Projecto de Resolução N.º 1418/XII/4.ª

Reforça os meios da Autoridade para as Condições do Trabalho e cria um Plano Nacional de Combate às Discriminações em função da Maternidade e Paternidade

Reforça os meios da Autoridade para as Condições do Trabalho e cria um Plano Nacional de Combate às Discriminações em função da Maternidade e Paternidade

Exposição de Motivos

I

Ao longo dos últimos meses têm sido públicas e notórias diferentes informações, muitas retratadas na comunicação social, que dão conta de sucessivas e reiteradas violações dos direitos de maternidade e paternidade dos trabalhadores no nosso país.

Na verdade, existe hoje no nosso país uma grande distância entre os direitos consagrados na lei e a sua efetiva concretização, cumprimento e exercício pelos trabalhadores.

A comunicação social e inúmeras informações que chegam ao PCP dão conta da existência de diversos abusos e violações da lei. Existem empresas, nomeadamente grandes grupos económicos, que aquando da entrevista para a contratação de uma nova trabalhadora a questionam sobre a sua intenção de engravidar, com o claro intuito de condicionar a sua decisão de maternidade. Existem situações em que as empresas, quando confrontadas com o exercício dos direitos de maternidade pressionam as trabalhadoras para não gozarem os seus direitos, ou mesmo para reduzir o tempo da licença de maternidade e paternidade.

Há empresas que usam ameaças, mais ou menos explicitas, quanto à progressão na carreira para condicionar a maternidade e o exercício dos direitos de maternidade das trabalhadoras. Persistem por parte das entidades patronais pressões diretas e indiretas às mulheres em sede de entrevistas de emprego, questionando a existência de filhos e a sua idade, por forma a condicionar a decisão das mulheres e a optar por trabalhadores sem filhos e com “maior disponibilidade”; bem como despedimentos ilegais de mulheres grávidas, puérperas e lactantes.

Para além disto, persistem também situações de jovens que são discriminadas no acesso ao primeiro emprego porque decidiram engravidar; crescentes pressões económicas e laborais para as trabalhadoras não gozarem a licença de maternidade na totalidade e redução do horário para aleitamento e amamentação; e trabalhadoras em situação precária a quem não é reconhecido o direito à licença de maternidade.

A realidade é marcada pela violação dos direitos de maternidade mas também dos direitos de paternidade. Em Portugal, há ainda um grande caminho a percorrer quanto à efetivação dos direitos de paternidade. Desde logo, no plano laboral, cultural e social onde se perpetuam preconceitos e estereótipos que importa combater, desde logo quando as entidades patronais exercem pressões diretas e indiretas para impedir o exercício dos seus direitos.

A tudo isto, há que somar a degradação das condições de trabalho e de articulação entre a vida familiar e pessoal com a vida profissional, nomeadamente quanto à generalização da utilização dos bancos de horas e das adaptabilidades, que dificultam o exercício dos direitos de maternidade e paternidade.

O número de processos que deu entrada na Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) aumentou relativamente a anos anteriores, designadamente na rúbrica “conciliação da vida familiar e profissional”. Contudo, a violação dos direitos de maternidade e paternidade por parte das entidades patronais é seguramente uma realidade bem mais grave do que aquela que é possível identificar a partir das queixas à CITE e do respetivo tratamento estatístico dos dados.

O PCP entende que o desrespeito e a violação da lei são inaceitáveis e impõe-se uma efetiva fiscalização e punição por parte da Autoridade para as Condições do Trabalho (ATC) às entidades patronais que violam a lei, para que os direitos de maternidade e paternidade sejam efetivamente exercidos pelos trabalhadores do nosso país.

De facto, o atual quadro legal reconhece a formalidade dos direitos de maternidade e paternidade, mas não concretiza nem cria os mecanismos necessários para o seu cumprimento, nomeadamente através do reforço dos meios inspetivos e dissuasores do seu desrespeito e incumprimento.

Assim, o PCP vem com o presente Projeto de Resolução recomendar ao Governo que reforce os meios materiais e humanos na ACT para que esta, entre outros direitos e suas violações, fiscalize de uma forma mais eficaz as violações dos direitos de maternidade e paternidade punindo quem atropela esses direitos, condicionando desta forma aquilo que deveria ser uma livre opção de maternidade e paternidade.

O Governo PSD/CDS tem procurado paralisar a atividade da ACT, numa primeira fase, através do expurgo das suas competências, aprofundada na revisão do Código do Trabalho de 2012, isentando os empregadores do cumprimento de obrigações de comunicação à ACT, como é o caso das entidades empregadoras deixaram de estar obrigadas a enviar o regulamento interno da empresa, a comunicar os elementos relativos à empresa antes do início de atividade, a comunicar o mapa de horário de trabalho, bem como de enviar o acordo de isenção de horário de trabalho e comunicar a existência do seguro de acidentes de trabalho. Numa segunda fase, o Governo tenta paralisar a ACT através do esvaziamento dos seus meios, quer humanos, quer técnicos e financeiros. A paralisação da atividade inspetiva e sancionatória é tanto mais útil ao Governo e aos empregadores quando estes têm procurado, até ao limite e a todo o custo, degradar as condições e relações de trabalho.

Em termos de meios humanos, e em relação aos inspetores do trabalho, tem-se verificado uma diminuição progressiva desde 2011, sobretudo devido à não substituição de trabalhadores que se aposentaram. Em Abril de 2014 o Inspetor Geral da ACT afirmou que estavam ao serviço 322 inspetores e que no final desse ano seriam apenas 300. De acordo com os rácios da OIT, deveriam estar ao serviço 500 inspetores. Na verdade, desde há vários anos que o PCP tem vindo a denunciar a falta de inspetores e de outros profissionais da ACT imprescindíveis para o desenvolvimento da respetiva ação inspetiva e punitiva. A falta de meios tem implicações diretas na menor capacidade de fiscalização dos locais de trabalho e por consequência, menor capacidade de punição das entidades patronais que violam os direitos de maternidade e paternidade. Apesar dos sucessivos alertas e propostas do PCP a situação não tem tido resolução, o que transforma sucessivos governos em responsáveis diretos e indiretos pela violação de direitos fundamentais e pela impunidade de entidades patronais que de forma chocante violam a lei.

II

O Governo PSD/CDS tem vindo a expressar dissimuladas preocupações com a redução da natalidade visando ocultar a responsabilidade direta e indireta que tem no desrespeito pela função social da maternidade e paternidade e no incumprimento dos direitos que lhe estão inerentes.

É neste contexto que surge a demagogia do Governo em torno da «natalidade», assente em conceções retrógradas de responsabilização individual das mulheres e das famílias pela renovação das gerações e na desresponsabilização do Estado, das entidades patronais e de toda a sociedade para com a função social da maternidade e da paternidade.

Os tempos que vivemos de baixa natalidade são inseparáveis dos impactos das políticas de direita que promovem a emigração, o desemprego, a precariedade da vida, o desrespeito e violação dos direitos de maternidade e paternidade nos locais de trabalho, os baixos salários, a desregulamentação e o aumento do horário de trabalho, os custos exorbitantes com a habitação, o custo dos bens e serviços essenciais, a falta de equipamentos de apoio à infância a custos acessíveis.

Para o PCP é urgente criar empregos com direitos e pôr fim à precariedade e à instabilidade; valorizar os salários e repor os salários cortados; organizar o tempo de trabalho, de forma a permitir a articulação entre a vida profissional e a vida familiar; reforçar os direitos de maternidade e de paternidade e uma fiscalização efetiva do cumprimento dos direitos consagrados; alargar as prestações sociais, em particular o abono de família; uma política fiscal que desonere as famílias; a criação de uma rede pública de creches; reforçar os cuidados de saúde primários e cuidados hospitalares, garantindo os direitos sexuais e reprodutivos, o planeamento familiar, a saúde materno-infantil e o reforço na área da infertilidade; o acesso à habitação a custos acessíveis.

Nestes termos e ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1 - Elaboração através da ACT e da CITE de um Plano Nacional de Combate às Discriminações em função da maternidade e paternidade a implementar no âmbito da ação inspetiva e punitiva;
2 - Definição de uma orientação política específica no sentido da ACT fiscalizar e punir de forma eficaz as violações dos direitos de maternidade e paternidade;
3 - Contratação efetiva, através de vínculo público, de todos os inspetores necessários, por forma a cumprir os rácios definidos pela Organização Internacional de Trabalho.

Assembleia da República, em 10 de abril de 2015

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