Projecto de Resolução N.º 922/XIII/2

Recomenda ao Governo o reforço dos laboratórios de Estado dos ministérios da agricultura e do mar

Recomenda ao Governo o reforço dos laboratórios de Estado dos ministérios da agricultura e do mar

O conjunto de Laboratórios do Estado na dependência dos ministérios da agricultura e do mar, integrados no Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) e no Instituto Português do Mar a e da Atmosfera (IPMA), constituem uma importante rede de estruturas de apoio à atividade produtiva, à investigação e à salvaguarda da saúde pública e da segurança alimentar.

A sua importância está bem patente no contributo para o cumprimento dos planos de sanidade animal e fitossanidade que o país deve observar por razões de segurança alimentar, mas também como importantes instrumentos de garantia da qualidade dos produtos pecuários e de pesca portugueses, garantindo a qualidade dos produtos transacionados e logo salvaguardando as transações económicas, nomeadamente com outros Estados, a par do controlo das condições sanitárias dos produtos importados, quer da União Europeia, quer de países terceiros.

Infelizmente o país conhece as implicações económicas do encerramento das suas fronteiras à exportação de animais, de hortofrutícolas e de madeira de pinho, por razão de surtos de pragas e doenças animais ou vegetais. Não há, por isso, dúvida quando à importância dos serviços que os Laboratórios de Estado prestam, quer diretamente, quer como infraestruturas imprescindíveis à intervenção de outros agentes do Estado.

Refira-se ainda o seu papel insubstituível como Laboratórios de Referência, avaliando e garantindo a fiabilidade dos laboratórios privados do sector.

Têm também uma importante componente de investigação, de avaliação dos solos e da água, de acompanhamento das questões de fitossanidade e sanidade animal, enquanto repositório de conhecimento fundamental e no plano da sua aplicação. Nesta sua vertente têm uma relação muito estreita com as matérias de soberania, ao terem à sua guarda o património genético, correspondente, no caso do germoplasma vegetal, a mais de 90% do material genético das espécies utilizadas para a alimentação, mas também importante no património genético animal. Para além de uma importante componente de trabalho no melhoramento e adaptação de espécies, num trabalho concreto de incremento na rentabilidade das espécies agrícolas e pecuárias.

Nos últimos anos, o subfinanciamento a que foram sujeitos estes laboratórios, através da redução dos orçamentos, põe em risco a sua atividade, viabilidade e futuro. Paralelamente sabe-se que verbas avultadas são gastas em laboratórios estrangeiros para executar análises que podiam ser feitas cá, como foi confirmado, em resposta a pergunta do Grupo Parlamentar do PCP.

Na vigência do anterior governo, a mais expressiva manifestação de preocupação sobre esta situação de desinvestimento surgiu de um grupo de investigadores, académicos e técnicos superiores, com carreiras dedicadas à investigação e aos laboratórios, que alertaram para a degradação destas estruturas: “Durante os últimos anos, vimos assistindo com preocupação à degradação da vida destas instituições, com reflexos numa enorme diminuição das suas valências científicas, tendo já conduzido ao desaparecimento total de muitas delas, e sem haver quaisquer alternativas no tecido científico português. São laboratórios que fecham, terminando uma profícua atividade de décadas. São coleções de material biológico, únicas em Portugal e em todo o Mundo, que se perdem. São vastíssimos investimentos patrimoniais, de diversificado âmbito, como sejam laboratórios, estruturas fundiárias, edifícios, bibliotecas ou outros, que estão em risco de perda total.”

O anterior governo levou a cabo aquilo que chamou de reorganização da rede de laboratórios existente, que pouco mais foi que encerramentos, como sucedeu em Mirandela, Alcains/Castelo Branco e Guarda, sem qualquer estratégia para a sua reestruturação, e não avisando sequer os agricultores, habituais utentes, dessas estruturas. O mesmo foi tentado com estações agronómicas/centros operacionais tecnológicos, como a Estação Nacional de Fruticultura de Vieira da Natividade/Alcobaça, que o governo pretendeu encerrar ou desarticular do ministério da agricultura.

Os problemas que o país enfrenta no âmbito da sanidade animal, da fitossanidade e da segurança alimentar exigiam, ao contrário do que tem acontecido, o reforço da rede laboratorial, a proximidade com os agricultores e o incremento da sua capacidade de intervenção. Ao invés de suprir estas necessidades, o anterior governo decidiu reduzir a sua capacidade de intervenção em matérias que se prendem com a nossa soberania e a saúde pública.

Os casos recorrentes em torno de suspeitas em matéria de segurança alimentar, denunciam a incapacidade de os mecanismos de controlo europeus detetarem e controlarem o problema e confirmam a necessidade e a importância para o país de uma rede laboratorial de apoio à implementação dos planos sanitários.

As mesmas opções políticas de diferentes governos levaram ao desmantelamento das estruturas da administração central, em processos ditos de reestruturação e reorganização, que no geral mais não visaram que reduzir os recursos humanos, o que tem tido implicações na organização e funcionamento de serviços públicos centrais, regionais e locais, com profundas implicações em setores concretos de atividade.

A partir da criação do Sistema de Mobilidade Especial (SME), o ministério da agricultura promoveu um corte drástico no número de técnicos e de meios afetos ao apoio à agricultura e aos agricultores, que se prolongou no tempo. Numa fase inicial terão sido 1445 técnicos a serem colocados nesse regime.

O anterior governo PSD/CDS deu total continuidade a essa política de redução drástica de recursos humanos.

Só entre 2010 e 2013 as Direções Regionais da Agricultura e Pescas tiveram uma redução em pessoal na ordem dos 10% e no total do ministério foram quase 600 trabalhadores colocados no Sistema de Mobilidade Especial. Entre o início deste sistema, em 2007 e 2013, o ministério transferiu para o SME 2152 trabalhadores.

Esta opção política teve de imediato como primeira, mas muito visível e inapagável, consequência – os arranques dramáticos dos dois quadros comunitários de apoio que se iniciaram em 2007 e 2014. Menos técnicos a avaliar, a fiscalizar, a verificar no terreno, contribuiu para dificultar as decisivas fases iniciais.

No âmbito do PDR 2020 e apesar dos anúncios de uma transição suave entre quadros, as queixas dos agricultores acumulam-se quanto a atrasos graves na análise, contratação e pedidos de pagamento. Ainda há dois meses nas candidaturas de jovens agricultores, menos de metade tinham chegado à fase de contratação e no caso do investimento na agricultura esse número rondava os 37%.

É, pois, evidente que para o correto apoio aos setores produtivos em função de uma estratégia nacional, o país tem de manter uma rede de estruturas de apoio à monotorização e investigação que seja o garante de qualidade, salvaguardando a atividade económica e a saúde pública, e capazes de apoiar a atividade agropecuária e florestal, para além da sua função de salvaguarda e preservação do conhecimento. A soberania do país está intimamente ligada à sua capacidade de investigação, monitorização e acompanhamento dos processos produtivos.

Nestes termos, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:

1. Reforce a capacidade do INIAV e do IPMA para manutenção e desenvolvimento da capacidade de intervenção e das funções de Laboratórios de Estado, assegurando inclusive as suas funções de laboratórios nacionais de referência, de modo a que estes garantam o apoio às atividades produtivas, a salvaguarda da saúde pública, a produção de conhecimento e a proteção dos recursos biológicos e genéticos à sua guarda;

2. Avalie os processos de encerramento de estações/centros de tecnologia e laboratórios, nomeadamente os encerrados pelo anterior governo, com vista à consolidação de uma rede nacional de estruturas públicas de investigação e apoio ao desenvolvimento;

3. Realize uma Conferência Nacional com intervenção dos atuais investigadores e pessoal técnico da rede de laboratórios, as associações agrícolas, núcleos agrários das universidades portuguesas, para uma reflexão que ajude a estabelecer uma adequada rede de laboratórios e estações agronómicas, de apoio técnico e de transferência de tecnologia;

Assembleia da República, de 9 junho de 2017

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