Fortalecer a Organização
e a sua ligação ao meio onde actua

Faltam poucos dias (na data da distribuição deste número de O Militante) para a realização do referendo sobre a regionalização.
Trata-se de um segundo referendo que não devia ser realizado. A criação das regiões administrativas no Continente está, desde sempre, na Constituição da República.
Os diversos governos, desde 1976 (primeiro Governo PS), furtaram-se sempre a cumprir a Constituição aprovada naquele ano. O PS, na sua propaganda para as últimas eleições legislativas (1995), prometeu, se fosse governo, proceder à regionalização; chegou a prever que as primeiras eleições regionais seriam realizadas em 1997. Mas foi exactamente no ano passado que o PS, num novo conluio com o PSD (conluio apoiado pelo CDS/PP), aceitou acrescentar na Constituição a necessidade de um referendo sobre a regionalização. Mais uma cedência dos "socialistas" que fere o próprio respeito pela Constituição e que levanta naturais dúvidas sobre o verdadeiro interesse do PS pela concretização dessa aspiração democrática.
Entretanto, a defesa do Sim nas duas respostas do referendo é assumida pelo PS (Mário Soares e outros estão contra) e, de uma forma consciente, devotada e sincera, pelo PCP e o PEV.
Embora sejam conhecidos não poucos membros do PSD e mesmo do PP que estão com o Sim, estes dois partidos assumem, actualmente, o Não à regionalização. É essa também a posição defendida ou aconselhada pelo grande capital em geral, que, é bom lembrar, domina hoje, directamente, os principais meios da comunicação social privada. A propaganda do Não, com meios poderosos para a divulgar, assenta na mentira, na fraude, numa completa falta de escrúpulos e até em cartazes que ofendem a generalidade dos eleitos e a democracia. É também a defesa do projecto AD (coligação dos dois partidos) que está em jogo.
O resultado do referendo, ou conduzirá a uma importante e notável modificação administrativa no Continente, que pode ter papel de grande relevo na sua democratização e desenvolvimento, ou, pelo contrário, levará a um novo adiamento, naturalmente prolongado, do cumprimento do que, a este respeito, está na Constituição. E, se for assim, todo o Continente continuará, a nível regional, a ser dirigido pelas cinco Comissões Coordenadoras Regionais (e mais 73 outras entidades dirigentes regionais com áreas de intervenção muito variadas), constituídas por cidadãos, que quase ninguém conhece quem são, nomeados pelo Governo central.

Entretanto, no primeiro fim de semana de Setembro, como tem sido normal, efectuou-se, mais uma vez, a Festa do Avante!, que foi um importante êxito do nosso Partido.
Apesar de alguma comunicação social ter inventado dificuldades e até a dúvida sobre a sua realização, o que só desacredita quem assume mentiras e o órgão que as divulga, a Festa está interessando cada vez mais gente, impondo-se como grande iniciativa cultural e popular que marca a actividade do PCP.

Ainda na parte final de Setembro, intensificaram-se, por todo o País, as acções de esclarecimento, acerca do pacote laboral do Governo de Guterres, junto de centenas de milhares de trabalhadores.
Entre as dezenas de alterações às leis do trabalho que chegaram à Assembleia da
República e que representam uma muito grave ameaça aos direitos conquistados ao longo de muitos anos pelos trabalhadores, dão-se saliência aqui às que pretendem generalizar o trabalho a tempo parcial, excluir da retribuição pelo trabalho prestado actuais componentes variáveis, reduzir os dias de férias de acordo com a assiduidade, alargar o período considerado como de trabalho normal (não nocturno), alterar a favor dos patrões o regime de lay-off, reconhecer às associações patronais a sua participação na elaboração da legislação laboral, aumentar para quatro anos o tempo dos contratos a prazo. Bem dizia o vice-presidente da CIP, Nogueira Simões, na sua entrevista a O Diabo (6.2.96), que o Governo de Mário Soares lhes tinha dado os contratos a prazo mas que estes precisavam, agora, de ser melhorados. O Governo de Guterres, que ele classificou como "o nosso amigo", está tentando oferecer aos grandes patrões o que eles desejam, embora o nível da exploração dos trabalhadores seja hoje superior ao existente no tempo do fascismo e, por isso, nunca o grande capital tenha tido tão altos lucros.
Os dirigentes da UGT afirmam, como lhes compete (para isso foram criados e existem), que globalmente o pacote é bom. Mas parece ser certo que a deputada do PS Elisa Damião, presidente da Comissão Parlamentar do Trabalho, "vinha a manifestar fortes reservas ao «pacote laboral»" e "era bem conhecida a oposição de Elisa Damião a grande parte do «pacote laboral»" (DN, 3.10.98). Esta posição é bem significativa da gravidade das intenções do PS contra os trabalhadores.

Uma grave crise financeira cobre a maioria dos países asiáticos, a Rússia, grande parte da América Latina. Esta crise e a consequente recessão económica não pode deixar de repercutir na União Europeia. Em Portugal vive-se já num período de aumento da inflação, o número verdadeiro dos desempregados (mais de meio milhão) vai ainda aumentar, a instabilidade no mercado bolsista é também um indicador importante que, hoje, toca muita gente.
Por outro lado, ao fim de três anos de governação, nada de verdadeiramente relevante foi melhorado na sociedade portuguesa. Das reformas estruturais necessárias de que tanto se tem falado, nenhuma foi realizada. Não faltam os comentaristas, mesmo distantes das nossas ideias, que afirmam, de modos diferentes, que é essa a postura do Governo, a de não fazer nada, e que mesmo o que de alguma maneira diferenciava Guterres de Cavaco - o diálogo, a tolerância, a transparência - já não existe.
Situações ou acontecimentos insólitos vão também caracterizando o actual Governo. Podem referir-se alguns bem recentes. Um ministro, demitido por doença, tinha comportamentos e comentários pelo menos extravagantes; um outro ministro põe a nu a sua inconsciência quando decide e define a participação, numa nova possível prepotência dos EUA e da NATO, de pessoal e meios militares sem ouvir as instâncias a que é obrigado; uma ministra revela que, se Guterres continuar depois das eleições como primeiro-ministro, será de novo convidada para se manter como ministro na mesma pasta; um ex-presidente da Junta Autónoma das Estradas afirma que há corrupção nessa área e que isso é conhecido do Governo (o que já se confirmou). Não admira que haja quem já classifique o comportamento governamental de bandalheira.

Estamos numa altura em que parece, sem pensar nos muitos boys que têm bons jobs, que só o sorriso e o tom de voz contida de Guterres vai mantendo a sua corte e alguma simpatia. Ao mesmo tempo os dirigentes de uma chamada "oposição", Marcelo e Portas, não conseguem, apesar do seu populismo, demagogia e "volte-faces" e da sua presença, todos os dias, na televisão, ou talvez por isso mesmo, convencer muitos portugueses de uma competência, seriedade e dedicação à causa pública que lhe são completamente alheias.
Tais condições tornam ainda mais importante que a verdadeira oposição à política de direita do PS - o Partido Comunista Português (e a CDU) - procure insistentemente esclarecer os trabalhadores e muitos elementos das outras camadas laboriosas de que o seu fortalecimento e uma sua maior inserção na sociedade portuguesa são condições indispensáveis para que o nosso País deixe de estar dominado, como sucede desde 1976, por uma política claramente de direita e passem os valores de esquerda, os valores que põem acima de tudo o homem, a serem seguidos e respeitados.
Para se poder avançar nessa direcção é indispensável melhorar a arma fundamental do Partido - a sua organização - e aprofundar, cada vez mais, a ligação da organização, dos seus membros, às massas trabalhadoras, às outras camadas laboriosas, às populações.
É isso que se está procurando fazer em muitos lados, em diversas organizações, vencendo desmobilizações, baixos níveis de militância, incompreensões sobre a importância formadora das reuniões regulares do Partido, ideias e posições sectárias e outras deficiências e dificuldades que contrariam o necessário reforço orgânico e a indispensável maior inserção no meio em que cada organização está implantada.
A persistência nesta linha de actuação pode levar e está levando a resultados positivos, a avanços sensíveis na nossa influência em todas as regiões e em muito diversos sectores do nosso povo.

A recente atribuição do Prémio Nobel da Literatura ao escritor José Saramago deu uma imensa satisfação a todos os que têm o português como língua, é um acontecimento de muito grande relevo para os portugueses que honra em particular o nosso Partido.
«O Militante» Nº 237 - Novembro / Dezembro - 1998