25º aniversário
do 25 de Abril



Vai passar, no próximo dia 25 de Abril, o 25º aniversário da Revolução dos Cravos, da revolução que derrubou o fascismo (de Salazar e de Caetano), terrível ditadura que se foi formando pouco depois do golpe militar de 28 de Maio de 1926 e durou até 1974.
É um longo período negro da história de Portugal. Um muito longo período de estagnação e de atraso (chegou a ser decidida e praticada a diminuição dos anos de instrução primária obrigatória de quatro para três anos) que deixou marcas profundas na vida nacional e na vida de milhões de portugueses. É necessário não esquecer o que foi este quase meio século de aviltamentos, de perseguições e de crimes, de intensa exploração e de corrupção, dificilmente compreensível para os que não viveram esses tempos.

Também será dificilmente compreensível pelas gerações mais jovens o profundo sentimento de libertação e de vitória que a grande maioria dos portugueses sentiu naqueles dias magníficos de um Portugal que se abriu para a democracia, para o desenvolvimento, para o futuro.
Uma revolução que assentou numa sublevação militar (imediatamente seguida por um levantamento popular) dirigida pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), movimento que foi directamente influenciado, não só pelas lutas travadas pelos antifascistas portugueses, mas também pelas lutas dos povos espezinhados pelo colonialismo fascista que, durante largos anos, chegaram a recorrer à luta armada.
A Revolução Portuguesa, pela forma que tomou e a sua especificidade, tornou-se um acontecimento internacional de grande importância, interesse e estudo.

Apesar da grande heterogeneidade do novo poder em Portugal (houve quem pretendesse contrariar a dissolução da DGS - sucessora da PIDE -, a libertação dos presos políticos, a formação de partidos, a independência dos povos coloniais) e de sucessivas tentativas de golpes políticos e até militares com apoio da direita, a movimentação dos trabalhadores e das populações, os partidos democráticos e os militares progressistas, a aliança Povo-MFA, conseguiram muitos e grandes avanços democráticos com grande repercussão imediata na situação económica, social e cultural.
Estabeleceu-se o salário mínimo nacional, dignificou-se o estatuto da mulher e do reformado, efectuaram-se as nacionalizações, realizou-se a Reforma Agrária (o desemprego deixou de existir no Alentejo e outras regiões), procedeu-se à descolonização. Reforçaram-se os Sindicatos e criaram-se as Comissões de Trabalhadores, as Associações de pequenos e médios agricultores, as Cooperativas, as Comissões de Moradores e outras organizações e organismos representativos.
O capitalismo monopolista de Estado acabou e o capitalismo monopolista perdeu o domínio que tinha sobre a economia portuguesa.

O afastamento do PS do processo revolucionário e as suas ligações à grande burguesia, a divisão dentro do núcleo principal do MFA, o desenvolvimento do esquerdismo e a sua influência em sectores militares e o natural apoio da direita (e do imperialismo) foram criando dificuldades crescentes às transformações que se viviam no País.
Em amplas regiões praticamente a sua democratização foi sustada. Acções terroristas atingiram muitos Centros de Trabalho do PCP. Altas figuras envolveram-se com bombistas, encostaram-se aos EUA ou mudaram de trajectória. Em Novembro de 1975, uma verdadeira cilada levou os militares de esquerda à sua derrota.
Apesar disso, ainda em 2 de Abril de 1976 é aprovada pela Assembleia Constituinte e imediatamente promulgada pelo Presidente da República (general Costa Gomes) a nova Constituição da República Portuguesa, a Constituição mais progressista da Europa Ocidental, que muito honra o desenvolvimento da Revolução.
Nas primeiras eleições legislativas (25/4/76) o PS teve a maioria dos votos. Os deputados do PS mais os do PCP ultrapassavam bem a maioria absoluta. Mas o PS rejeitou qualquer acordo com o PCP. Começou a governar sozinho defendendo claramente uma política de direita. Em Janeiro de 1978 fez uma coligação com o CDS, o único partido que não votou a Constituição. Todos os governos que sucessivamente presidiram aos destinos do País, em que intervieram o PS, o PSD e o CDS/PP, defenderam sempre políticas de direita.

Apesar da intensa resistência e da constante luta das massas trabalhadoras, das populações e de outros sectores antimonopolistas, fecharam-se muitas portas que Abril tinha aberto.
A Reforma Agrária foi destruída. A recuperação capitalista e a reconstrução dos monopólios foram-se desenvolvendo.
A entrada na CEE, encarada como uma salvaguarda ante as conquistas revolucionárias, abriu caminho a uma integração europeia com tendências federalistas que não só conduziu, com a anuência de sucessivos governantes portugueses, ao descalabro da nossa agricultura e das pescas e à destruição de importantes sectores industriais, como leva à perda da nossa soberania, sujeitando o País aos interesses das grandes potências e das multinacionais.
O actual Governo PS aprovou e alargou ainda mais as privatizações. Seguro defensor dos interesses do grande capital, é considerado por este como o seu "amigo". O pacote laboral que o PS está pretendendo impor aos trabalhadores é flagrantemente um serviço àqueles interesses. A política já se subordina à economia.

A evolução da repartição do Rendimento Nacional ilustra de forma objectiva e quantitativa a quem serve a política desenvolvida há mais de duas dezenas de anos.
A percentagem do Rendimento Nacional que cabe ao trabalho, que atingiu um elevado valor em 74 e, ainda mais, em 75, ultrapassando claramente os 60%, foi descendo logo a partir de 76 e, desde 1984, oscila em torno dos 40%. É menos que no tempo do fascismo (Séries longas para a Economia Portuguesa - Banco de Portugal, dados de 1953 a 1993). (1)
Também os "inquéritos aos orçamentos familiares" do Instituto Nacional de Estatística (2) mostram que o décil (dez por cento do total) das famílias portuguesas com menor orçamento gastou, em 1995, apenas 1,5% da despesa total e o décil das famílias com maior orçamento gastou 30,5% daquela despesa. E cinco anos antes, em 1990, o primeiro décil gastara 1,7% e o décil mais rico gastara 29,3%. O fosso entre os pobres e os ricos é muito grande e vai crescendo. Exactamente o contrário do que os sonhos de Abril defendiam.
Nos mais diversos índices económicos, sociais e culturais Portugal não aproveitou todos estes anos para deixar de estar na situação mais atrasada entre os países da União Europeia.
Os próprios direitos democráticos têm sofrido muitas limitações. A comunicação social dominante está nas mãos do grande capital - não é livre. A Televisão do Estado limita bem mais o acesso ao PCP do que aos que tentam branquear o fascismo. Em muitas empresas os trabalhadores são perseguidos até por serem sindicalizados. Os que são comunistas temem ser conhecidos como tal. O mesmo sucede em muitas terras onde a direita tem grande domínio.
Não foi para tudo isto que tantos prepararam e fizeram a Revolução de Abril.

O Comité Central do PCP reuniu nos dias 24 e 25 de Janeiro e aprovou dois documentos: uma Resolução que caracteriza a política levada a cabo pelo actual Governo do PS, analisa a luta que se trava contra as consequências daquela política e chama a atenção para as duas importantes batalhas políticas de 1999 - as eleições para o Parlamento Europeu e para a Assembleia da República. O outro documento é um Apelo sobre as comemorações do 25º aniversário do 25 de Abril.
A leitura destes documentos, transcritos no final deste número de O Militante, ajuda a compreender a situação actual, 25 anos depois da libertadora e vitoriosa Revolução de 1974, e a entender que a sua comemoração tem de denunciar "a política de destruição sistemática das grandes conquistas de Abril" e contribuir "para que Portugal possa retomar os caminhos abertos por Abril", os caminhos de um futuro "ancorado numa democracia política, económica, social e cultural".

17/2/99

(1) Ver O Militante nº 231, de 11-12/97.
(2) Ver O Militante nº 235, de 7-8/98.


«O Militante» Nº 239 - Março / Abril - 1999