&quot;Debate sobre a &quot;constituição europeia&quot;&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

É da maior importância o conhecimento dos objectivos e do conteúdo da chamada constituição europeia, o que o pressupõe a organização de debates pluralistas, onde estejam presentes não apenas aqueles que aplaudem, embora com uma ou outra crítica, mas também aqueles que rejeitam este projecto de Tratado constitucional. Como é conhecido, este documento foi aprovado pelo Conselho Europeu em Junho passado, poucos dias após as eleições para o Parlamento Europeu, depois de um processo polémico e dos trabalhos de uma Convenção presidida por Giscard d´Estaing. Em Outubro irá ser assinado pelos Chefes de Estado e de Governo e, durante os próximos dois anos, tentarão que seja ratificado pelos 25 Estados que são os membros actuais da União Europeia, com ou sem referendo, de acordo com a legislação e o interesse de cada País. Apesar de toda a demagogia que então foi vertida nos escritos jornalísticos do bloco central de interesses que apoia a dita constituição europeia, a generalidade da população portuguesa desconhece o documento, as suas principais linhas directrizes e o seu real conteúdo. Mas a verdade é que se trata, como por diversas vezes denunciámos, de uma tentativa para aprofundar a integração capitalista da União Europeia, que reforça claramente a natureza federal das instituições comunitárias e o domínio das grandes potências no projecto de tomada de decisão, incluindo o seu inadmissível primado sobre as constituições nacionais, e lança as bases institucionais da militarização, com a criação de uma Agência Europeia de Armamento, a caminho da construção de um bloco político-militar, em articulação com a Nato. É um projecto que nos merece as maiores críticas e total oposição também pela forma como tenta restringir os caminhos do futuro da Europa, ao impor o neoliberalismo como única solução, ao estabelecer o primado da concorrência como orientação básica, obrigando a lutas para defender derrogações relativamente aos serviços públicos, em vez de lhes dar toda a prioridade, como questão fundamental para garantir a concretização dos direitos humanos, a coesão económica e social e uma Europa de solidariedade. Mas agora, no debate sobre a tão pretendida "ratificação do Tratado constitucional", que se iniciou em meados de Setembro na sessão do Parlamento Europeu, através de perguntas à Comissão Europeia, os deputados do bloco central de interesses revelam que, em vez de se preocuparem com a realização de um debate frontal, claro e esclarecedor, onde se confrontem as diferentes posições políticas e seus argumentos face à proposta de Tratado constitucional, reagem de forma alarmada e receosa com a realização dos anunciados referendos nacionais. Só assim se entende que se questione a Comissão Europeia sobre a acção que tenciona adoptar no âmbito de uma estratégia de comunicação tendo em vista um resultado positivo dos processos de ratificação deste Tratado. Ou, ainda, que se questione o Conselho sobre as acções que tenciona adoptar visando definir uma abordagem comum dos Estados-Membros e, se possível, um calendário coordenado para a ratificação da "Constituição para a Europa", bem como elaborar uma estratégia de comunicação tendo em vista um resultado positivo dos seus processos de ratificação. O que, afinal, pretendem é que seja adoptada uma abordagem, um calendário e uma estratégia – mobilizando meios comunitários, incluindo os financeiros –, para que se obtenha "um resultado positivo", ou seja, a aprovação da dita constituição europeia. O que é inaceitável! Aliás, não é uma ideia original, pois já a confederação do grande patronato europeu fez o mesmo apelo. Pela nossa parte, continuaremos a pugnar por uma alternativa que respeite o direito inalienável do povo de cada Estado membro de decidir do seu futuro e que salvaguarde as constituições nacionais. Queremos a defesa do respeito pelo princípio de estados soberanos e iguais em direitos e a realização de um referendo, em Portugal, antes da ratificação de um projecto constitucional, precedido de um verdadeiro debate pluralista sobre os seus objectivos e conteúdos.

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