Projecto de Lei N.º 505/XIII/2ª

Relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário

Relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário

(Exposição de Motivos)

Mais de uma centena de trabalhadores motoristas que conduzem autocarros de passageiros intentaram ações judiciais pedindo que as empresas fossem condenadas a pagar-lhes determinados valores relativos ao não cumprimento do descanso compensatório pela realização de trabalho suplementar.
Nesses processos, as empresas usaram o argumento de que alguns períodos de trabalho suplementar não deveriam contar para o direito ao descanso compensatório, entendendo tais períodos como “tempo de disponibilidade” devido à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho.

Todavia, o Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva n.º 2002/15 CE … com incidência na organização do tempo de trabalho dos motoristas afetos à atividade de transporte rodoviário, não regula a concessão de descanso compensatório por trabalho suplementar prestado, pelo que não afasta as disposições do Código do Trabalho ou dos instrumentos de regulamentação coletiva em vigor.
Nos processos judiciais interpostos, várias decisões judiciais consideraram justamente a inaplicabilidade do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho aos transportes rodoviários de passageiros.

Veja-se o caso do Processo n.º 590/13.8TTSTR, julgado no Tribunal Judicial de Santarém, que considera justamente que a Diretiva n.º 2002/15 CE e o Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, que procede á sua transposição, dizem respeito à segurança rodoviária e à concorrência, não substituindo as disposições do Código do Trabalho relativas ao descanso compensatório.

Como consta da respetiva decisão, “(…) a fim de salvaguardar a segurança rodoviária e a concorrência, estabelecem-se definições dos tempos de trabalho, repouso, pausa e disponibilidade e a fim de salvaguardar a segurança e saúde dos trabalhadores, estabelece-se um limite máximo para o número de horas de trabalho semanal. Daqui nada se retira relativamente aos descansos compensatórios e circunstâncias em que devem ser concedidos, da mesma forma que não se retiram normas relativas às férias ou faltas dos motoristas.”

E prossegue: “O único propósito possível do estabelecimento de tais normas é o de explicar que, durante o tempo de disponibilidade, o motorista não esteve a conduzir, nem a efetuar outras tarefas cujo desgaste coloque em causa a segurança rodoviária, o que terá relevância para o tempo em que se considera admissível que o motorista venha a conduzir posteriormente. Ou seja, nada tem que ver com os descansos compensatórios.

Assim, as definições e regras em causa neste Decreto-Lei são relevantes para efeitos de segurança rodoviária e concorrência e, apenas nesta medida, prevalecerão sobre as disposições correspondentes ao Código do Trabalho, mas já não para os demais efeitos relacionados com a prestação de trabalho, dada a inexistência de correspondência entre as normas deste diploma e as do Código do Trabalho, por neste diploma não se regular a matéria dos descansos compensatórios.”

Esta jurisprudência não é, porém, unânime, havendo decisões judiciais que afastam a aplicação do regime de descanso compensatório vigente para os motoristas de transporte de passageiros sustentando a aplicabilidade, a esses casos, o regime do tempo de disponibilidade em prejuízo do descanso compensatório.

Importa, pois, deixar claro, por via legislativa, que o Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, não afasta a aplicação do regime de descanso compensatório previsto no Código do Trabalho ou em instrumento de regulamentação coletiva para os motoristas das empresas de transportes coletivos de passageiros.
Nestes termos e ao abrigo da alínea b), do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto

Com vista à proteção dos trabalhadores relativamente ao tempo de disponibilidade para o trabalho, é aditado ao artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 237/2007 de 19 de Junho, que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2002/15/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem atividades móveis de transporte rodoviário, um novo n.º 4, com a seguinte redação:

«Artigo 1.º

1 – […].
2 – […].
3 – […]
4 – O presente Decreto-Lei não é aplicável aos motoristas de transportes públicos de passageiros que conduzam veículos com mais de 9 lugares, incluindo o do condutor, construídos ou adaptados de forma permanente para o efeito e que utilizem tacógrafos, aos quais se aplica o regime previsto no Código do Trabalho ou em Instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável.»

Artigo 2.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no 5.º dia após a sua publicação.

Assembleia da República, 17 de abril de 2017

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