Projecto de Resolução

Projecto de Resolução nº 16/X - Hospital público para os concelhos do Seixal e Sesimbra

Pela construção de um hospital público para os concelhos do Seixal e Sesimbra
 

 

 

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I

Recentemente, no passado dia 5 do corrente mês de Abril, foi apresentado na Assembleia da República um abaixo-assinado com 65 mil assinaturas, reivindicando uma urgente decisão política no sentido da construção de uma unidade hospitalar pública no concelho do Seixal.

Esta iniciativa, promovida pelas Comissões de Utentes da Saúde dos concelhos do Seixal, Sesimbra e Almada e com a participação de diversas organizações do movimento associativo daqueles concelhos, ocorre na sequência de uma intensa intervenção reivindicativa, desenvolvida desde há vários anos em defesa da melhoria dos cuidados de saúde prestados às populações da região.

Exemplo dessa mesma intervenção é o facto de, em 2002 e 2003, um outro abaixo-assinado, com cerca de 30 mil assinaturas, ter sido também realizado com o mesmo objectivo: a construção de um hospital público que sirva as populações dos concelhos do Seixal e Sesimbra.

Entretanto, uma vasta e diversificada actividade tem sido desenvolvida neste sentido pelo movimento dos utentes, na informação e mobilização das populações, com inúmeras acções de debate, esclarecimento e luta, bem como na realização de diversos contactos institucionais junto da Governo, Assembleia da República, Grupos Parlamentares, etc.

 

II

Todo este processo, desde o seu início, tem contado com a participação activa do poder autárquico e outras instituições do concelho e da região. Neste contexto, é de destacar a intervenção desenvolvida, nomeadamente:

  • Pela Câmara Municipal do Seixal, que tem vindo a desenvolver múltiplas diligências junto do poder político com a tutela da área da saúde neste sentido, tendo inclusive proposto uma solução concreta para a localização do novo Hospital;
  • Pela Assembleia Municipal do Seixal, que para além das diversas deliberações com que tomou posição ao longo dos anos em defesa desta proposta, chegou a decidir, por unanimidade, promover a constituição de uma comissão eventual com a participação de todas as forças políticas para intervir e acompanhar o processo em causa. Essa comissão eventual da Assembleia Municipal integrou, tal como o Presidente da Câmara Municipal do Seixal, a delegação, composta ainda por representantes das comissões de utentes e outras associações, que se deslocou à Assembleia da República para proceder à entrega das 65 mil assinaturas a favor da construção do novo Hospital;
  • Pelas Assembleias Municipais de Sesimbra e de Almada, que em diversas ocasiões tomaram posição sobre esta matéria, deliberando pronunciar-se pela importância e urgente necessidade da concretização de uma nova unidade hospitalar pública para dar resposta às exigências das populações dos concelhos do Seixal e de Sesimbra, aliviando ainda as exigências actuais para o Hospital Garcia de Orta, que hoje serve os três concelhos;
  • Pela Assembleia Distrital de Setúbal, que no dia 15 de Dezembro de 2003 aprovou uma Moção/Deliberação tomando posição sobre a situação da saúde, deliberando «Invocar como necessidade premente o reforço da cobertura hospitalar do Distrito, quer pela modernização e requalificação dos actuais, quer pela construção de novos estabelecimentos hospitalares, quer ainda pela continuada humanização dos serviços, reforço dos recursos humanos e combate a listas de espera para consultas, tratamentos e cirurgias, pelo que também se reclama: (…) Construção da Unidade Hospitalar de nível distrital para a área dos concelhos de Seixal e Sesimbra abrangendo os seus 220 mil habitantes, a localizar no eixo Amora/Cruz de Pau/Fogueteiro e que alivie a pressão no Hospital Garcia de Orta»;
  • Pela Comissão Executiva do PEDEPES/Plano Estratégico para o Desenvolvimento da Península de Setúbal [composta pela Associação de Municípios do Distrito de Setúbal, a Associação Empresarial da Região de Setúbal, a Associação de Agricultores do Distrito de Setúbal, a Associação de Comércio e Serviços do Distrito de Setúbal, a Caritas Diocesana, a Confecoop, a Mútua dos Pescadores, a Região de Turismo de Setúbal, a UGT e a CGTP/União de Sindicatos de Setúbal], que incluiu, na lista de Medidas propostas para a Estratégia de Desenvolvimento no âmbito do Plano, a medida «Reforço da rede hospitalar e dos serviços de retaguarda: (…) planeamento de novas unidades hospitalares na Península – Seixal (…)»;

 

III

Actualmente, o Hospital Garcia de Orta [HGO] é a unidade hospitalar que serve as populações dos concelhos de Almada, Seixal e Sesimbra. Inaugurado em Setembro de 1994, o HGO foi projectado para dar resposta às necessidades de 150 mil habitantes, correspondentes à população dos três concelhos referenciados.

No entanto, segundo os Censos de 2001, a população apenas do concelho do Seixal corresponde a esse número – 150 mil pessoas. Somadas as populações dos três concelhos, o valor ascende a 348.663 habitantes. Estamos exactamente perante os três concelhos da Península de Setúbal que registaram, entre 1991 e 2001, as mais altas variações populacionais, gerando necessidades ao nível da prestação de cuidados de saúde que notoriamente não foram acompanhadas pela capacidade de resposta da estrutura hospitalar. Tal situação agudiza-se especialmente durante as épocas de maior afluência turística, nomeadamente na época balnear, com milhões de pessoas a usufruir das praias da região (desde logo a Costa de Caparica e Sesimbra).

A insuficiência da capacidade dos serviços do HGO apresenta contornos particularmente graves ao nível dos serviços de Urgência. A própria “Revista Informativa do Hospital Garcia de Orta” referia em Maio de 2001 que «o actual espaço [da Urgência Geral] foi construído a pensar numa afluência diária próxima das 150 pessoas, mas logo após a sua entrada em funcionamento esse número disparou para as três centenas». Nessa altura, o Governo e a Administração do HGO anunciavam que havia sido aprovada a construção do novo edifício da Urgência Geral, cuja abertura estava prevista para 2003. Tal obra nunca veio a realizar-se. Refira-se ainda que, entre 1994 e 1998, o serviço de urgência do HGO foi acedido por um total de 869.177 utentes, correspondendo a um valor médio de 475 pessoas por dia.

Por outro lado, o HGO é, em diversas áreas especializadas, a unidade hospitalar de referência para toda a Península de Setúbal e mesmo de toda a Zona Sul do País. Entretanto, segundo dados (relativos a 2003) do Ministério da Saúde, 20,3% dos internamentos que resultam de transferências de utentes para o Hospital Garcia de Orta são provenientes do Centro Hospitalar de Coimbra – o que demonstra a abrangência da sua intervenção.

Proceder à construção de uma nova unidade hospitalar para as populações dos concelhos do Seixal e Sesimbra significa, neste contexto, diminuir de forma muito significativa a pressão a que actualmente estão sujeitos os serviços do Hospital Garcia de Orta, promovendo a sua qualificação e a sua oferta de cuidados especializados, e distribuindo a procura hospitalar básica entre este e o novo hospital a construir.

 

IV

Em Junho de 2002, a Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo emitiu a Proposta para Discussão Pública do Plano Director Regional do Equipamento de Saúde. Desse documento consta expressamente a avaliação dos recursos existentes nas várias Unidades de Saúde e a respectiva comparação com as necessidades verificadas.

No que diz respeito à rede de cuidados de saúde hospitalares, existem, segundo a ARS, 480 camas disponíveis na Unidade de Saúde Almada/Seixal/Sesimbra, isto é, no Hospital Garcia de Orta. No entanto, os recursos considerados pela própria ARS como necessários (camas básicas e camas de referência de nível distrital), ascendem a 1075 camas, ou seja, mais do dobro. O Documento da Região de Saúde é esclarecedor:

« Como se pode facilmente constatar da análise deste quadro, existe uma significativa carência de camas hospitalares para dar resposta adequada às necessidades de prestação de cuidados de saúde à população da zona de influência do único Hospital existente na Unidade, sendo esta cerca de 346.484 habitantes.

« O Hospital Garcia de Orta comporta-se como Hospital geral, apresentando grande capacidade de resposta para a procura da população da sua área de influência, embora tenha vindo a sofrer um cada vez maior estrangulamento ao nível dessa resposta, já que a crescente afluência, a sua alta diferenciação técnica em várias áreas assistenciais e a sua reduzida dimensão nas áreas do ambulatório e materno-infantil (na qual é referência para toda a zona Sul do País), são constrangimentos cada vez mais difíceis de ultrapassar, quando se pretende ter uma Unidade Hospitalar prestadora de cuidados de qualidade.

« Quanto ao seu estado de conservação, o Hospital Garcia de Orta necessita de remodelações pouco profundas (segundo proposta da empresa), embora, pelo que atrás ficou exposto, seja patente a necessidade de intervir profundamente na adequação e remodelação de algumas áreas assistenciais chave, a saber, Unidade de Cuidados Intensivos, Urgência, Bloco de Partos e Urgência Obstétrica, Consulta Externa e Unidade de Internamento de Medicina, somente para citar alguns exemplos mais prementes.

« Assim, com base no anteriormente exposto, a A.R.S. entende dever apresentar a seguinte proposta:

  • Construção de um novo hospital na área de Amora/Seixal, para colmatar as insuficiências da capacidade de resposta do Hospital Garcia de Orta;
  • Distribuição da procura hospitalar básica entre o Hospital Garcia de Orta e o novo Hospital a construir na área de Amora/Seixal, de acordo com a sua área de influência;
  • Concentração de toda a referência da Sub-Região de Saúde de Setúbal no Hospital Garcia de Orta.

« Com esta alternativa não iremos sobredimensionar o Hospital Garcia de Orta e viabilizamos o correcto aumento da capacidade de resposta em cuidados hospitalares à população da zona de influência dos Concelhos de Almada, Seixal e Sesimbra, permitindo ao Hospital Garcia de Orta manter o seu papel de Hospital de referência e a inclusão na Rede de Referenciação da Urgência/Emergência como Hospital polivalente, com elevada diferenciação técnica em áreas fulcrais da prestação de cuidados.

« Entendemos, pois, ser esta a alternativa mais racional e a que conjuga a total salvaguarda dos princípios já enunciados de uma boa relação dimensão/eficiência, uma boa relação acessibilidade/proximidade e uma correcta concentração da referência ».

Refira-se que os custos estimados pela ARS para a remodelação e ampliação do Hospital Garcia de Orta, e a construção de um novo Hospital, apontam respectivamente para os seguintes valores: remodelação do HGO – 50,3 milhões de euros; ampliação do HGO – 42,3 milhões de euros; novo hospital (a construir) – 46,7 milhões de euros.

Esta análise conduz a conclusões que demonstram a razão da ARS quanto à oportunidade, a adequação e a vantajosa relação custo/benefício de uma decisão política no sentido da construção de uma nova unidade hospitalar no concelho do Seixal.

 

V

O Plano Regional de Ordenamento do Território da área Metropolitana de Lisboa [PROTAML] foi aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 68/2002, de 8 de Abril, apresentando-se como «instrumento estratégico fundamental para um adequado ordenamento do território da área metropolitana de Lisboa», e apontando como uma das suas prioridades essenciais a «coesão socioterritorial – através de uma melhoria sustentada das condições de vida e da qualidade urbana para a população residente na AML».

Nesse sentido, o PROTAML estabelece, no âmbito das suas normas orientadoras específicas, [IV-2.5.1.-f)] que «os serviços da administração central com competências em matéria de saúde, em colaboração com a administração municipal, devem reequacionar as áreas de influência dos hospitais nas suas diversas valências, tendo em conta principalmente a distribuição espacial da população da AML e as condições de acessibilidade, devendo ainda clarificar a hierarquia e as articulações horizontais e verticais dos equipamentos hospitalares, de modo a proporcionar o melhor serviço de saúde à população da AML ».

Tal orientação, considerada à luz da realidade dos concelhos de Almada, Seixal e Sesimbra no quadro da Península de Setúbal e da Área Metropolitana de Lisboa, suscita de forma clara o problema da adequação da estrutura da cuidados de saúde hospitalares para as populações em causa.

Por outro lado, o Relatório Técnico do PROTAML permite aprofundar a análise da situação existente a este nível no contexto metropolitano:

«No contexto da AML, regista-se uma significativamente menor cobertura da margem sul em relação à margem norte. De facto, a grande maioria das infra-estruturas de saúde localiza-se na AML Norte, sendo de apontar que, concentrando 74% da população residente, dispõe de mais de 85% dos Hospitais Oficiais, dos Hospitais Particulares e das camas de hospitais da AML.

«(…) Para além das áreas que já irão ser servidas pelos hospitais programados para os próximos cinco anos, e apesar das intervenções previstas em unidades hospitalares, nomeadamente nos Hospitais Garcia de Orta, Barreiro e Setúbal, o eixo Amora/Cruz de Pau/Fogueteiro constitui uma área sensível em termos de carências de serviços de saúde hospitalar, para a qual é necessário repensar medidas e acções em função, designadamente, da quantidade de população e da sua estrutura».

 

VI

A necessidade de um novo Hospital para os concelhos do Seixal e Sesimbra suscita o problema da localização adequada, e da existência ou não de soluções concretas disponíveis para essa construção.

Assim, seria necessária, nomeadamente, uma localização que dê resposta às carências verificadas (inclusivamente pelo Relatório Técnico do PROTAML) no eixo Amora/Cruz de Pau/Fogueteiro, que ofereça condições favoráveis de acessibilidade às populações do concelho de Sesimbra, e que permita, em termos de acessibilidades terrestres, a máxima operacionalidade para o próprio funcionamento da unidade hospitalar.

Essa solução está encontrada.

Conforme a Câmara Municipal do Seixal informou publicamente, está disponível uma parcela de terreno com cerca de 80 hectares , propriedade do Estado, que oferece todas as condições adequadas para a localização de um equipamento desta natureza.

Situado junto ao Nó do Fogueteiro da Auto-estrada A2, exactamente a poente dessa auto-estrada e a norte da Estrada Nacional EN 378 (Sesimbra/Fogueteiro), este terreno está também na proximidade da estação de caminho de ferro do Fogueteiro (eixo ferroviário norte/sul), pelo que apresenta condições plenamente favoráveis, sob o ponto de vista das acessibilidades externas a uma unidade hospitalar que possa vir a ser construída nesse local.

Ainda segundo o Município do Seixal, esta parcela destinou-se no passado à construção de novas instalações para a Brigada de Trânsito da Guarda Nacional Republicana, projecto esse que nunca chegou a ter continuidade e que não voltou a ser equacionado pelo Governo. Face ao contexto actual, estamos perante uma clara oportunidade de decidir que este terreno tenha um uso de importância estratégica, com um equipamento de saúde de nível regional/distrital correspondente à unidade hospitalar que é objecto deste Projecto de Resolução. O processo de revisão do Plano Director Municipal do Seixal, actualmente em curso já aponta inclusivamente para essa utilização do terreno em causa.

A situação existente coloca já hoje com grande premência a necessidade do Hospital para os Concelhos do Seixal e Sesimbra.

O agravamento da situação nos próximos anos será insustentável e exige uma especial urgência nas decisões para a construção do Hospital.

Assim, tendo em consideração os factos acima expostos, a Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo a urgente decisão política da construção de um Hospital no Concelho do Seixal, salvaguardando o seu carácter público, no sentido de garantir a prestação de cuidados de saúde hospitalares às populações dos concelhos do Seixal e Sesimbra, e de potenciar a melhoria da qualidade do serviço prestado pelo Hospital Garcia de Orta.

 

 

Assembleia da República, em 2 de Abril de 2005.

 

 

 

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