Intervenção de

Proposta de Lei n.º 147/VII - Orçamento do Estado para 1998 - Intervenção de António Filipe

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

Grande parte da atenção que muitos cidadãos dedicam ao Orçamento de Estado recai sobre o PIDDAC. Em cada ano, logo que se torna conhecida a Proposta de Lei do Orçamento, são milhares os cidadãos interessados na resolução de muitos problemas sociais que procuram encontrar no PIDDAC a resposta a muitas reivindicações, a concretização de muitas aspirações, o cumprimento de muitas promessas.

Bombeiros que justamente aspiram a apoios para a construção de novos quartéis que lhes permitam ampliar ou substituir instalações em muitos casos exíguas, dirigentes associativos que procuram o apoio tantas vezes prometido à construção de instalações culturais ou desportivas para servir as populações, autarcas que anseiam pelo progresso das suas terras, populações que lutam pela construção de hospitais ou centros de saúde, de melhores acessibilidades, de mais e melhores instalações para forças de segurança, todos procuram encontrar no PIDDAC a perspectiva de melhores condições para a satisfação de necessidades sociais fundamentais.

Acontece que, para muitos milhares destes cidadãos, o conhecimento da proposta de PIDDAC para 1998, traduz-se numa enorme frustração, pela falta de inscrição de obras fundamentais, pelo seu constante adiamento, pelo incumprimento de promessas mil vezes repetidas em vésperas de eleições, mas também pela instrumentalização eleitoralista desta proposta, revelando uma completa falta de respeito para com os cidadãos e contribuindo lamentavelmente para o descrédito da proposta orçamental.

No que respeita às funções sociais que mais preocupam os cidadãos, designadamente ao nível dos equipamentos de saúde, das instalações para forças de segurança, ou de tribunais, o plano de investimentos da Administração Central proposto para 1998, revela três aspectos deploráveis:

Traduz-se o primeiro, no arrastamento e protelamento de um conjunto muito significativo de projectos, com o sucessivo adiamento dos prazos de conclusão previstos.

O segundo, na inexplicável redução de muitas dotações que no PIDDAC pata 1997 se encontravam previstas para 1998.

Consiste o terceiro, no número imenso de projectos que são dotados de verbas irrisórias, revelando duas coisas: A falta de vontade política em realizar tais projectos no próximo ano e a óbvia vontade de utilizar o PIDDAC para servir objectivos eleitoralistas, reiterando promessas que, por enquanto, não passarão disso mesmo.

Mas não há como passar aos factos para comprovar tudo o que acabo de afirmar.

O Serviço Nacional de Protecção Civil dispõe em PIDDAC de uma dotação destinada à aquisição de recursos para apoio a 5 mil desalojados. Monta tal dotação a 4 contos por desalojado.

O PIDDAC do Ministério da Administração Interna conta com a inscrição de 92 projectos relativos a instalações para forças de segurança (esquadras da PSP e quartéis da GNR) com verbas não superiores a 5 mil contos. A dotação média destes projectos é de 3 380 contos.

Não se diga que se trata de obras em fase de conclusão. Apenas seis se encontram nessas condições.

Retirando os 28 novos projectos, cuja conclusão se encontra prevista para as calendas gregas, verificamos que 64 projectos já vêm de 1997. Nestes, foram inscritos 948 322 contos para 1997. Foram executados 697 315 contos. Deu-se mesmo a coincidência incrível de 39 projectos terem conhecido uma execução de 200 contos. No PIDDAC para 97 previa-se que esses 64 projectos viessem a afectar em 1988 uma verba de 2 798 345 contos. Ora, a verba efectivamente inscrita é de 214 mil contos.

Assim, para os comandos das divisões da PSP na Guarda, em Portalegre e em Vila Real estava previsto um investimento de 150 mil contos em cada. A realidade é um tanto diferente: Estão inscritos 5 mil contos para Portalegre, outro tanto para Vila real e 2 mil contos para a Guarda.

Para os quartéis da GNR em Aljezur, no Porto Santo, em S. Vicente, em ponte de Lima, em Portimão e em Vila do Bispo estavam previstos 70 mil contos para cada. Também aqui a realidade é um pouco diferente. Estão inscritos 5 mil contos para os de Ponte de Lima, de Portimão e de Vila do Bispo. E 3 mil contos para os de Aljezur, do Porto Santo e de S. Vicente.

Ainda assim um tanto melhor que as esquadras da Brandoa, da Damaia e de Alfragide que se encontram dotadas com mil contos para cada uma. Até já estou a ver os candidatos do PS a essas juntas de freguesia a invocar o grande empenhamento do Governo na garantia da segurança e tranquilidade das respectivas populações. Presumo que omitirão o valor das verbas inscritas, mas isso não passará de um pormenor de somenos.

No PIDDAC do Ministério da Justiça também há números que impressionam: O caso do tribunal de Vila Franca do Campo que, dos 156 300 contos previstos, só tem 840. Ou o caso do tribunal da Amadora que apesar de ter lugar cativo em todos os PIDDAC's dos anos noventa ainda não viu sequer a primeira pedra e mais uma vez se mantém fiel à tradição: Dos 251 963 contos previstos, só tem 9 300. Ou ainda o caso da directoria de Coimbra da Polícia Judiciária, que dos 160 mil contos previstos só tem 5 mil, verba que no entanto é superior à que está inscrita para as inspecções da Polícia Judiciária na Guarda, em Aveiro, em Chaves, em Portimão e em Setúbal.

Outro caso sintomático é o PIDDAC do Ministério da Saúde. Neste, estão inscritos 105 projectos de sedes ou extensões de centros de saúde com verbas até 5 mil contos. E de entre estes, 53, têm inscrições de 2 500 contos.

Há exemplos que merecem ser referidos: De entre os centros de saúde que estão inscritos em PIDDAC com 5 mil contos, importará porventura referir que as previsões para 1998 era, no caso do centro de saúde de Condeixa-a-Nova, de 110 mil contos; no de Eiras, em Coimbra, a previsão era de 190 mil contos; no de Esgueira, 100 mil contos; no de Lamego, 145 mil contos; no de Pampilhosa da Serra, 80 mil contos; no de Penela, 110 mil contos; no de Pinhel, 192 mil contos; no de Resende, 115 mil contos; no de S. João da Madeira, 120 mil contos. E falta ainda referir o de Alcabideche, que tendo como previsão 120 mil contos, integra o numeroso "clube" dos 2 500.

A esta lógica do protelamento e da derrapagem financeira não escapam os hospitais distritais, nem os centrais. Senão vejamos:

O hospital distrital de Braga tinha para 1997 uma inscrição de 110 mil contos. A execução foi zero. Tem agora 150 mil contos, espera-se que com melhor destino.

O hospital de Cascais/Sintra tinha uma previsão de 200 mil contos. Tem uma inscrição de 25 mil. O hospital distrital de Lamego tinha uma previsão de 500 000 contos e tem uma inscrição de 50 mil. O hospital distrital de Santiago do Cacém tinha uma previsão de 4 185 339 contos; tem uma inscrição de 450 mil contos. O hospital central de Todos os Santos tinha 500 mil contos inscritos para 1997, teve uma execução de zero, e para uma previsão de 1 300 000 contos tem uma inscrição de 25 mil contos. Que todos os Santos lhe valham.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

Os dados que acabei de referir revelam claramente que, a par do PIDDAC apoios e do PIDDAC tradicional, existe também o PIDDAC eleitoral.

Perante justas reivindicações das populações, que exigem melhores condições de acesso aos cuidados de saúde, que exigem mais segurança e tranquilidade, que reivindicam equipamentos que possam satisfazer necessidades sociais básicas, o Governo não dá resposta, mas inscreve no PIDDAC. Não se trata, no caso destes 105 centros de saúde ou destes 92 quartéis da GNR ou esquadras da PSP, com inscrições não superiores a 5 mil contos, de faseamento normal de obras. Trata-se de verbas de tal modo irrisórias que não passam evidentemente de meras simulações.

Não faltarão candidatos do PS às próximas eleições autárquicas a pregar as boas novas. Alegrem-se os cidadãos de Vila do Conde que têm 9 mil contos no PIDDAC para um centro de saúde e um quartel da GNR. Alegrem-se as gentes da Guarda que têm 4 mil contos para o comando da divisão da PSP e para a inspecção da Polícia Judiciária. Alegre-se o povo da Amadora, que os 12 300 contos que estão no PIDDAC hão-de dar para um palácio da Justiça e três esquadras da PSP.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

Chama-se a isto usar o Orçamento de Estado para defraudar as populações. Tanto o Orçamento de Estado como o povo português mereciam melhor respeito da parte do Governo.

Disse.

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