"Os saaráuis exigem decidir o proprio destino"

23 Maio 2013
Quando se assinalam os 40 anos da fundação da Frente Polisário, Ahamed Fal, representante da organização em Portugal, sublinhou ao Avante! que o povo saaráui continua unido e determinado na defesa do direito à autodeterminação e no propósito de construir uma pátria livre e soberana.

Que balanço faz a Polisário destas quatro décadas de luta, e que desafios enfrenta?
Um balanço muito positivo do ponto de vista político e diplomático. Desde logo porque somos unanimemente reconhecidos como a única força legítima representante dos interesses dos saaráuis. Depois, porque na sequência da luta travada pela independência e contra a ocupação marroquina, o nosso povo criou a República Árabe Saaráui Democrática, que hoje é reconhecida por mais de 80 países, tem representações em quase todos os continentes e é membro-fundador da União Africana.
Permanecem desafios e dificuldades, evidentemente, relacionados com a ocupação ilegal por parte de Marrocos da maior parte do nosso território, com a repressão, perseguição, marginalização e discriminação brutais do nosso povo nos territórios ocupados, situações inadmissíveis que devem ser denunciadas e amplamente repudiadas.
O mandato da Missão das Nações Unidas para o Referendo no Saará Ocidental (Minurso) foi recentemente prolongado, mas permanece sem competência para monitorizar essas violações dos direitos humanos, não é verdade?
Foi até por proposta da actual administração norte-americana que o Conselho de Segurança das Nações Unidas ponderou dotar a Minurso de competência para vigiar o cumprimento dos direitos humanos nos territórios ocupados. O mandato acabou por ser prolongado por mais um ano sem essa faculdade devido à oposição da França, o que é lamentável, até porque a Minurso é a única missão da ONU que não têm essa competência atribuída.

Fica o facto dos EUA terem apresentado a proposta em resultado da enorme pressão exercida por várias organizações de defesa dos direitos humanos, as mais conhecidas das quais são a Humans Rights Watch e a Amnistia Internacional, bem como fruto das denúncias permanentes de dezenas de organizações e grupos solidários com o Saara Ocidental.

Ainda nos primeiros dias de Maio há registo da repressão dos protestos nos territórios ocupados...
Sim, nas manifestações populares em El-Aiún, Smara, Bojador e noutras cidades dos territórios ocupados. Não obstante, a Minurso permanece com as mesmas competências que tem desde 1991: zelar pelo cumprimento do cessar-fogo entre a Frente Polisário e Marrocos, subscrito após 16 anos de luta armada.

O que se passa hoje nos territórios ocupados é muito mais facilmente divulgado devido aos modernos instrumentos de comunicação. Marrocos já não monopoliza a informação, nem consegue, como antes, impor o bloqueio. Isso leva à ampliação da solidariedade para com a causa saaráui e para com a situação nos territórios ocupados, bem como à constatação da justeza da nossa luta.

As forças progressistas e democráticas de todo o mundo não podem ficar indiferentes à liquidação física do nosso povo.
Confiança inabalável
Em que ponto estão as conversações com Marrocos?

Estão paralisadas porque, usando de falsos argumentos, Marrocos considerou o representante especial do secretário-geral da ONU, Christopher Ross, inapto para dirigir as negociações. Dizem que é defensor dos direitos do Saará Ocidental.
O que é que defende a Polisário para esse diálogo?

Defende o cumprimento do plano de paz, no âmbito do qual é reconhecido o direito do povo saaráui a pronunciar-se livremente sobre se pretende a independência, a autonomia ou a integração total em Marrocos. Marrocos não quer dar essa oportunidade e tudo faz para o impedir.
Quer impor a política do facto consumado. Quer que seja reconhecida internacionalmente a ilegal ocupação do Saará Ocidental e o território como seu, «oferecendo» em contrapartida uma autonomia limitada.
Nós exigimos um processo de consulta popular. Exigimos que, democraticamente, seja o povo saaráui a decidir o próprio destino.

Qual é a situação nos acampamentos de refugiados?

Grande parte do povo Saaráui encontra-se desde 1975 nos acampamentos no Sul da Argélia. É uma situação muito difícil do ponto de vista humanitário. É extremamente duro sobreviver num deserto, num território inóspito. Neste momento, a ajuda internacional e solidária, da qual depende quase totalmente a população, reduziu-se em cerca de 70 por cento devido à crise económica global. Mas resistimos durante estes 36 anos, e nos acampamentos, nos territórios ocupados ou no exílio, a esmagadora maioria do saaráuis estão determinados em continuar a luta por uma pátria livre e soberana.

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