dependência de drogas, medida da maior importância para dar eficácia à prevenção primária da toxicodependência. A criação de um dispositivo nacional de centros de apoio em situações de risco confirmado de expansão da toxicodependência, baseado em centros de apoio fixos ou móveis. Medida de grande actualidade e urgência, dado que certas áreas e bairros se têm vindo a transformar em hipermercados de droga, e em autênticos guetos onde toxicodependentes se vão aglomerando em condições infra-humanas, numa situação que exige medidas de excepção no plano da assistência, do apoio social e médico-sanitário, de redução de danos, sempre com o objectivo de encaminhamento para soluções de tratamento e recuperação. 2. Um projecto de lei de alargamento da rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção social de toxicodependentes. Apesar da expansão verificada no seguimento de iniciativas do PCP, é notório que a rede pública continua a ser insuficiente, particularmente nas zonas mais populosas, onde continua a haver um elevado tempo de espera para acesso às primeiras consultas, e nas comunidades terapêuticas, contando a rede pública apenas o número irrisório de 34 camas. Com este projecto de lei o PCP pretende alargar o conceito de "rede" por forma a abranger também os Centros de Dia e os Apartamentos de Reinserção. Partindo da actual dimensão da rede, propõem-se como objectivos imediatos, a eliminação das listas de espera para as primeiras consultas nos CAT, a criação de um dispositivo de comunidades terapêuticas que assegure capacidade mínima de resposta pública com serviços de referência e a criação de centros de dia no âmbito de cada Direcção Regional do SPTT. 3. Dois projectos de lei que despenalizam o consumo de drogas e estabelecem o regime de mera ordenação social aplicável ao seu enquadramento. O PCP considera que as estratégias a adoptar devem sempre ter como objectivo evitar que mais pessoas caiam na dependência das drogas e dar oportunidade de tratamento e reinserção social aos toxicodependentes. Isto impõe simultaneamente a abordagem de três aspectos: uma atitude de firme combate ao tráfico que dirigindo-se prioritariamente às redes dos grandes traficantes, inclua necessariamente disposições legais que permitam a pressão sobre o pequeno tráfico; a avaliação do consumo como nocivo, dando os sinais correspondentes sobre este comportamento de risco e o apoio necessário, tanto mais que é impossível determinar quando é que um dado indivíduo termina o consumo ocasional e começa uma relação de dependência (física ou psicológica); a consideração dos toxicodependentes como doentes que precisam de ajuda e tratamento. As propostas que o PCP agora apresenta nesta matéria, demarcam-se quer da actual legislação que tende a criminalizar o toxicodependente, prevendo mesmo penas de prisão que se aplicadas só prejudicariam o caminho da sua recuperação, quer das posições que não se diferenciam do apelo ao consumo de drogas que contribuiria para uma efectiva expansão da toxicodependência. É neste quadro que, mantendo para o tráfico a moldura penal actual, o PCP propõe que o consumo e a detenção de substâncias para consumo, que na actual lei da droga são actos penalizados com multa e prisão até um ano, sejam despenalizados, saiam do âmbito dos tribunais e passem a ser considerados como mero ilícito de ordenação social tratado no âmbito de uma entidade administrativa. A aplicação de coimas constitui a forma de sanção normal no regime do ilícito de mera ordenação social, no entanto, no caso concreto do consumo de droga, entende o PCP que tal medida se afigura desajustada, propondo assim outras normas: como regra a advertência com chamada de atenção para as consequências perniciosas do consumo de drogas e de aconselhamento no sentido da aceitação de tratamento que se revele necessário, associada ou não a outras medidas que estão também apontadas no projecto de lei. O PCP propõe como entidade administrativa para o contacto com os consumidores no âmbito dos processos de ilícito de ordenação social, o Instituto Português das Drogas e da Toxicodependência (IPDT), para vincar as características de prevenção, ajuda e acompanhamento deste contacto. No quadro deste Instituto terão que ser criados serviços específicos, com cobertura do conjunto do território nacional e equipas polivalentes dotadas de formação técnica adequada. O programa eleitoral do PCP defende: "A consideração no quadro legal que o toxicodependente é um doente, que não deve ser criminalizado, e que por isso se justifica a despenalização do consumo de droga. Continua no entanto a considerar-se que, fora do âmbito penal, a legislação deve estabelecer normas que apontem para a defesa do bem que é a saúde dos indivíduos e que alertem para o desvalor que constitui a dependência das drogas. Considera-se que o Estado não deve desresponsabilizar-se, e que a entidade que vier a estabelecer o contacto com os consumidores deve ter um papel de ajuda, encaminhamento e acompanhamento de acordo com cada situação pessoal". A solução agora preconizada concretiza estes objectivos de dissuadir do consumo de drogas e sobretudo de encaminhar os toxicodependentes para soluções de tratamento e reinserção social. 4. O PCP apresenta ainda dois projectos de lei instituindo o Programa Nacional de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e aperfeiçoando as disposições legais destinadas a prevenir e punir o branqueamento de capitais provenientes de actividades criminosas. Trata-se de uma das formas mais eficazes de atacar o tráfico de drogas e outras actividades criminosas pois atinge os seus autores naquilo que mais lhes dói, nos seus lucros e patrimónios ilícitos, reduzindo e liquidando o poder económico dos indivíduos e das organizações criminosas. No nosso país têm-se vindo a aperfeiçoar os mecanismos legais, mas os resultados até agora são mínimos e há a consciência que defrontamos graves problemas nesta matéria. O PCP entende que faz falta em Portugal uma estrutura com competência de análise e intervenção integrada à semelhança do Programa Mundial da ONU Contra o Branqueamento de Capitais e do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI) e para suprir esta insuficiência propõe a instituição de um Programa Nacional com o objectivo de prevenir e combater o branqueamento de capitais, a criminalização da economia e a criminalidade organizada e propõe também a criação de uma Comissão Nacional que lhe dê concretização. São assim criadas condições para coordenação das entidades de supervisão e controlo com intervenção na prevenção e combate ao branqueamento, essencial para um salto qualitativo na avaliação e eficácia de intervenção. Ao mesmo tempo o PCP propõe um conjunto de alterações de aperfeiçoamento da legislação existente nesta matéria nomeadamente: aplicação do regime penal previsto para as associações criminosas, não apenas às que se dediquem ao tráfico de droga e de percursores, mas também às que se dediquem ao branqueamento de capitais provenientes dessas práticas; alargamento da criminalização do branqueamento, a capitais oriundos de novos tipos de crime; afastamento do segredo bancário e fiscal; alargamento do prazo de suspensão de operações bancárias suspeitas; extensão dos deveres de comunicação e notificação, além das entidades já cobertas, nomeadamente as financeiras, a outras entidades que intervenham na contabilidade, auditoria financeira, transporte de bens e valores ou como intermediárias de negócios que envolvam montantes financeiros elevados e obrigação de identificação e conservação de registos nas transacções à distância. * São estas as iniciativas legislativas que o PCP vai apresentar, um conjunto integrado, articulado e coerente de projectos que tocam aspectos essenciais da estratégia de luta contra a droga que é preciso com coerência, determinação e vontade política levar à prática para enfrentar e fazer recuar a toxicodependência.