&quot;Para onde vais, Lisboa?&quot;<br />António Abreu na &quot;Capital&quot;

Esta será sempre uma pergunta que os curiosos ou estudiosos farão e a que, outros, entre eles os eleitos para dela cuidarem, acrescentarão respostas mais ou menos fundamentadas, mais ou menos determinadas por ficarem com o nome associado a isto ou aquilo, para daqui, inclusivamente, fazerem agulha para outros voos políticos, se na altura de levantarem voo os controladores que importa não serem aéreos lhes derem luz verde para a rota. Nada de estranho, antes previsível da condição humana do viver nas actuais circunstâncias.Pode gostar-se de Lisboa, amá-la mesmo. Cada um faz a publicidade que entende da genica desses amplexos e da repenicagem dos ósculos bem como das promessas de fidelidade e da convicção, sentida ou não, de que ela esteja mais bonita. Nada destes sentimentos são matéria de matutanço solitário. Já não estamos em época de espelhos mágicos, até porque existem as sondagens de opinião e as campanhas de imagem, uns debates televisivos semanais e umas colunas de opinião.Ter uma idéia para a cidade, um projecto, um sonho, uma vocação nova para ela desejável, um paradigma, uma utopia, tudo é natural e aconselhável. Desde que isso não se traduza em dar, sem resultados palpáveis, muito mais trabalho aos fabricantes de estudos, de cenários ou de modelos. E tendo sempre em conta algumas questões fundamentais. A primeira é que a cidade são pessoas. Que aqui vivem e trabalham e que para elas os responsáveis públicos devem ter sempre as atenções viradas como ponto de partida, fonte permanente de inspiração e destinatários exclusivos da sua actividade. Muitas delas, vivendo muito mal, não conformadas em umas serem filhas e elas enteadas. E que tem que se acorrer a todos, mesmo com meios escassos, definição participada de prioridades ou uma palavra de conforto, não ignorando o peso dos acamados ou dos que nem querem revelar a sua pobreza. É isso que entendemos por modernidade.A segunda é que a cidade sobrevive aos brilharetes. Há uma cidade que recebemos que é a que vamos deixar, se possível com valor acrescentado, mas com a sensatez de não nos compararmos ao Marquês. Onde as marcas que pusermos devem evitar o efémero, a obra de fachada e dar prioridade à reconstrução de alicerces que permitam mais umas dezenas de anos de desgaste mas com elevação da qualidade de vida. Fazer muita festa, lançar muitos foguetes e ir apanhar as canas, pode ultrapassar os limites do aceitável para quem mantem elevado capital de queixa. A terceira é que quem mais investe na cidade são os particulares. Mas daí não decorre a máxima “o promotor é quem mais ordena”. Importa que invistam cada vez mais, com regras, em que arrecadar mais-valias traga contrapartidas públicas para as condições da cidade que é de todos. O município realiza, ou é chamado de urgência a realizar, obra directamente. Mas tem essencialmente um papel legislativo, regulador, de licenciamento. E nisso inclui-se o poder que os municipes lhe conferem de apenas aprovar projectos de acordo com características essenciais de identidade e distintivas da cidade, sistemas de vistas, relação com o rio, hábitos especulativos, tendências demográficas, equilibrios de funções, expectativas de actividades económicas, etc. Mesmo quando as receitas diminuem e os encargos aumentam, isso exige, não cedências prejudiciais mas a reconsideração, sim, da partilha de recursos entre os diferentes níveis da administração.A quarta é que a cidade já tem problemas. Não precisa de mais. E que o humano desejo de protagonismo deve concentrar-se principalmente no que é essencial, prioritário, e que, por vezes há recuos que importa fazer em nome disso e que são compreensíveis pelos municipes, evitando os excessos do ego , do alter ego e das crispações.

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