Avanços eleitorais da CDU no Vale do Ave




António Lopes
Membro da Comissão Política

São sempre bastante difíceis e mesmo perigosas as análises que, querendo explicar resultados eleitorais, procuram isolar factores que se julgam poder ser os mais determinantes para a sua formação.
Sabemos já, por experiência própria, que um resultado eleitoral é obra de muitos factores e que nem sempre aquele que nos parece ter contribuído mais para esse resultado foi o que mais o determinou. Tais factores são ainda mais difíceis de considerar e isolar a partir dos resultados das eleições autárquicas, onde intervêm e se sobrepõem um maior número de factores objectivos e subjectivos, de ordem nacional, regional e local, que complicam e dificultam acrescidamente a própria interpretação e compreensão dos resultados eleitorais.
No caso dos resultados das eleições nas autarquias do Vale do Ave, correndo-se esses riscos e mesmo o de algum inevitável esquematismo e simplificação da análise, julgamos evidente que as subidas eleitorais da CDU e alguns bons resultados conseguidos num importante conjunto de freguesias desta região, dificilmente podem ser dissociados da prolongada e corajosa luta dos trabalhadores têxteis pelas 40 horas e o fim do trabalho ao sábado e das justas e correctas posições e intervenções políticas do Partido na conquista desta muito velha e sentida aspiração dos trabalhadores da indústria têxtil da região.


Melhores resultados onde a luta social e política foi mais intensa

Esta conclusão não pode ser generalizada a todas as freguesias dos concelhos do Vale do Ave onde mais fortemente está implantada a indústria têxtil, sobretudo em Guimarães, V. N. Famalicão e Stº Tirso. Mas uma análise mais fina poderia mostrar que as diferenças existentes, para além da intervenção de outros factores locais importantes, estão em muitos casos profundamente ligadas às formas e níveis de desenvolvimento da luta social e política pelas 40 horas ao longo destes últimos anos e às expressões que assumiu no quadro da luta política eleitoral em cada concelho e freguesia.
Esta velha e sentida aspiração estava claramente mais interiorizada e assumida como uma reivindicação central dos trabalhadores, em algumas zonas e freguesias historicamente de maior peso e tradição na têxtil. Quem de entre nós não ouviu, durante anos a fio, enquanto distribuia documentos à porta de empresas têxteis de Pevidém, Moreira, Vizela, Riba d’Ave, etc., a pergunta sagrada: “É para as 40 horas? Quando deixamos de trabalhar ao sábado?”.


Votos pela criação do concelho de Vizela

É interessante e significativo constatar que as diferentes análises da imprensa ao serviço do poder e dos interesses e ideologias dominantes, quanto às explicações dos bons resultados da CDU no concelho de Guimarães, tenham sempre referido a questão da luta pela criação do concelho de Vizela como principal contributo para a eleição dos dois vereadores na Câmara de Guimarães, e tenham sistematicamente ignorado as espectaculares subidas da CDU no vasto conjunto de freguesias onde contou de forma evidente o apoio empenhado do PCP na luta pela conquista das 40 horas para os trabalhadores da indústria têxtil. Isto não significa que não seja certo que foi importante a participação dos votos nas freguesias interessadas na criação daquele concelho.


Votos para penalizar o Governo

Os trabalhadores souberam utilizar legitimamente o momento político da campanha eleitoral e o próprio voto, independentemente do carácter muito específico das eleições autárquicas, para pressionarem e penalizarem o partido do Governo, pela sua cumplicidade com o conjunto de grandes empresários têxteis que, por diversas formas e sistematicamente, procuraram negar aos trabalhadores deste sector, primeiro a aprovação de uma lei e, depois, através de interpretações abusivas, a justa e correcta redução do horário de trabalho.


Manobras de "apoio" à luta

Não terá sido por acaso, nem por uma rápida conversão à defesa dos interesses dos trabalhadores que, na proximidade das eleições autárquicas, em alguns municípios do Vale do Ave, onde a luta estava mais acesa, alguns candidatos do partido do Governo à presidência de Câmaras fizeram questão de declarar o seu “apoio” à luta e de fazer mesmo “exigências”, junto do seu Governo e do Grupo Parlamentar do PS, para que tomassem medidas para a resolução do conflito. Na mesma altura, o que também não deixa de ser esclarecedor, Governo e Grupo Parlamentar do PS preocupavam-se em divulgar a ideia de que estavam a trabalhar numa iniciativa legislativa para depois das eleições (no quadro da directiva comunitária), a qual viria responder aos problemas ainda existentes no sector têxtil.
Como se veio a verificar, e o Partido na altura tinha alertado, tais manobras tinham como objectivo adiar a resolução dos problemas existentes, criar falsas expectativas, desarmar a luta social e tentar evitar sobretudo que os trabalhadores, com o seu voto, penalizassem o PS pela sua cumplicidade com o grande patronato têxtil da região e pelo não cumprimento das suas promessas eleitorais feitas nas Legislativas.


Intervenção do movimento sindical

Não querendo diminuir a contribuição que a própria luta em si deu para a compreensão de que o voto nas eleições autárquicas podia ser muito útil na conquista efectiva das 40 horas, foi determinante para a transformação dessa compreensão e consciência, o discurso e intervenção do movimento sindical unitário - com papel relevante para os sindicatos do sector, a FESETE, e a CGTP-IN - responsabilizando o Governo pela existência do conflito, denunciando a sua cumplicidade com o conjunto de patrões têxteis que se recusavam a aplicar correctamente a redução do horário de trabalho e as maiorias do PS com a direita formadas na Assembleia da República ao serviço de todos os oportunismos e manobras que negassem aos trabalhadores têxteis aquilo a que tinham direito.


Papel do PCP e da campanha da CDU

Também para os bons resultados da CDU na corda do Ave foi inegável o conhecimento e a compreensão pelos trabalhadores têxteis do papel político destacado do PCP, quer no quadro da sua organização local e de sector, quer ainda no quadro das instituições: Assembleia da República e Parlamento Europeu.
A própria pré-campanha e campanha eleitoral da CDU tornou isso mais visível perante a maioria dos trabalhadores têxteis da região. Não só pela composição das próprias listas - com grande presença de trabalhadores têxteis, muitos dos quais eram aqueles que mais se destacavam na luta. Também porque o próprio discurso político da campanha, sem negar os objectivos muitos específicos que caracterizam as eleições autárquicas, trouxe quase sempre ao de cima a questão da redução do horário de trabalho e a preocupação de que esse objectivo devia estar presente nos programas das autarquias do Vale do Ave, face à importância económica e social que a questão tinha para a maioria da população.

Os resultados eleitorais conquistados pela CDU no Vale do Ave e a vitória histórica recentemente alcançada pelos trabalhadores deste sector, abrem grandes perspectivas ao reforço do Partido e da sua intervenção em toda esta região. Os avanços registados exigem medidas no plano de direcção, de quadros e de organização, que olhem cada vez mais para o Vale do Ave como um dos objectivos prioritários do Partido no Norte. Este é o sentimento profundo, não só das Organizações locais do Partido, mas também da maioria dos que ali trabalham e lutam.


Mapa dos resultados mais expressivos das freguesias do Vale do Ave




«O Militante» Nº 234 - Maio / Junho - 1998