&quot;Serviços públicos e direitos humanos&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Estará em debate na sessão plenária do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, na próxima terça-feira, 13 de Janeiro, o relatório Herzog relativo ao “Livro Verde sobre os Serviços de Interesse Geral (SIG)”. Será um momento importante para a luta que desenvolvemos na defesa dos serviços públicos a nível da União Europeia, tanto mais que, na Comissão Económica e Monetária do Parlamento Europeu, a proposta inicial foi bastante adulterada e foram rejeitadas as principais posições que defendemos. Voltaremos a defendê-las no debate em plenário e na votação que se seguirá, durante a próxima semana, designadamente: - Defesa de uma avaliação democrática e pluralista do impacto do mercado e da concorrência sobre os serviços públicos, tendo em conta a necessidade de serviços públicos de qualidade e as consequências negativas das liberalizações e privatizações já realizadas em diversas áreas dos chamados serviços de interesse geral; - Defesa de princípios comuns visando a manutenção de serviços públicos de qualidade em todos os Estados-Membros da União, de serviços públicos essenciais que não devem estar sujeitos à lei da concorrência, cabendo a cada Estado-Membro decidir da melhor forma da sua organização e concretização em todas as áreas dos serviços públicos e dos chamados SIG; - Reconhecimento da diversidade de fontes de financiamento dos SIG, designadamente financiamento público (comunitário e nacional), garantindo a manutenção de apoios estatais e comunitários a empresas públicas existentes nestas áreas; - Garantia do princípio da livre administração das autoridades locais e regionais para os serviços de proximidade e do direito à auto-produção. É que, apesar do reconhecimento do papel dos serviços públicos, a que chamam serviços de interesse geral, ao submetê-los às regras da concorrência desvaloriza-se o seu papel social de serviços públicos essenciais à população, ao combate à pobreza e exclusão social, à garantia dos direitos humanos, ao desenvolvimento regional das zonas carenciadas, à defesa do ambiente e à coesão económica e social. Este é um grande problema que preocupa cada vez mais camadas vastas da população, que se está a agravar com as decisões sucessivas da Comissão e do Conselho, designadamente nas Cimeiras de Lisboa e Barcelona, que têm acelerado as liberalizações e desregulamentações em numerosos sectores, com destaque para as telecomunicações, correios, energia e transportes. Felizmente, gorou-se a tentativa relativamente à liberalização dos portos, graças à luta dos trabalhadores do sector em numerosos países da União Europeia. Era mais uma peça do pacote global incluído na chamada “Estratégia de Lisboa”, que visa a aceleração do processo de liberalizações e de abertura dos mercados em diversos sectores, dos serviços postais aos serviços portuários, conduzindo não só a um ataque feroz ao sector público, como pondo em causa o próprio serviço público. Mas estão aí novas ameaças, quer quanto aos transportes ferroviários, quer relativamente ao céu único. As consequências das liberalizações começam já a ser visíveis nos sectores atingido, não apenas nos despedimentos e maior precarização do trabalho, como nos ferroviários, na energia, nos correios e nas telecomunicações, mas também, em diversos casos, nas tarifas e preços mais caros e na pior qualidade dos serviços prestados à população. Situação que está a alastrar para áreas cada vez mais vastas, designadamente em Portugal. Impõe-se, pois, reconhecer a importância de serviços públicos de qualidade para garantir o direito de acesso a todos os cidadãos, no respeito pelo princípio da subsidariedade e das especificidades de cada país, o que exige igualmente uma posição firme contra a liberalização dos serviços públicos nas negociações da OMC que a Comissão Europeia quer retomar. Ora, à partida, as directivas europeias sobre transportes ferroviários, correios, controlo aéreo e portos tinham por objectivo a abertura à concorrência, pondo em causa os chamados monopólios nacionais (empresas públicas), mas, onde avançaram, estão a constituir-se novos grupos económicos que tendem para monopólios à escala europeia, pondo em causa interesses de populações e trabalhadores que procuram resistir ao desmantelamento programado e atingindo a própria soberania dos países de economia mais débil como Portugal. Está, pois, na ordem do dia o debate sobre os desafios e o papel dos serviços públicos e a sua firme defesa.

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