&quot;Adeus João, Lisboa Continua&quot;<br />António Abreu na &quot;Capital&quot;

Tu, todos nós o esperavam. E encarámo-lo com a serenidade possível, num período, em que a dor e a tensão tornaram tudo tão mais difícil, mas onde o respeito se sobrepôs às solicitações para entrar por outro tipo de considerações, aproveitando o momento do adeus. Como nos conhecemos bem, sabes que não iríamos por aí. E preferimos evocar o essencial. Que para nós foi a luta de anos que travámos em conjunto pela liberdade, no 25 de Abril, na consequência dos caminhos da Revolução com ideais mas também com o pulsar da luta deste povo a quem tantos dedicaram inteiramente as suas vidas, contigo. Foram duas décadas de intensa actividade parlamentar, qualificada e fundamentada, o rigor e a ironia, a simpatia e um feitio muito próprio, que se prolongou em mais de uma década na Presidência da Assembleia Municipal de Lisboa, também em representação do PCP, que marcou a vida deste órgão pela capacidade e respeito de todos pela forma como o desempenhaste.Foste um dos muitos que assumiram a responsabilidade de encetar as grandes mudanças de que Lisboa necessitava no início da década de noventa. Lisboa ficou diferente para melhor, prosseguiu-se uma estratégia , desenvolvimentos em diversas áreas, onde avultou sempre a preocupação central com as pessoas, e de que resultaram a fruição de novas realidades, novas expectativas e a elevação da exigência popular. Neste novo mandato municipal perdemos a maioria na Câmara, o que dificultou o prosseguimento dessas mudanças. Mas mantivemos a maioria na Assembleia Municipal, com a presidência que continuaste a protagonizar.No dia em que nos deixaste, reflectimos sobre este último ano de uma maioria de direita com responsabilidades executivas. Concluímos que o município se encontra à deriva, sem estratégia, com as promessas eleitorais esquecidas e entregue a sucessivas e incoerentes declarações de intenção, sem sequência de realização. Que se pararam projectos, acções e iniciativas, que foram suspensas e adiadas obras de diferentes dimensões e a manutenção do espaço público foi desleixado. Lisboa não está feliz e a “sedução” do novo presidente começa a cansar as populações e os media que não vêem das palavras saírem actos. É, porem, de assinalar a homenagem que Câmara e Assembleia te têm estado a realizar nestes tristes dias do adeus.No dia em que nos deixaste, anunciamos um conjunto de dez medidas imediatas para sair deste marasmo, para dar uma outra vida à cidade e não alienar a exigência e a esperança . Tapar buracos nas vias, recuperar o funcionamento de candeeiros, repor a calçada, remover os carros abandonados e realizar operações especiais de limpeza. Entregar casas prontas e retomar protocolos de pequenas reparações em casas particulares com as Juntas de Freguesia. Exigir o fim das portagens na CREL e a clara programação da conclusão do Eixo Norte-Sul e da CRIL. Afastar os perigos para a mobilidade na cidade, tanto mais quanto a construção do túnel Amoreiras- Marquês está em fase de apreciação de propostas. Obter outra operacionalidade de fiscalização pela PSP e retomando o funcionamento do Conselho Municipal de Segurança que, em termos práticos, pode prevenir a criminalidade e atender a zonas mais sensíveis. Também defendemos que se dê continuidade ao plano ,que vinha de trás, de requalificação de praças, jardins e espaço público, especialmente nos bairros municipais. E que se relançasse o importante projecto desportivo que envolveu diferentes camadas da população, as Festas de Lisboa que correspondessem aos diferentes interesses de quem aqui vive ou os que nos visitam, procurando manter uma animação cultural em coretos, praças e jardins e coordenar com outros operadores culturais uma sequência de diferentes festivais ao longo do ano. E se abrissem espaços nos bairros e se repensasse o S. Jorge. Mas que também se montasse com firmeza a intervenção e apoio aos toxicodependentes, através da redução de riscos, acolhimento e encaminhamento com objectivos e prioridades definidas a partir de um observatório permanente. E exigimos que se começasse de facto a trabalhar na reabilitação da Baixa Pombalina, criando uma estrutura própria para o efeito que iniciasse um programa sistemático de sondagens, adaptando os pisos térreos na Praça do Comércio para concessão com vista a diferentes actividades que lhe dêem vida como ao conjunto da Baixa. Finalmente, defendemos que se prossiga o processo de revisão do PDM, iniciado em Abril de 2001 e suspenso no ano que passou, preocupados que estamos com a necessidade de reduzir edificabilidades e respeitar o Corredor Verde e a circulação subterrâneas das águas e tanto mais preocupados quando o novo Presidente da Câmara anunciou tencionar suspender o PDM e revogar artigos do RGEU “para a cidade poder crescer em altura”.Já não estarás na continuação deste combate . Mas, recordamos-te e... Lisboa continua.