Projecto de Resolução N.º 982/XIII/2ª

Reabilitação dos agrupamentos habitacionais designados por ILHAS na Cidade do Porto

Reabilitação dos agrupamentos habitacionais designados por ILHAS na Cidade do Porto

A questão da habitação nos principais núcleos urbanos do nosso país ganhou maior acuidade em meados do século XIX, com a revolução industrial e chegada de migrantes vindos do campo e a necessidade de os alojar nos já ocupados núcleos urbanos. Os novos moradores começaram por alojar-se nos bairros medievais, os mais degradados e insalubres, conduzindo à sobreocupação destes.

Face a esta sobreocupação dos bairros medievais a burguesia, ligada ao nascente capital industrial, procedeu, de acordo com incipientes normas urbanísticas, à criação de novas formas de alojamento destinado ao proletariado, em casas de reduzidíssima dimensão e normalmente sem ultrapassar os dois pisos. Nasceram, assim, os “Pateos” e “Vilas”, na cidade de Lisboa e as “Ilhas”, na cidade do Porto.

No final do século XIX, contavam-se 50.000 habitantes nas “Ilhas” do Porto e 30.000 nos “Pateos” e “Vilas” de Lisboa.

Hoje, apesar do desenvolvimento de algumas ações de realojamento, a cidade do Porto continua a mostrar a existência de cerca de 900 “Ilhas”. E, se é verdade que várias quase já não tenham habitantes não é menos verdade que muitas estejam novamente habitadas por famílias diferentes das originais, incluindo algumas que perderam as suas habitações por incumprimento de empréstimos bancários.

Esta nova realidade, reocupação das “Ilhas”, é demonstrativa da carência de habitação e da especulação imobiliária, vividas na cidade do Porto. Carência e especulação que têm vindo a agravar-se e são, certamente, responsáveis pela perda de habitantes na cidade. Lembremos que o Porto perdeu, nos últimos 30 anos, um terço da sua população, ou seja mais de 110.000 habitantes.

Um estudo, relativamente recente, aponta para a existência de 957 “Ilhas”, com cerca de 8000 fogos dos quais cerca de 4900 habitados, onde viviam aproximadamente 10.400 pessoas em condições sociais, na maioria dos casos, precárias. A freguesia de Campanhã continua a ser aquela onde há maior número de aglomerados populacionais deste tipo, cerca de 240, seguindo-se as zonas do Centro Histórico, de Cedofeita, de Santo Ildefonso e Bonfim.

Nas “Ilhas”, frequentemente não há água canalizada, os esgotos são deficientes e as casas de banho são comunitárias. A maioria dos seus habitantes sofre enormes carências sociais. Esta é uma realidade que, em geral, não é visível das ruas, escondendo-se normalmente atrás de prédios, em antigos quintais ou logradouros, com uma única e estreita entrada, passando, assim, quase despercebido ao cidadão comum.

Na generalidade dos casos, as “Ilhas” são privadas, embora existam algumas de propriedade pública, designadamente municipal, de que é exemplo a Ilha da Bela Vista que está num processo de recuperação de responsabilidade camarária, embora com apoios do IRHU.

É necessário avançar rapidamente na resolução do problema habitacional do Porto, travando o êxodo da sua população, humanizando as condições de habitabilidade e impedindo a espiral de especulação imobiliária neste momento dominante. Neste quadro de resolução, a requalificação das “Ilhas” e, inclusive, a possibilidade de reutilização do tecido urbano que ocupam para operações de realojamento ou de arrendamento a preços não especulativos, coloca-se como urgente. É que, se nada for feito, será a especulação imobiliária a apoderar-se das “Ilhas”, a expulsar aqueles que ainda lá habitam e a impedir o retorno à cidade de muitos dos que esperam por arrendamento em bairros sociais municipais.

Impõe-se pois criar um programa de recuperação e reabilitação das “Ilhas”, com apoios múltiplos, e em condições que garantam melhor qualidade de vida às pessoas que ali residem e permitam a instalação de novos moradores.

Pelo exposto, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, propõem a adoção da seguinte resolução:

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomenda ao Governo que:

1- Considere a urgente necessidade de proceder à requalificação das “Ilhas” da cidade do Porto, garantindo as necessárias condições de habitabilidade e salubridade e permitindo a utilização de espaços hoje totalmente degradados para a realização de realojamentos e, ou, arrendamentos por valores acessíveis;

2 – Proceda, de forma a protocolar com o município do Porto, ao levantamento da situação atual das “Ilhas” existentes, das famílias que as ocupam, das condições de segurança estrutural, de habitabilidade e de salubridade dos fogos ocupados;

3 – Proceda, de forma a protocolar com o município do Porto e com os proprietários, ao estudo de reabilitação urbanística das “Ilhas”, prevendo a renovação de fogos agora em condições inabitáveis ou de grande carência de equipamentos e a sua utilização no regime de renda apoiada, sendo propriedade municipal, ou de renda acessível, sendo propriedade privada, prevendo-se ainda a instalação de espaços e serviços de apoio à população, tais como lavandaria, salas de convívio e outros;

4– Garanta aos atuais inquilinos e seus descendentes diretos a permanência nas habitações;

5 – Garanta, em todo o processo, a audição e participação dos moradores;

6- Garanta o financiamento pelo Estado, de modo a concretizar as medidas para a reabilitação das “Ilhas” e para assegurar o direito à habitação e à proteção social das famílias que nelas habitam, usando como forma de financiamento, no que aos proprietários privados diz respeito, o respeito pelos programas e fundos de reabilitação urbana nas situações que se mostrem mais vantajosas;

7 – Crie uma equipa permanente de acompanhamento da “Reabilitação das Ilhas do Porto”, integrando membros do IHRU, da Segurança Social, do Município do Porto, das respetivas Freguesias e dos Moradores que deverá apresentar, anualmente, um relatório à Assembleia da República e aos órgãos autárquicos envolvidos.

Palácio de São Bento, 12 de julho de 2017

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