&quot;Mesquinhos e sem vergonha&quot;<br />Vítor Dias no &quot;Semanário&quot;<span class="data">

24 de Janeiro de 2003 Não chegariam duas páginas inteiras deste jornal para descrever e desmascarar razoavelmente o sofisticado folhetim de intriga e calúnia que, contra o PCP e a sua direcção, foi urdido em torno do triste falecimento de João Amaral, em resultado de mais um turvo casamento de uma estrutural má-fé com um doentio preconceito. Mas, ainda assim, alguma coisa tem de ser dita, não vá alguém pensar que ajoelhamos diante da mentira e das tentativas de intimidação. E é por isso que, entre dezenas de exemplos, temos de recordar que foi possível ver e ouvir uma jornalista da RTP assinalar na sábado, dia 11, que nenhum dirigente comunista estava na Basílica da Estrela e, logo de seguida, colher e transmitir declarações de Bernardino Soares e António Abreu, ambos membros da Comissão Política do PCP. Foi possível ver o «Expresso» (que, como outros, só nos últimos dois anos descobriu plenamente as indiscutíveis qualidades, capacidades e valor de João Amaral) publicar duas peças de particular violência contra o PCP mas numa edição onde escamoteou completamente dos leitores qualquer passagem dos comunicados do PCP ou qualquer afirmação dos seus dirigentes sobre a morte de João Amaral. Foi possível ver o director do «Público» a escrever que «apenas pelo mais hipócrita dos reflexos estalinistas» João Amaral não foi expulso e, logo de seguida, sustentar que o PCP bem o podia ter candidatado às últimas legislativas até porque já sabia que «não “incomodaria” muito mais», sem se dar conta de que, assim, estava a recomendar ao PCP, aí sim, o mais supremo e repelente exercício de hipocrisia. Foi possível ver muita gente a dar sentenças e exprimir lamentos neste domínio, mas ninguém a explicar porque é que António Reis (fundador do PS), Barros Moura (qualificado parlamentar europeu e nacional) e Duarte Lima (antigo e consistente líder parlamentar do PSD) não se sentam hoje na AR. Foi possível ver incontáveis prosas escrutinando à lupa a presença da palavra «camarada» nos comunicados do PCP e nas declarações dos seus dirigentes (sempre encontrando onde não estava e nunca encontrando onde estava), todos ignorando ou fingindo ignorar que não faltam pretéritos comunicados do PCP anunciando a morte de destacados militantes onde tal palavra não consta e todos ignorando que o Gabinete de Imprensa do PCP difunde por ano dezenas de comunicados sem que o nome do Secretário-geral e de outros dirigentes e deputados seja antecedido da palavra «camarada». E todos ignorando ou fingindo ignorar que a recusa a um uso sistemático deste tipo de referências tem como curial explicação o não impor à comunicação social e à opinião pública uma forma de tratamento que, usada em regime de «cassete», pode ser vista como demasiado «interna» ou de «família» política. E, para além da mentira da falta de condolências à família que logo foi metida envergonhadamente no bolso por causa da indesejada revelação que o PCP teve de fazer sobre uma prevista atitude da família, foi ainda possível ver a montagem da questão da falta de bandeiras do PCP a meia-haste, manifestamente «soprada» por alguns que, tendo tido no passado altas responsabilidades na direcção do PCP, passaram agora a defender uma excepção que então nunca defenderam na ocasião do desaparecimento de tantos outros seus destacados companheiros de luta. E até Eduardo Prado Coelho, noutras ocasiões tão fustigador do que chamaria os «rituais comunistas», também meteu a colher nesta questão, dando a entender que achava indispensável que Carlos Carvalhas, falando aos jornalistas à frente da Basílica da Estrela, se pusesse a discutir a questão com os repórteres das televisões, com a mais que provável consequência de estas depois só passarem isso e não passarem o que tinha para dizer e queria dizer sobre a figura de João Amaral. E tudo isto sem que Prado Coelho, que agora até está investido da qualidade de dirigente nacional do PS, nos fosse capaz de explicar ou garantir que «política» ou critérios tem o seu partido em matéria de colocação de bandeiras a meia-haste quando falecem dirigentes, deputados ou destacados militantes seus. Para terminar, só falta dizer que suspeitamos que alguns dos visados nesta crónica, como de costume, terão a suprema coragem de fazerem de conta que não leram.