Pós-Expo - Uma oportunidade
de fazer cidade e equilibrar a vida urbana

José Tavares
Membro do CC
e do Secretariado da DORL

Desde a equação da candidatura de Lisboa à realização da Exposição Internacional de 1998 até ao momento do seu encerramento, sempre o PCP acompanhou com vivo e empenhado interesse cada uma das fases deste importante evento.
A afirmação cultural do País, o alcance histórico e científico do tema seleccionado, as repercussões económicas, nomeadamente nas vertentes emprego, obras públicas e turismo, a revitalização urbana de importantes áreas dos concelhos de Lisboa e Loures, a recuperação ambiental de áreas sacrificadas, os importantes equipamentos a instalar na zona, constituíram razões sólidas que enquadraram as nossas análises e posições.
Momentos houve em que legítimas e fundamentadas discordâncias se ergueram, nomeadamente em torno da viabilização económica da Expo'98 através de uma operação imobiliária justificada pela estafada e derrotada tese do “custo zero”, em torno do regime de excepção face ao Tribunal de Contas e à observância das regras urbanísticas e de licenciamento de obras, definidas na lei e nos PDM, de Lisboa e Loures, com a consequente expropriação dos poderes dos municípios envolvidos, ou ainda em torno das receitas subtraídas às Câmaras referidas, relativas ao processo de licenciamento urbanístico, obras, contribuição autárquica e sisa.
Igualmente, não foi sem emoção e sem luta que desapareceram mais de 20 mil postos de trabalho e importantes unidades industriais na coroa envolvente da zona de intervenção. Naturalmente que a Expo'98 foi apenas o catalisador do fenómeno. Para tal contribuiu decisivamente a opção da política de direita dos governos (PSD/Cavaco e PS/Guterres) de desindustrialização da nossa economia.
Na circunstância imperou a (i)lógica neoliberal do “mercado”. “É mais rentável a especulação fundiária e imobiliária - mande-se às malvas a produção de bens e o emprego!”

A importância da realização

Num processo contraditório de momentos e decisões positivas cruzadas com factos e razões indefensáveis, a Expo'98 alcançou resultados inquestionáveis.
A começar, o interesse e entusiasmo que conduziu ao recinto quase nove milhões de visitantes que elegeram a qualidade e coerência do conjunto, a beleza e equilíbrio dos espaços criados, a larga participação de países representados e um programa cultural diversificado.
Antes ainda, foram as obras realizadas na adaptação do espaço onde se realizou a Exposição, transformando um atoleiro de lixos e degradação urbana, numa zona aprazível e qualificada.
As obras induzidas pela Exposição (ou a pretexto) como sejam o prolongamento da Rede do metropolitano até aos Olivais, a nova travessia do Tejo, a revolução operada na rede viária (abertura de vários troços da inacabada CRIL, o ordenamento e reabilitação da Av. Infante D. Henrique, o prolongamento da Av. EUA até à Av. Central de Chelas, o desnivelamento da Rotunda do Relógio e Av. Marechal Gomes da Costa, as novas vias de ligação de Moscavide à Portela e de Sacavém a Lisboa, a variante à EN10 - reivindicada há vários anos pela CM Loures -, os diversos e complexos nós construídos em complicados pontos viários).
O sucesso do empreendimento cultural, científico e participativo da Expo'98, assim como o plano de realizações urbanísticas, viárias e ambientais, é a demonstração objectiva da capacidade de realização dos portugueses, claramente contrastantes com a situação geral do País e com a qualidade de vida das populações.
A política de direita tem aproveitado os atrasos estruturais da economia portuguesa para justificar orientações e programas claramente subordinados aos interesses dos grandes grupos económicos e da crescente e generalizada privatização de todas as áreas da economia, dos serviços sociais e da administração pública.
A Expo'98, apesar das contradições e sobressaltos conhecidos, é a demonstração da vitalidade da iniciativa e da intervenção pública desde que orientada para a defesa dos interesses do País e do Povo.

Acabou a Expo, mas a vida e a luta continuam!

O período pós encerramento da Exposição é agora a questão mais premente.
Mas já antes, muito antes, a atenção responsável do PCP incidiu sobre o “Pós-Expo”. Sobre o tema, a DORL realizou em 1995 uma primeira reflexão. Em Maio de 1998, antes da abertura da Exposição, a Organização da Cidade de Lisboa promoveu na Zona Oriental/Olivais um participado debate, concentrado exclusivamente na resultante urbanística, cultural e social da Expo na cidade e na Área Metropolitana.
Em 17 de Setembro, no âmbito da iniciativa política “Portugal 2000 - Debates para uma política de esquerda”, realizou o PCP, na Cidade de Lisboa, um debate que contou com mais de 200 participantes.

As principais conclusões destas iniciativas foram:

. no mais curto espaço de tempo, restabelecer a jurisdição administrativa dos Municípios de Lisboa e Loures na Zona de Intervenção;

. estabelecer um período transitório durante o qual a gestão urbana da zona envolverá a responsabilidade partilhada dos Municípios e da Parque Expo SA.;

. por todos os meios evitar que, a pretexto de condicionantes económicas relacionadas com o pagamento de eventuais “derrapagens”, seja aumentada a densificação e as cérceas previstas na zona;

. as densidades definidas já constituem uma preocupação que aconselharia a uma equilibrada revisão, face à qualidade de vida urbana expectável (será inadmissível que o processo de urbanização venha a determinar a existência de uma barreira física entre a cidade e o rio e a eventual alteração do sistema de vistas);

. assegurar a despoluição da Foz do Trancão e das Margens do Tejo, nomeadamente a remoção das lamas e entulhos;

. indispensável garantir os equipamentos colectivos que permitam servir as zonas envolventes (Marvila, Olivais, Moscavide e Sacavém) carenciadas;

. prolongar a rede do Metropolitano para Moscavide, Portela e Sacavém;

. descomprimir Moscavide, dotando esta freguesia de mais desafogo e espaços verdes na envolvente;

. garantir, articuladamente, os investimentos em equipamentos nas zonas circundantes de Marvila, Chelas, Olivais, na rede viária secundária, de forma a criar um urbanismo mais homogéneo e equilibrado;

. condicionar a instalação de grandes superfícies comerciais que pelo seu impacto terão efeitos sócio-económicos indesejáveis no tecido envolvente;

. garantir a qualidade do Parque Urbano Tejo/Trancão e a sua integral utilização pelas populações da região.

O Plano de Urbanização prevê a criação de 20 mil postos de trabalho na Zona. Entretanto, verifica-se que o licenciamento já priorizado se destina à habitação. Para evitar o risco da monofuncionalidade transformando esta Zona em mais um dormitório, impõe-se que sejam desencadeadas acções que envolvam a Administração Central e Local, as associações empresariais e empresas de forma a garantir os objectivos definidos no Plano de Urbanização.
Os Municípios de Lisboa e Loures, as Juntas de Freguesia envolventes e a futura Região Administrativa de Lisboa e Península de Setúbal têm um processo complexo a acompanhar.
O PCP e, em particular, as suas organizações de Lisboa e Loures não deixarão de dar atenção e os contributos que uma tal situação exige.
«O Militante» Nº 237 - Novembro / Dezembro - 1998